Vendas embaixo, casa em cima

As edificações tombadas do Centro de Joinville têm relação com a vendas de produtos há quase um século

As construções tombadas na rua do Príncipe carregam a identidade de Joinville entre o fim do século 19 e o início do século 20. Nelas, são identificadas as arquiteturas luso-brasileira e eclética. Considerada desde cedo uma área valorizada, a via foi ocupada inicialmente por prédios destinados a serem comércio no térreo e residência nos andares superiores.

Na imagem da década de 1930, alguns comércios já podem ser vistos

Ainda no século 19, o caminho chegou a ser chamado de Ziegelei-strasse, rua da Olaria em alemão — a primeira indústria registrada na cidade e que forneceu matéria prima para os imóveis que vieram em seguida.

— A rua do Príncipe sempre foi um caminho de ligação com uma grande circulação de pessoas — comenta João Abeid Filho, mestre em patrimônio cultural e autor da dissertação Rua do Príncipe: uma rua em disputa.

A vocação para o comércio acompanhou toda a história das edificações ao longo da via justamente por seu intenso fluxo. Em 1986, a construção de um calçadão entre a rua Nove de Março e a praça Nereu Ramos aumentou ainda mais o potencial de vendas do local. Uma feira de artesanato reuniu os artesãos durante 15 anos e chegou a ser conhecida como a "maior feira hippie do Sul do País", como lembra João.

Barracas dividiam espaço com a circulação de pedestres

— As barracas montadas em frente às lojas começaram a causar tensões com os lojistas, que se sentiam ameaçados. Apesar dos produtos não serem os mesmos, podendo até ser considerados alternativos, os artesãos eram vistos pelos lojistas como concorrentes.

Em 2004, os artesãos foram expulsos e a via novamente aberta aos carros. Em março de 2014, uma iniciativa da Fundação Cultural estimulou o retorno das barracas, movimentando a passagem de pessoas pela rua do Príncipe em alguns domingos do mês.

Solução espera por incentivo

Por serem tombadas, as 18 edificações da rua do Príncipe não podem sofrer alterações sem a autorização da Coordenação de Patrimônio da FCC, da FCJ ou dos órgãos responsáveis pelo tombamento, já que a boa intenção às vezes pode prejudicar o imóvel, como ocorreu com o antigo Banco do Brasil, na esquina com a rua Engenheiro Niemeyer: o prédio foi pintado de uma cor que não remete à história do imóvel. A antiga Farmácia Minâncora, recentemente alterada internamente para receber uma loja de roupas, é outro caso que pode gerar multa alta aos proprietários.

— A intenção não é obrigar os proprietários a voltar no tempo, mas manter os prédios nas condições em que estavam quando houve o tombamento — esclarece o coordenador de patrimônio da Fundação Cultural de Joinville, Raul Walter da Luz.

A conscientização é lenta. Raul acredita que passe a existir maior sensibilização quando as leis complementares nº 366 e 363 - que instituem o Inventário do Patrimônio Cultural de Joinville (IPCJ) e dispõem sobre deduções e isenções tributárias - entrarem em vigor. Desta forma, haverá uma fonte de recursos para que os proprietários possam investir na manutenção do patrimônio. A legislação foi aprovada pela Câmara de Vereadores em 2011, mas ainda aguarda alterações solicitadas pela Secretaria da Fazenda.