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 | 08/06/2008 05h52min

Busatto: "Não me arrependo de ter confiado no vice-governador"

Ao deixar a residência de Yeda, Busatto defendeu-se do que julga serem interpretações equivocadas das declarações dadas a Feijó

Patrícia Rocha  |  patricia.rocha@zerohora.com.br

Quatro horas depois de ter seu pedido de demissão oficialmente aceito, o ex-chefe da Casa Civil Cézar Busatto deixou a residência da governadora Yeda Crusius aparentando tranqüilidade.

Yeda havia ligado para Busatto antes e depois da entrevista coletiva em que anunciou a demissão dele. No primeiro telefonema, confirmou a decisão pela qual ele já esperava. No segundo, Yeda pediu que ele fosse até sua casa, onde compareceu também — por coincidência, diz Busatto — o ex-governador Antonio Britto.

Com um boné, vestindo calça e casaco de moletom, Busatto saiu da casa da governadora pouco depois das 20h, com intenção de ir ao Theatro São Pedro assistir à tragédia grega Édipo. Na calçada da casa de Yeda, a cerca de cem metros da residência do vice-governador, Paulo Feijó, Busatto concedeu entrevista à reportagem de Zero Hora, atrasando-se para seu compromisso.

O segurança tentava avisá-lo de que o tempo estava passando, mas Busatto parecia não ter pressa. Sorridente e com voz serena, contou como havia sido o encontro com a governadora e defendeu-se do que julga serem interpretações equivocadas das declarações dadas a Feijó, na conversa em que ignorava o fato de estar sendo gravado.

Confira os trechos da entrevista:

Zero Hora — Como foi o seu encontro com a governadora?

Cézar Busatto — Foi um encontro para fazer um balanço desse período todo, e eu vim comunicar que vou me apresentar à CPI para fazer um depoimento na segunda-feira. A governadora concordou e ficou satisfeita, achou muito boa a minha iniciativa. Isso aí. Nós tomamos champanha para comemorar.

ZH — O senhor já havia colocado o cargo à disposição, mas ainda assim, como recebeu o pronunciamento da governadora confirmando a sua demissão?

Busatto — Na verdade, já estava definido. Solicitei a minha demissão ontem. Considerei que, diante desse quadro que se criou, minha presença dentro da Casa Civil poderia causar algum tipo de constrangimento para a governadora. Acho que assim é melhor, porque a governadora fica mais à vontade, mais livre para promover uma grande recomposição do governo. Ela está precisando dessa possibilidade de uma reforma geral. Então, essa mudança, da qual eu e o Delson (Martini, ex-secretário geral) fazemos parte, vai ajudar a governadora a reorganizar o governo.

ZH — A governadora criticou abertamente a forma como a conversa foi gravada pelo vice-governador. Como o senhor recebeu esse posicionamento de Yeda?

Busatto — Muito bem. Acho que ela fez o que tinha que fazer. Não se envolveu no assunto. Esse é um assunto que diz respeito à minha relação com ele, embora tenha repercussões. Ela demonstrou sua indignação e solidariedade com o que aconteceu. Ela fez o que tinha que fazer, que é se dedicar exclusivamente às coisas de Estado. Por incrível que pareça, mesmo com toda essa crise política, o Rio Grande está indo muito bem. Acabamos de ganhar um presente de Deus, que é a planta de plástico verde, que trará esse investimento de US$ 1 bilhão. Ninguém é insubstituível. Tenho certeza que fiz a minha parte enquanto estive no governo. Fui vítima de uma armadilha inominável, mas a vida é assim. Saio de cabeça erguida, com minhas convicções, com meu jeito de fazer política. Vou continuar acreditando nas pessoas, vou continuar confiando nas pessoas. Não me arrependo de ter confiado no vice-governador. A gente às vezes se engana.

ZH — O senhor pretende continuar colaborando com a governadora?

Busatto — Vou continuar colaborando como gaúcho. Ela faz um projeto de equilíbrio das contas públicas, de recuperação da capacidade do Estado investir. Agora, creio que talvez seja melhor para o próprio governo que eu colabore apenas como cidadão. Minha presença, pelas implicações políticas que possa ter, talvez não seja a melhor neste momento. Posso colaborar como amigo, como parceiro desse projeto, mas acho melhor ficar de fora nesse momento.

ZH — Como o senhor avalia o impacto destes dois últimos dias na sua carreira política?

Busatto — Se você examina o conteúdo das fitas, sinceramente, isso só me engrandece na minha vida pública. Não me sinto em nenhum momento diminuído. Eu simplesmente disse coisas que todo mundo quer dizer, que todo mundo sabe, só que existe uma grande hipocrisia em torno disso. Não é por nada que eu e outros políticos honrados defendemos o financiamento público de campanhas. E vou continuar lutando pela mudança nas formas de financiamento das campanhas e pelo profissionalização do serviço público. Com todo o respeito, não quis fazer críticas aos grandes partidos, apenas exemplifiquei, mostrando que nós temos que melhorar. Diferentemente do vice-governador, que tenta jogar no caminho de destruição, eu acredito que podemos construir.

ZH — Na gravação, o senhor fala de coisas que vão contra os seus princípios, mas em certo momento o senhor aparenta conformidade. Na sua opinião, há outra forma de fazer política, em que o loteamento de cargos públicos, o financiamento de campanhas não façam parte?

Busatto — Sem dúvida. Primeiro, não dá para identificar loteamento da máquina pública, o financiamento de campanhas com corrupção. Existe a distribuição de cargos públicos dentro dos parâmetros legais. Também existe financiamento de campanha dentro dos parâmetros legais. O que nós estamos dizendo é que através desses procedimentos, do uso de cargos para fins partidários em vez do uso para fins públicos, se abre espaço para práticas irregulares como nós vimos no Detran.

ZH — Recebemos telefonemas e comentários pela internet indignados por julgá-lo conformado com uma forma de fazer política que contraria seus princípios. Então, não há conformidade?

Busatto — Não há conformidade, quero deixar isso muito claro. Todos que me conhecem sabe que eu luto contra isso. Tem que entender o contexto da conversa que eu estava fazendo. Era uma conversa com um vice-governador, que se confronta permanentemente com a governadora, e eu, como chefe da Casa Civil, precisava convencê-lo para evitar um confronto maior, que levasse a uma crise institucional, uma tentativa que ele estava fazendo de criar uma CPI do Banrisul que poderia inclusive ameaçar a saúde financeira do nosso banco.

ZH — Então, não há irregularidades no banco a serem investigadas?

Busatto — Ele disse que há. Eu não disse que há. Ele é que disse que há uma quadrilha dentro do banco desde 2003. Ele é que tem a obrigação de fazer isso. Por que que não fez isso desde 2003? Ah, ele era presidente da Federasul. Mas poderia ter dito às autoridades competentes. Agora, não sou conformado, minha vida mostra isso. Na conversa que tive com ele, eu dizia o seguinte: se ele tinha questões de denúncias de corrupção para fazer, ele tinha que ter feito. Inclusive, eu cobrei dele. Mas por que tu não fez isso na gestão anterior? Não fez. Eu propus a ele refletir sobre as causas desses problemas. E tem uma coisa que eu fico muito chateado: fiz mais de uma hora de conversa e foram reproduzidos 22 minutos. E o resto? Tem uma parte da conversa que eu digo que eu sou a favor do financiamento público de campanha e proponho a ele iniciarmos uma campanha contra isso. Fui lá preocupado com assuntos de Estado, na minha ingenuidade, tentando trazê-lo para um campo construtivo. Eu acho que nós não vamos resolver fazendo a CPI do Banrisul.

ZH — Qual a sua expectativa para a segunda-feira, na CPI?

Busatto — Será uma excelente oportunidade de esclarecer essas coisas. Inclusive aprofundar essas perguntas que tu estás me fazendo. Poder esclarecer que quando eu falei em financiamento de campanha através do Detran, do Daer, do Banrisul, não estava dizendo que estas estatais financiam campanhas. Estava dizendo que esses mecanismos facilitam esses financiamentos que, muitas vezes, não são irregulares. Mas muitas vezes através desses mecanismos se abrem espaços para práticas irregulares que acabam gerando corrupção. Com isso, os interesses privados se sobrepõem aos públicos Não quis dizer que isso necessariamente ocorre, quis dizer que isso pode ocorrer e, quando ocorre, tem de ser duramente combatido. Nós estamos dando uma resposta a isso, e eu me refiro à CPI do Detran.

ZH — A relação de Feijó com a governadora a partir de agora foi parte da sua conversa com ela?

Busatto — Não. Apenas vimos o noticiário da RBS sobre esse assunto, mas já é um assunto superado. Já conversamos sobre isso nos últimos dias. Ela apenas me estimulou a comparecer na CPI do Detran. Quem sabe ela encontre um chefe da Casa Civil que a ajude a resolver esse problema também.

ZH — O senhor faz alguma sugestão de nome?

Busatto — Não. Isso não me cabe. Ela não me pediu, acho que ela tem que ter total liberdade. Acho que as pessoas não são insubstituíveis. Precisa uma pessoa com outro perfil e acho que ela deve fazer isso com total liberdade como governadora.

ZH — O senhor manifestou ontem a sua indignação com o vice-governador. Chegou a dizer que gostaria de chamá-lo para uma conversa. O senhor pretende provocar esse encontro?

Busatto — Sinceramente, gostaria de poder voltar a conversar com o vice-governador. Mas poder conversar traqüilamente. Não agressivamente como fizemos nos últimos dias.

ZH — O senhor se arrepende das palavras que usou contra o vice-governador (mau caráter e golpista)?

Busatto — Não me arrependo. Eu estava indignado, me senti traído e, diante disso, acho que você tem que colocar pra fora o que está sentindo. Mas, à medida que você começa a repensar as coisas, começa a entendê-las. Ele também está vivendo situações difíceis. Cometeu uma atitude muito antiética. Temos que seguir em frente. Tenho a minha luta, e ele, a dele. Mais à frente a gente pode até se encontrar, se acharmos que temos que lutar por causas que possam nos unir positivamente. Não se resolve isso tentando destruir, mas tentando construir.

Valdir Friolin / Agência RBS

Busatto disse que tomou champanha com a governadora para comemorar sua iniciativa de se apresentar à CPI
Foto:  Valdir Friolin  /  Agência RBS


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