EDITORIAL

Contra as drogas, pela legalização da maconha

 

L

ícita ou ilícita, toda droga com poder viciante faz mal à saúde e deve ter seu uso questionado e combatido por meios de comunicação com consciência de sua responsabilidade social, como os veículos do Grupo RBS. Esta é uma posição que não vai mudar neste momento em que, depois de muita reflexão interna e externa, o grupo passa a propugnar que a maconha - e tão somente esta droga, responsável por grande parte do tráfico no Brasil - deixe seu circuito clandestino e seja legalizada, com produção e venda regulamentadas.

   Assumir a defesa da legalização é também assumir o completo fracasso da atual política de combate às drogas no Brasil. Hoje, se compra e se fuma e maconha virtualmente sem restrições no país. Milhões de brasileiros que a consomem regular ou eventualmente convivem assim com uma atividade criminosa, numa cumplicidade que alenta o tráfico e dificulta o combate a drogas mais pesadas. A legalização não eliminaria os traficantes e o comércio clandestino, mas permitiria que uma grande parte do dinheiro das drogas fosse transferida de mãos, reduzindo o poder de fogo do narcotráfico. O consumo até poderia não  cair, mas as ruas do Brasil seriam mais seguras, dezenas de milhares de jovens não precisariam morrer em disputas por bocas-de-fumo e os presídios seriam reservados aos criminosos que têm de ficar encarcerados - e não o estão por falta de polícia, Justiça e vagas no sistema.

   Legalizar a maconha não significaria tratá-la com leveza. Ao contrário. Na clandestinidade, a droga guarda o glamour de contravenção que apela a muitos jovens. Regulamentada, seria possível combater publicamente seus malefícios, como ocorreu com o cigarro, hoje com o consumo em queda acentuada.  Pelos riscos implícitos à liberação, as restrições à maconha também deveriam ser maiores do que em relação ao álcool. A publicidade deveria ser proibida, por exemplo, e os pontos de venda credenciados contar com um controle rigoroso. Vender maconha a crianças e adolescentes deveria causar a imediata perda de licença. E os impostos arrecadados com a maconha deveriam ser integralmente destinados a campanhas de combate ao consumo de drogas.

      Apoiar a legalização das drogas não é uma decisão fácil para nenhum governo, parlamento ou meio de comunicação. Mas, diante do dilema que vive o Brasil devastado pelo crime com origem no tráfico, é preciso uma guinada no curso desastroso atual e se escolher o caminho menos ruim. Hoje, infelizmente, este caminho é legalizar pela autoridade oficial o que, na prática, já está legalizado pela autoridade criminosa.

MUDANÇA DE VISÃO

Q

uando o parlamento uruguaio aprovou projeto que estatiza a produção e o consumo de maconha no país vizinho, em agosto de 2013, Zero Hora posicionou-se contra a adoção de medida semelhante no Brasil. O editorial intitulado A maconha legalizada reconhecia as boas intenções do movimento internacional que defende a legalização da droga como alternativa para o combate ao narcotráfico, mas advertia que a liberdade propugnada poderia se transformar em incentivo para o consumo.

A justificativa, naquela ocasião: "Nosso país já sofre demais por conta do consumo de drogas. Se temos que ser implacáveis em relação ao crack, que vicia nas primeiras experimentações e condena seus usuários à degradação humana e suas famílias a uma dependência paralela, não há por que facilitar a produção e o consumo de maconha. Muito mais apropriado é direcionar esforços para intensificar a prevenção, para impedir que jovens imaturos caiam na armadilha da experimentação".

Mudamos. Continuamos críticos do consumo de drogas, por ser um problema de saúde pública e pelos danos sociais referidos acima, mas reconhecemos que a atual política de criminalização está produzindo péssimos resultados e beneficia o tráfico.

Por isso estamos revisando nossa posição - e o fazemos com total transparência diante de nossos públicos.

A legalização permitiria que uma grande parte do dinheiro das drogas fosse transferida de mãos, reduzindo o poder

de fogo do narcotráfico