| 04/05/2010 07h36min
É o próprio Alejandro Valenzuela, o preparador físico do Inter, quem admite: o time tem caído de rendimento no segundo tempo. Aos 45 anos, o profissional, que acompanha Jorge Fossati há quase duas décadas, revela seu desapontamento com a resistência dos jogadores em aceitar e entender o trabalho no Beira-Rio. Valenzuela se queixa de que muitos deles não levam a sério a sua forma de aplicar a atividade diária.
Em entrevista concedida a ZH durante 30 minutos no gramado suplementar, um dia após a perda do título gaúcho, o uruguaio falou em tom de desabafo. Não esperava encontrar tamanha dificuldade por parte dos brasileiros do grupo. A língua poderia ser entrave. Mas até no Catar não houve tamanho obstáculo.
— Eu falo e, quando olho para eles, sinto que não entenderam 50% ou 60% do que disse — lamenta.
Não é o mesmo que acontece com Guiñazu. O volante é exemplo de dedicação nos treinos, porque compreende o que está sendo pedido. Ontem, por uma hora e meia, o treino foi de cruzamentos e chutes a gol. Nem todos encararam o trabalho com a entrega que Valenzuela queria. Suspeita que os brasileiros, por serem naturalmente talentosos, não se dediquem tanto aos treinos. Como o seu trabalho e o de Fossati são integrados, os treinos físicos são realizados com bola. Como na escola europeia, valoriza espaços reduzidos — e isso não estaria sendo bem aceito pelo grupo.
Ainda assim, atesta: o pico da preparação física deverá ocorrer nesta quinta-feira, quando o Inter decidirá o seu futuro na Libertadores contra o Banfield.
Confira os principais trechos da entrevista:
Zero Hora — O Inter está cansando no segundo tempo?
Alejandro Valenzuela — Sim, nos últimos jogos o time tem caído no segundo tempo. A equipe corre a 140km/h no primeiro tempo e gasta mais nafta (combustível). No segundo, a velocidade baixa para 100km/h. Além disso, pegamos um Grêmio bem preparado e mais descansado.
ZH — Por quê?
Valenzuela — Estamos jogando duas decisões por semana desde o dia 18 de abril. E a preparação não está homogênea. Por exemplo: Sandro e Giuliano cansaram no segundo tempo do Gre-Nal. Giuliano estava ansioso para jogar, queria ganhar de qualquer jeito. Sandro vem de um desgaste grande. Eller e Walter tiveram paradas nessa temporada.
ZH — Mas, no futebol, é comum jogar às quartas e aos domingos.
Valenzuela — (suspiros) Muitas vezes o jogador não interpreta o treino que eu dou como trabalho físico. O Guiñazu compreende bem isso, trabalha com afinco até ficar esgotado. Quando a produção começa a cair, paramos o treino, encerramos o dia para não passar do ponto. Sinto que falta esta consciência para alguns, que não se esforçam. Acho que ainda não entenderam que eu e Fossati trabalhamos a tática e o físico juntos.
ZH — O senhor se refere ao problema de falar espanhol?
Valenzuela — Não sei se é só isso. Eu falo e, quando olho para eles, sinto que não entendem 50% ou 60% do que digo. Mas pode ser algo cultural também. Como o brasileiro tem muita técnica, ele acha que não precisa se esforçar tanto, se dedicar ao máximo aos treinos, como eu gostaria.
ZH — Mas isso não pode ser exigido dos jogadores? Uma dedicação maior?
Valenzuela — (suspiros) Estou chateado. Não consegui fazer com que os jogadores acreditassem no meu trabalho. Comprassem a ideia. Só sei que a parte psíquica, com a qual eu sempre trabalhei, a parte motivacional, não foi entendida até agora. Trabalhei em diversos países, e até no Catar. Eles falam árabe. Lá, treinava com um tradutor ao meu lado. Eu era totalmente compreendido. No Catar, me entende?
ZH — E para quinta-feira, como estará o pulmão do time?
Valenzuela — Nosso trabalho foi dividido em duas etapas. Uma espécie de Apertura e Clausura. A primeira fase vai até 6 de junho, antes da parada para a Copa. Devemos atingir o pico da preparação física no jogo contra o Banfield. Como a partida será na quinta-feira, ganhamos um dia.
ZH — Um dia faz tanta diferença assim?
Valenzuela — Já mudará as coisas. Até porque dormir e descansar é fundamental para a recuperação. O futebol gaúcho exige muito mais da parte física do jogador do que o carioca, por exemplo.
"Não consegui fazer com que os jogadores acreditassem no meu trabalho", lamenta Valenzuela
Foto:
Eduardo Cecconi