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 | 06/04/2011 08h18min

Vítima do médico suspeito de abusos conta sua versão, em Blumenau

Fato ocorreu em 2006, quando mulher fazia uma consulta para detectar problemas ortopédicos

A expressão é de choro, mas os olhos úmidos não derramam lágrimas. Só más lembranças tomam conta dos pensamentos da aposentada de 49 anos, que acusa de agressão sexual o ortopedista Fernando César Buchen, preso sexta-feira passada. Ao se preparar para contar o drama, na noite do último domingo, ela pede para não ser identificada na reportagem e solicita ao marido e à filha que fiquem no quarto.

Ela senta, respira fundo, e começa a falar. As mãos permanecem apertadas, ora contra o peito, ora sobre os joelhos. Nos 26 minutos de conversa, a expressão de constrangimento muda apenas uma vez. Quando fala sobre a prisão do médico, sorri. Uma consulta em 2006 a marcou para toda vida.

Entrevista
Jornal de Santa Catarina - Por que a senhora procurou o médico?
Vítima: Tenho LER/Dort, eu era laboratorista e depois fui técnica administrativa. Tinha dores nos ombros, quase não estava conseguindo me movimentar. Eu cheguei até o médico por indicação, me disseram que era um bom ortopedista. Fui duas vezes consultar com ele. Na primeira, foi tudo normal e ele pediu um exame. O pior aconteceu duas semanas depois, quando levei a ressonância magnética. Isso faz cinco anos.

Santa - Como foi a primeira consulta?
Vítima: Só expliquei o meu problema e ele me deu um receituário com a descrição dos exames e pediu para retornar. No dia que voltei, ele olhou os exames e pediu para me examinar porque eu estava com dores na perna direita. O médico pediu para eu ir para a maca, tirar a roupa e ficar de calcinha. Achei estranho, mas cumpri as ordens. Ele fez os exames na maca, como qualquer ortopedista. Eu mexia as pernas e ele testava para ver a força. Até aí, achei normal.

Santa - E o que aconteceu em seguida?
Vítima: Como eu estava com dores nos braços, ele me ajudou a deitar de bruços. Pensei que ele ia fazer algum exame nas costas. (silêncio... suspiro...) Ele arrancou minha calcinha e jogou no chão. Eu disse para ele que não. Na hora pensei que aquilo não estava acontecendo, que era pesadelo.

Santa - A senhora ficou sem reação?
Vítima: Sim. Eu não conseguia gritar. Aí ele me tocou. Fiquei em estado de choque, eu só tentava me mexer, mas ele estava me segurando com uma das mãos. Acho que, como ele viu que eu ia conseguir gritar, ele parou. Se fez de médico novamente e me perguntou se eu tinha dores durante a relação sexual.

Santa - A senhora conseguiu responder?
Vítima: Não. Peguei minhas coisas, nem me vesti direito e saí correndo.

Santa - Enquanto a senhora se vestia, ele fazia o quê?
Vítima: Voltou para a mesa dele. Não olhei pra cara dele. Nem lembro de sair, de passar pela recepcionista. Só lembro quando estava dentro do carro no estacionamento, onde fiquei umas duas horas chorando. Eu estava sozinha, não estava em condições de dirigir. Meu marido estava no Exterior. Depois fui à delegacia e registrei boletim de ocorrência.

Santa - A senhora pensou que ele ia lhe estuprar?
Vítima: Sim, não tive voz para gritar. Pedi para parar num tom normal, não saía som alto.

Santa - E depois, como foi?
Vítima: Eu estava afastada do trabalho por causa das dores. Precisava de um laudo dele para conseguir a perícia no INSS e encaminhar a aposentadoria. Só que jamais ia voltar àquele consultório. Então, deixei o trabalho e busquei minha aposentadoria na Justiça. Consegui meses depois. Aí prestei depoimento contra ele na Delegacia da Mulher. Não me disseram o que iam fazer com o meu registro. Não me deram importância.

Santa - E naquele momento a senhora sentiu que ele ficaria impune?
Vítima: Sim. Contei para o meu marido meses depois. Para minha filha contei no dia que soube da prisão dele. Eu fiz o boletim de ocorrência e esperei. Fiquei seis meses sem salário por causa desse médico, não conseguia ir a outro médico para conseguir o laudo. Entrei em depressão. Na época, comentei com uma amiga, que teve o mesmo problema. Incentivei ela a denunciar, mas por medo de não receber o atestado para a aposentadoria, ela não quis. Agora que ele está preso, ela vai denunciar.

Santa - O que mudou na sua vida após a agressão?
Vítima: Eu tive problemas ao ter relações sexuais. Fico constrangida. Não consegui mais ir ao médico, fui fazer mamografia só quinta-feira passada, sendo que antes eu fazia todos os anos. Fiquei com pânico de médico. Fiquei uma pessoa menos feliz depois do que aconteceu. Fiquei muito tempo em estado de choque, nem queria sair de casa.

Santa - O que sentiu quando soube da prisão do médico?
Vítima: Eu estava na sala da minha casa e dei um grito. Fiquei feliz, avisei as pessoas que sabiam do que eu sofri. Fui procurar se a minha denúncia estava envolvida. Não está, mas quero incluir (segunda-feira, ela prestou depoimento à Polícia Civil de Gaspar). O pânico estava adormecido dentro de mim. Quando eu vi a foto dele no jornal, voltou tudo o que vivi naquele dia. Muitas vezes chorei calada e sozinha lembrando daquele dia. Nunca vou esquecer o que aconteceu. Agora só vou ao médico se estiver a secretária junto.

Santa - O que faria se encontrasse ele?
Vítima: Não sei. Queria é que ele ficasse preso.

Entenda o caso
O médico Fernando César Buchen foi preso pela Polícia Civil sexta-feira, no consultório onde trabalhava, em Blumenau. O pedido de prisão preventiva foi feito pelo juiz da Vara Criminal de Gaspar, após o Ministério Público ter recebido nova denúncia de abuso. Buchen já respondia a processo movido em 2008 por outras duas pacientes. Ao todo, são pelo menos oito vítimas que se manifestaram à polícia e à Justiça. Um novo inquérito será aberto pela Polícia Civil, com base em quatro depoimentos de vítimas, segundo o delegado Paulo Koerich.

Contrapontos
O que diz o advogado de Fernando César Buchen, Luís Roberto Schmitt Júnior:
O advogado preferiu não comentar as acusações e informou que irá se pronunciar sobre o caso somente após a publicação da reportagem.

O que diz o delegado regional Rodrigo Marchetti:
Sobre o boletim de ocorrência registrado pela do médico e que não foi levado adiante, Marchetti afirma que não era delegado à época e que precisa averiguar para saber o que ocorreu e se houve falha na orientação à vítima.

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