| 18/01/2009 17h21min
Ainda abalada com a tragédia causada pela enchente, a população de Santa Catarina convive agora com uma polêmica proposta de mudanças da legislação ambiental. O governo do Estado pretende unificar todas as leis que tratam do assunto em um código ambiental. No entanto, ambientalistas catarinenses criticam vários pontos do projeto e o consideram inconstitucional.
A secretária executiva do Comitê de Bacias do Rio Itajaí, Beate Frank, disse que a idéia de criação do código ambiental é positiva, mas ressaltou que vários itens da proposta ferem a legislação nacional. Um exemplo citado pela ambientalista é a proposta de redução de 30 para 10 metros da distância mínima de mata ciliar para cursos d'água para rios com largura inferior ou igual a 10 metros.
– A intenção da criação do código é positiva, porque a legislação ambiental é muito fragmentada e dispersa. Existem muitas leis tratando de muitas coisas. A reunião disso tudo em um único instrumento legal facilita tanto a gestão quanto o ensino e a orientação. A idéia é muito boa, mas é muito difícil de ser praticada – argumentou Beate.
Segundo ela, o impacto da redução das áreas de preservação permanentes e da mata ciliar é muito sério.
– Talvez a melhor forma de explicar o impacto que isso significa seja mostrar as recentes imagens da catástrofe ocorrida aqui em Santa Catarina. Muitos dos deslizamentos, como as estradas caindo, margens de rios cedendo e enxurradas que arrastaram casas e automóveis, são mostras de que a não observância dessas áreas de preservação permanentes gera impactos econômicos e sociais altíssimos – diz ela.
Para o presidente da Fundação de Meio Ambiente de Santa Catarina, Carlos Kreuz, é uma injustiça atrelar o problema das enchentes às ações do Estado em termos ambientais. Segundo ele, a discussão do código ambiental é anterior ao fenômeno.
– Santa Catarina tem 41% de cobertura com mata nativa. Qual é o Estado no Brasil, além dos amazônicos, com essa situação? Santa Catarina é um exemplo de preservação. O que aconteceu é uma conseqüência dos fenômenos climáticos globais – afirmou.
Beate Frank criticou também a forma como o projeto foi elaborado.
– Existem tentativas semelhantes em âmbito nacional há muito tempo e não se consegue avançar. E aqui em Santa Catarina se fez isso de forma bastante rápida, sob pressão, e depois que o órgão ambiental, por meio de consultorias, conseguiu chegar a um documento, não discutido publicamente, a proposta foi encaminha ao governo do estado em março do ano passado.
No entanto, Kreuz sustenta que o projeto foi discutido em várias ocasiões com a sociedade civil e já conta com 300 emendas.
– Só na Assembléia [Legislativa] foram cerca de 10 audiências públicas. Algumas questões têm que ser discutidas, mas lá é o espaço democrático para isso, e as coisas estão sendo discutidas.
De acordo com Beate, o Executivo demorou cinco meses para enviar a proposta ao Legislativo. E, quando foi enviado à assembléia, o projeto chegou com mudanças, muitas delas inconstitucionais.
– Nesse conjunto de alterações, constatou-se que elas não eram de forma, mas também de conteúdo, incluindo uma lista de aspectos inconstitucionais.
Kreuz admitiu que o projeto realmente sofreu alguns "ajustes polítcos", após ser entregue ao governo para atender "demandas do setor produtivo", mas não acredita que as mudanças possam colocar em risco a preservação da região.
– Santa Catarina é um Estado diferente, quase 90% do território é ocupado por pequenas propriedades. Se nós cobrarmos o cumprimento do código federal, inviabilizamos essas propriedades. Em cima disso é que foram feitos os ajustes. O Estado precisa de um tratamento diferenciado no que diz respeito ao tratamento do solo – justificou.
Além da diminuição das áreas de mata ciliar, Beate Frank diz que o novo código ambiental proposto pelo governo de Santa Catarina prevê uma compensação ambiental e a imposição de um prazo mínimo para expedição das licenças ambientais.
No caso da compensação, a falha, segundo a ambientalista, está no fato de o projeto prever que os recursos serão destinados a outros setores, e não ao ambiental.
– Outro assunto muito sério é que o órgão ambiental de Santa Catarina vem sendo sucateado, com um número muito pequeno de servidores. Para contornar isso, [o projeto] diz que, se o pedido de licença não for respondido em dois meses, automaticamente a licença será concedida.
Para ela, isso significa praticamente a instalação de um regime de ditadura.
– Significa eliminar o órgão ambiental, partindo do pressuposto de que tudo pode funcionar sem ele.
Beate Franck informou que, para evitar que o projeto seja aprovado e implementado da forma com está, o Comitê de Bacias do Rio Itajaí, ao lado das ambientalistas do Estado, lançou o Movimento por um Código Ambiental Legal. A iniciativa apóia a implantação do código, desde que esteja de acordo com a legislação nacional e promova a justiça social.
ial. AGÊNCIA BRASIL