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 | 27/03/2008 06h21min

Entenda como a crise argentina afeta o Brasil

Governo do país vizinho eleva imposto de exportação para trigo

Lucia Ritzel  |  lucia.ritzel@zerohora.com.br

O novo panelaço dos argentinos já é ouvido no Brasil, onde é dada como certa mais uma alta de preços de pães, massas e biscoitos, devido à retenção do trigo no país vizinho.

Desde o começo do ano, o preço do pão subiu cerca de 20% no Brasil, conseqüência da escassez de trigo argentino, mais barato do que o nacional. Para os moinhos brasileiros, o movimento argentino é um claro sinal de que será inevitável buscar outros fornecedores.

No final de 2007, quando o produtor argentino já estava pressionado pela alíquota de 28%, a indústria pediu ao governo brasileiro que retirasse o imposto sobre a importação de países de fora do Mercosul. Na ocasião, a Argentina comprometeu-se a reabrir as exportações. O Brasil recebeu 2,6 milhões de toneladas. Houve a promessa de uma nova janela em 3 de março, para mais 1 milhão de toneladas, mas há dois meses não se fecham negócios.

Segundo o presidente do conselho deliberativo da Associação Brasileira da Indústria do Trigo, Luiz Martins, os moinhos enfrentam dificuldades na importação desde novembro.

— Como reter exportações é um dos pilares da política econômica local, nós, aqui, corremos o risco de desabastecimento porque a maioria das indústrias mantém estoques para dois meses — explica Martins.

A alta de preços dos derivados do trigo é o mais importante reflexo para o consumidor brasileiro dos protestos que começaram na Argentina há duas semanas, numa reação à decisão da presidente Cristina Kirchner de elevar o tributo sobre exportações, avalia o presidente da Associação Gaúcha de Supermercados, Antonio Cesa Longo. No caso dos vinhos importados, que ocupam 45% das prateleiras do Rio Grande do Sul, há estoques, e é possível comprar de outros países a preços competitivos, explica Longo.

Produtores gaúchos de soja podem ser beneficiados

A crise argentina pode render benefícios para os produtores brasileiros de soja, se vierem a ocupar o espaço deixado no mercado externo pelos vizinhos. Fernando Muraro, da consultoria AG Rural, diz que, na Bolsa de Chicago, referência mundial, o problema é considerado de curto prazo, embora a tensão ontem tenha contribuído para a terceira alta seguida na cotação do grão.

As medidas anunciadas dia 11 pelo ministro da Economia da Argentina, Martín Lousteau, elevaram de 35% para 44,1% as retenciones (tributo sobre exportação) da soja. Há cinco anos, o governo cobra esse tipo de imposto, que alcança outros grãos, carnes, leite e até combustíveis. Com isso, aumenta a arrecadação e inibe a inflação. No caso do trigo, a alíquota havia subido de 20% para 28% em novembro e há duas semanas foi reduzida para 27% - diferença considerada insignificante por irritados produtores argentinos que assistem à disparada dos preços das commodities no Exterior.

Na imprensa argentina, o movimento - primeira crise enfrentada por Cristina desde que assumiu a presidência em janeiro - é considerado o pior conflito desde o corralito (ação semelhante ao confisco do governo Collor). Ontem à noite, houve o segundo panelaço consecutivo em cidades argentinas. Não se pode ignorar que o ex-presidente Fernando de la Rúa renunciou há mais de seis anos acuado pelo estridente ruído de panelas nas ruas do país.


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