Tânia* enfrentou um tormento que durou metade da vida. Tem marcas nas costas,
pernas, joelhos e um dedo quebrado pela brutalidade do homem que escolheu
para viver, pai dos quatro filhos
ânia* passou 30 dos 50 anos de vida abaixo de violência. Apanhou, foi torturada, agredida de todas as formas. Ouviu tanto grito do marido, que a própria voz sai presa, sufocada, contida. É um quase silêncio. Mas um silêncio ruidoso, como a realidade brutal das mulheres que sofrem violência no campo.
A agricultora, que vive em Camboriú, no Litoral Norte, não sabe como conseguiu sobreviver a tanta crueldade. O agressor era o marido, pai dos quatro filhos, único homem com quem se deitou. Mas que desconfiava de cada passo dela.
— Eu fui muito violentada. Perguntava por que estava fazendo aquilo, mas ele não respondia, ficava quieto, saía até de perto para não responder.
As marcas desse tormento estão nas costas, pernas, joelhos, braços, mãos. Até no dedo quebrado. Mesmo na condição de vítima, Tânia era tomada por sentimentos comuns a outras mulheres: tinha medo e vergonha. Se saísse de casa, usava roupa de manga comprida para tapar hematomas e arranhões. Se fosse receber visita, escondia louças e móveis quebrados.
— Eu colava papel, botava adesivo, para que não vissem as coisas destruídas.
Em momentos de fúria, nem o alimento das crianças era preservado:
— Quando a comida estava pronta, ele jogava fora, no chão, dava para os cachorros.
Fugas faziam parte dessa rotina. Algumas vezes, ela corria da foice e do facão. Em outras, do machado. Além da mira da arma de caçar. Tânia e os filhos paralisavam de pavor quando viam os animais de estimação serem maltratados. Como os cachorros, que certa vez tiveram o pescoço cortado com motosserra.
— Eu corria com as crianças e me escondia no mato para não morrer.
Um dia, recorda, ela precisou ir à cidade. A carona atrasou e, ao retornar para casa, foi recebida com chutes e pontapés que atingiram as partes íntimas. Foi proibida de procurar socorro médico. Por causa dos golpes, urinou sangue durante um mês. A maior parte das agressões acontecia durante a noite.
— Tinha vezes que eu pedia pelo amor de Deus que o dia não anoitecesse e que continuasse claro para eu não passar tudo de novo.
A violência aumentava quando o marido bebia. Mas também sem álcool as agressões se repetiam. Tânia levou três décadas para adquirir coragem e denunciar o marido, que chegou a ser preso e hoje vive em outra cidade. Mas ela ainda sente medo.
A ponto que aceitou contar sua história com a condição de que o nome verdadeiro e a imagem fossem preservados. Mas deixa um conselho para mulheres que sofrem com a violência:
— Busquem ajuda. É horrível passar por isso sozinha.
*Nome fictício
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