a voz de joana sebben se levanta para denunciar um número que assusta. sete mulheres foram assassinadas no oeste catarinense apenas neste ano, não sem antes sofrer todo tipo de violência.  ela defende que, para enfrentar essa condição, é necessário se organizar

e árvore fosse, ela estaria assustada desde a raiz.

De carne e osso, leva um medo carregado de alertas. É Joana Fernandes Sebben, 48 anos, casada, mãe de três filhos e que vive na área rural de São Miguel do Oeste, Extremo Oeste do Estado. A agricultora espalma as mãos para contar o número de mulheres assassinadas na região entre os meses de janeiro e maio de 2017.

— São sete mulheres mortas dentro de suas casas, no interior de suas propriedades. Crimes praticados por ex-maridos, ex-companheiros, homens que em sua maioria não aceitavam o fim dos relacionamentos — diz ela, que faz parte do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC) em SC.

Para Joana, uma selvageria que contrasta com as mudanças trazidas pelos conceitos de sustentabilidade e novas tecnologias surgidas para melhorar a vida das pessoas no campo. Se muita coisa evoluiu, no caso da violência houve retrocesso:

— É muito forte dar 15 facadas numa mulher, isso parece não ser coisa de um ser humano.

Como a região é formada por pequenos municípios, o impacto dos assassinatos é forte entre os moradores. Em todos os casos, as agressões faziam parte do cotidiano. Em um desses, o homem estava impedido de chegar perto da vítima. Em outro, os envolvidos eram todos jovens: o matador com 24 anos; a ex-namorada, 23; as irmãs dela, com 12 e 15 anos.

O proibitivo da aproximação mostra que a lei por si só não resolve. Além disso, no campo não existe um abrigo para onde a mulher possa ser encaminhada, protegida, resguardada.

— Se não houver vigilância acerca das ameaças, não vai adiantar — alerta Joana.

Para a agricultora, antes da morte elas passaram por muitos sofrimentos e hostilidades. Vivenciaram situações de asperezas financeira, física, psicológica. Consequência de uma cultura dominadora, em que a mulher é considerada um ser inferior e submetida a situações nem sempre reconhecidas como violências. Como quando esposas e namoradas escutam que não são capazes de dirigir um carro, sequer ir ao banco sozinhas, tampouco representar a propriedade numa reunião de cooperativados.

Há, ainda, uma violência estrutural. Como na hora de responder a um questionário, quando o entrevistador pergunta sobre quem mora na propriedade. Se o homem não estiver, o pesquisador vai embora, prometendo voltar em outro dia. Se o marido estiver e for indagado sobre o que faz a mulher, responde: “Ela me ajuda”.

— Como ajuda, se as mulheres do campo levantam mais cedo, cuidam das vacas, fazem café, arrumam os filhos para a escola e muitas vezes vão antes para a roça? — questiona Joana.

Por situações assim, diz a agricultora, é que a aposentadoria significa uma grande conquista para a mulher do campo. O benefício trouxe o direito de comprar uma roupa, de ir a um salão de beleza, de pagar pelo corte de cabelo sem ter que pedir dinheiro ao marido.

Essa discriminação sobre a condição feminina vem de longe. Desde quando frequentar a escola não era obrigatório por lei, época em que famílias com condições de mandar os filhos estudar escolhiam os meninos. As meninas ficavam em casa para cuidar dos irmãos menores e ajudar a mãe. Isso fez crescer uma geração de mulheres com baixa escolaridade. Algumas conseguiram voltar aos estudos bem mais tarde, estimuladas por organizações como o MMC, que tem a educação popular como uma das bandeiras.

É o caso de Joana. Se quando jovem estudou pouco, nos últimos anos tomou o rumo da escola. Concluiu a 8a série, terminou o ensino médio, faz graduação em Gestão de Turismo. A família optou pela agroecologia e faz da propriedade um ponto de atração de consumidores interessados na produção livre de agrotóxicos.

Joana se reconhece assustada com a violência. Não por si própria, pois mantém um relacionamento com o companheiro construído com lutas pela igualdade de gênero. Mas pelas mulheres que estão em situação de risco e que sofrem caladas.

— A gente se pergunta o que fazer para ajudar, pois, sozinhas, elas não conseguirão se libertar.

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DC: NAS REDES

Material publicado em 1º de julho de 2017