| 26/07/2005 21h02min
Em um depoimento de quase 9 horas, uma declaração de Renilda de Souza chamou a atenção dos parlamentares e trouxe à tona a possível ligação de um integrante do governo com os casos de empréstimos ao PT. As afirmações à CPI dos Correios da mulher do empresário Marcos Valério devem apressar a convocação do deputado José Dirceu (PT-SP) para depor na comissão. Falando como uma simples dona de casa que nada sabia dos negócios do marido, logo no início, ela fez o elo entre o então ministro da Casa Civil José Dirceu e o esquema de empréstimos montado por Valério e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares para alimentar um suposto caixa dois.
Ao falar de sua preocupação com o calote anunciado pelo PT, ela contou detalhes sobre encontros que Dirceu teria mantido com os dirigentes dos Bancos Rural e BMG, no fim do ano passado, para acertar o pagamento dos empréstimos milionários. Segundo Renilda, depois do estouro do escândalo perguntou ao marido como eles pagariam esses empréstimos se não tinham patrimônio para honrar a dívida, que atualizada passa de R$ 90 milhões. Ele voltou a dizer o que já revelara no depoimento ao Ministério Público. Renilda disse ter ficado irritada, pois nunca avalizara nem o irmão, mas Valério temia dizer não a Delúbio, e perder contas que suas empresas.
— Do ministro Dirceu posso falar. O Marcos Valério me revelou que houve uma reunião da direção do Banco Rural, acho que ano passado, no Hotel Ouro Minas em Belo Horizonte, com o então ministro José Dirceu para acertar como seria o pagamento do empréstimo. E outra em Brasília com o BMG. Mas o Marcos Valério não participou — disse Renilda.
A revelação deverá precipitar a convocação de Dirceu, o que vinha sendo adiado estrategicamente por representantes da base governista. O deputado Eduardo Paes (PSDB-RJ) considera que a partir de agora a convocação de Dirceu passa a ser inevitável:
— Não tem mais como impedir a convocação do deputado José Dirceu. Amanhã (quarta-feira) marcamos a data — avisou.
— O principal efeito do depoimento de Renilda é tornar inevitável e inadiável o depoimento do ex-ministro José Dirceu. Vamos aprovar amanhã (quarta) e marcar para a primeira quinzena de agosto — completou Antônio Carlos Magalhães Neto(PFL-BA).
Cauteloso, o relator Osmar Serraglio (PMDB-PR), admitiu que o assunto deverá ser debatido na sessão administrativa desta quarta.
— Sem dúvida, essa é uma novidade que ela trouxe. Mas o Delúbio disse que só ele sabia. Portanto, temos de refletir e investigar qual é a verdade. Temos de saber se Dirceu realmente sabia. Ele será ouvido no dia 2 de agosto na Câmara. Temos de avaliar quando ele virá à CPI — ponderou.
Em nota divulgada no início da noite, o deputado José Dirceu (PT-SP) confirma que se reuniu em ocasiões diferentes com diretores dos Bancos Rural e BMG no período em que era ministro da Casa Civil, mas nega que nesses encontros tenha tratado de empréstimos ao PT.
A assessoria do Banco Rural confirmou que houve o jantar oferecido pelo Banco Rural no Hotel Ouro Minas, para aproveitar a passagem do então ministro da Casa Civil, em Belo Horizonte. O Banco Rural disse que o objetivo do encontro foi tratar com Dirceu da liqüidação do Banco Mercantil de Pernambuco.
Em seu depoimento, mostrando um excelente preparo jurídico, Renilda protegeu o tempo todo Marcos Valério. Rejeitou que ele tivesse comandado esquema de lavagem ou cometido crime. Também preservou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Garantiu que seu marido nunca esteve com ele ou recebeu qualquer favor do presidente ou do governo.
Renilda negou ainda que o seu marido tinha como papel nas empresas de publicidade ser o operador de fundos eleitorais. Ela deixou transparecer que Valério não estava sozinho:
– Não existe Marcos Valério, existe SMP&B e DNA – enfatizou Renilda.
Disse considerar injusto que seu marido esteja sendo responsabilizado sozinho por tudo, lembrando que qualquer cheque emitido por suas empresas tem necessariamente de ser assinado por dois sócios. Alegou desconhecer qualquer empréstimo que tenha sido contraído pelas empresas do marido para favorecer outro partido além do PT.
Renilda classificou de "fantasiosa" a versão apresentada por Fernanda Karina de que Marcos Valério teria tido uma participação direta no pagamento do chamado mensalão a parlamentares da base governista.
— Ela está bem orientada, sabe o que pode ou não dizer. Não diz nada que comprometa o Marcos Valério. A única coisa importante é que chamou o Zé Dirceu para dançar no baile da corrupção. Prefere ser vista como uma pessoa vazia, um corpo sem cabeça — lamentou o senador Álvaro Dias (PSDB-PR).
O preparo não resistiu a quase 9 horas de indagações, e Renilda voltou a chorou quando o deputado Moroni Torgan (PFL-CE) disse que muitas empresas queriam uma sócia assim: omissa, reservada e sigilosa.
– Que fama a sua família vai ter, os seus filhos vão ter. Que conselho vai dar para o seu marido para não ficar de boi de piranha para o resto da história. A senhora está tendo a achance de passar a limpo a história da sua família. Muitos familiasres de PC Farias não tiveram essa chance. Você tem receio de alguma coisa? – indagou.
– Eu não vou declarar mais nada – disse, antes de Delcídio encerrar a sessão mesmo havendo duas inscrições previstas.
As informações são da agência O Globo.
Galeria de fotos do depoimento
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