| 21/07/2006 12h02min
Centenas de brasileiros querem sair da zona de conflito entre Israel e o Hezbollah, iniciado há 10 dias, ao sul do Líbano, e não conseguem. O número de pessoas ultrapassa 700, de acordo com o Itamaraty. Apenas 98 foram resgatados, no início da semana, por um avião da Força Aérea Brasileira (FAB), que volta hoje à região para uma nova operação de retirada. Entre os primeiros que chegaram estava uma família catarinense, que soube da primeira missão por acaso.
– Minha esposa saiu para comprar comida na cidade em que estávamos e encontrou com uma brasileira na loja que nos contou que, na segunda pela manhã, estaria saindo um grupo. Aí nós ficamos ligando para a embaixada – contou o empresário Zouhair Haidar, com exclusividade ao clicRBS, em uma entrevista online na manhã de hoje.
Zouhair Haidar, de 52 anos, sua mulher, Abir, e dois filhos foram pegos de surpresa pelo bombardeio israelense, deflagrado após o seqüestro de dois dos seus soldados pelo Hezbollah. A família de Joinville ficaria de férias na capital libanesa, Beirute, onde acabara de comprar um apartamento, até 15 de agosto.
Quando as bombas lançadas por Israel começaram a cair sobre o aeroporto da cidade (para evitar a fuga de integrantes do grupo xiita Hezbollah), que fica a 500 metros do apartamento dos Haidar, a família teve de fugir para a montanha, onde alugou uma casa. Lá, ficou refugiada com seus familiares que moram em Beirute, até ser resgatada e trazida de volta ao Brasil.
Leia a seguir o relato de Zouhair sobre a fuga deles do Líbano, para onde ele não pretende mais voltar.
Pergunta - Como vai Zouhair?
Zouhair Haidar - Agora, tudo bem.
Pergunta - Que bom. O senhor e a sua mulher nasceram no Líbano?
Zouhair - Sim.
Pergunta - Os seus filhos Nahida, de nove anos, e Jade, de cinco anos, nasceram em
Joinville?
Zouhair - Sim, são joinvilenses e possuem dupla nascionalidade.
Pergunta - O que
vocês foram fazer no Líbano?
Zouhair - Fomos visitar parentes, e aproveitar as férias de meus filhos
Pergunta - Quanto tempo pretendiam ficar?
Zouhair - Pretendíamos ficar 60 dias.
Pergunta - Por que o senhor comprou um apartamento no Líbano – e justamente no bairro onde ficam os escritórios do Hezbollah?
Zouhair - Porque todos os meus parentes moram neste bairro e normalmente os parentes preferem estar sempre perto, para poderem se visitar sempre.
Pergunta - O senhor viu muitos alvos não-militares atingidos no Líbano?
Zouhair - Noventa e nove por cento do que eu vi eram alvos não militares.
Pergunta - Em que momento e como o senhor soube que Israel estava bombardeando o Líbano?
Zouhair - Às 6h30min de quinta-feira (dia 13) ouvi a
primeira de cinco explosões ao lado de meu apartamento, a mais ou menos 500 metros, onde fica o aeroporto.
Pergunta - Então vocês tiveram de sair de casa? Já nesse momento?
Zouhair - Sim, nesse momento juntamos poucas roupas e saímos em desespero para as montanhas.
Pergunta - Vocês viram a destruição que estamos vendo pelas imagens da TV e pelas fotos dos correspondentes internacionais?
Zouhair - Sim, acompanhei a destruição até sábado e trouxe algumas fotos da destruição causada a prédios civis, pontes e viadutos.
Pergunta - Mas vocês conseguiram chegar às montanhas sem problema?
Zouhair - Sim, havia muito movimento das pessoas saindo de suas casas, todos os postos estavam lotados, mas saímos bem.
Pergunta - As crianças viram cenas de guerra? Ficaram ou ainda estão assustadas?
Zouhair - Dos meus filhos, eu consegui esconder o que estava acontecendo, mas crianças que viajaram com a gente de volta
voltaram bem abaladas com o som das explosões, inclusive qualquer barulho a gente via as crianças
colocar as mãos nos ouvidos e chorar.
Pergunta - Como o senhor escondeu deles? Eles não ouviram as bombas?
Zouhair - Nos primeiros bombardeios que duraram em torno de 15 minutos, eles estavam dormindo. Depois disso fomos para as montanhas. Lá de cima eles escutavam, e eu dizia a eles que eram fogos de artifício e a maior parte dos bombardeios ocorria à noite e eles estavam dormindo.
Pergunta - Qual sua opinião sobre o Hezbollah?
Zouhair - Minha opinião é que ele não deve deixar de existir, porque são os únicos árabes que ainda não baixaram a cabeça para Israel e os Estados Unidos. É um absurdo o que a gente está vendo e o mundo ficar calado. Isso é algo que não me conformo e acho que o mundo devia agir o mais rápido possível.
Pergunta - O senhor soube do bombardeio na quinta-feira e se refugiou nas montanhas, em uma casa alugada, não é? A que
distância estavam do aeroporto? Estavam seguros lá?
Zouhair -
Estávamos a uma distância de 15 quilômetros e com uma visão total de Beirute. Víamos tudo acontencendo.
Pergunta de Internauta - Qual o seu sentimento pelos israelenses?
Zouhair - O pior possível.
Pergunta - Quando o senhor percebeu que seria impossível deixar o país por conta própria?
Zouhair - Percebi no sábado que o bombardeio não iria parar e que estava difícil a saída pela Síria porque estavam atacando civis na estrada.
Pergunta - Vocês chegaram a passar necessidades primárias, já que a comida estava ficando escassa e os preços dispararam?
Zouhair - Não. Pagamos muito mais caro, porém não passamos necessidades.
Pergunta - Vocês tinham acesso a informações na montanha? Rádio, TV, telefone?
Zouhair - Minuto a minuto. Não saímos da frente da TV e do
rádio.
Pergunta de Internauta - Qual foi o atendimento do Consulado Brasileiro aos brasileiros?
Zouhair -
Fantástico o atendimento prestado a todos pelo Consulado.
Pergunta - Muitos brasileiros querem sair da zona de conflito e não conseguem. Como foi que o senhor conseguiu entrar no primeiro grupo resgatado pela missão organizada pelo governo do Brasil?
Zouhair - Minha esposa saiu para comprar comida na cidade em que estávamos e encontrou com uma brasileira que nos contou que na segunda pela manhã estaria saindo um grupo. Aí nós ficamos ligando para a embaixada.
Pergunta - Foi por acaso, então? Que sorte!
Zouhair - Exatamente. Hora certa no lugar certo.
Pergunta de Internauta - E a sensação de vivenciar tudo isso?
Zouhair - Uma sensação horrível. Vendo imagens e fotos é muito diferente de estar lá e ouvir o som dos mísseis e dos aviões passando e prédios caindo.
Pergunta - Como foi a saída
de Beirute?
Zouhair - Saímos em comboio com bandeiras do Brasil sobre os ônibus. Duas
caminhonetes da embaixada e uma do exército libanês nos acompanharam.
Pergunta - Quantos parentes seus moram em Beirute? Eles tiveram de abandonar as suas casas? Como eles estão agora?
Zouhair - Tenho muitos parentes e alguns já perderam tudo. Minha sogra viu seu comércio no chão.
Pergunta - O senhor perdeu algum parente ou amigo nos bombardeios?
Zouhair - Não, graças a Deus.
Pergunta - Quando chegou a Joinville, o senhor disse que Líbano nunca mais. Vocês não pensam em voltar ao país mesmo? E o seu apartamento lá? E os seus parentes?
Zouhair - Eu não pretendo voltar, mas minha esposa nunca deixa de pensar em voltar e meus parentes não querem sair de lá.
Pergunta - Existe solução para o conflito entre Israel e os povos mulçumanos?
Zouhair - Acredito que
não.
Pergunta - Como foi a travessia do comboio? Vocês ficaram com medo que o ônibus pudesse ser alvo de
ataques aéreos?
Zouhair - Sim. Até a fronteira da Síria ficamos com muito medo, pois em território libanês escutávamos muitos aviões passando e barulhos.
Pergunta - Qual a principal qualidade ou característica do povo libanês?
Zouhair - Receptividade e alegria
Pergunta - O número de libaneses no Brasil (5 milhões) é maior até que a população libanesa (3,6 milhões). Por que tantos libaneses querem viver no Brasil?
Zouhair - Por ser um país organizado e respeitoso e pela liberdade que se tem aqui. Gostaria de fazer um apelo que o mundo não discriminasse tanto o povo libanês, que é uma nação alegre e não pode ser extinta da terra.
Grupo RBS Dúvidas Frequentes | Fale Conosco | Anuncie | Trabalhe no Grupo RBS - © 2024 clicRBS.com.br Todos os direitos reservados.