| 13/05/2006 18h26min
O terror que assola São Paulo desde a noite desta sexta-feira teria uma marca, a do Primeiro Comando da Capital (PCC), facção criminosa surgida dentro do sistema carcerário daquele Estado. A autoria é apontada pela cúpula da segurança paulista. A revolta dos bandidos pode ter sido provocada pela transferência em massa de presos para o recém-reformado presídio de segurança máxima de Presidente Venceslau, no Interior, operação iniciada na quinta. O estopim da violência teria sido a tomada de depoimento de oito líderes do PCC no Departamento de Investigações Criminais (Deic), na Capital. Segundo as autoridades, as medidas foram tomadas para impedir rebeliões coordenadas que ocorreriam neste domingo, o Dia das Mães.
A resposta do mundo do crime veio de dentro e de fora das penitenciárias. Na rua, a barbárie deixou um saldo de 30 mortos, de acordo com números oficiais – a maior parte das vítimas é policiais ou agentes de segurança, além de dois civis. Foram 58 ataques incluindo a Capital, Grande São Paulo, Litoral e Interior. Nos presídios, apenados comandaram um total de 22 motins simultâneos, em ações que chegaram a perfazer um total de cem reféns ao mesmo tempo.
O PCC, que se autodenomina Partido, tem no currículo ações ousadas: é responsável por rebeliões, mortes, roubos, agressões, tráfico de drogas nos presídios, fugas e extorsão. A maior delas é de 18 de fevereiro de 2001, quando uma onda de rebeliões atingiu 29 penintenciárias de 19 cidades de São Paulo. Pela televisão, o Brasil conheceu a facção e assistiu, em flashes ao vivo, aos desdobramentos da ação que começara com 13 mil reféns – domingo é dia de visita na cadeia e muitos dos reféns eram parentes dos presos. Houve 19 mortes.
Até junho de 2000, o governo paulista negava a existência da facção criminosa. Ao mesmo tempo, tentava desarticular o grupo transferindo os seus líderes para prisões de outros Estados.
A história do PCC, no entanto, é mais antiga, do início dos anos 90. O grupo teria sido criado no Centro de Reabilitação Penitenciária (CRP), um anexo de segurança máxima da Casa de Custódia de Taubaté (SP) em 1993 em resposta ao massacre do ano anterior, quando 111 presos foram mortos no Complexo do Carandiru – hoje desativado. Em 1996, quando um estatuto do PCC foi divulgado, os líderes pediam "Paz, Liberdade e Justiça" e deixavam clara a ligação com o Comando Vermelho. Os colegas do Rio de Janeiro são conhecidos com os primeiros bandidos a se organizarem no Brasil, ainda na década de 1980.
Um dos líderes levados nesta sexta ao Deic paulista é Marcos William Herbas Camacho, o Marcola, conhecido dos gaúchos. Ele já passou duas temporadas em penitenciárias do Rio Grande do Sul. A primeira, em 2001, ocorreu pouco depois da onda de rebeliões. Marcola foi levado a Ijuí, mas deixou o município após pressão de autoridades e comunidade local. Um ano depois, Marcola ficaria outros 52 dias na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc). O Estado ainda abrigou outros integrantes da facção e foi palco da prisão de bandidos ligados a ela. Em fevereiro de 2002, a Polícia Federal desbaratou, em Porto Alegre, o embrião da organização no Estado. O bando, que havia transformado uma casa em QG do crime, na Vila Floresta, planejava, entre outras ações, roubar malotes de dinheiro no Aeroporto Salgado Filho.
Em novembro de 2003, o PCC fez a primeira investida orquestrada de ataques contra policiais. Em 17 ações na região da Grande São Paulo, nove policiais ficaram feridos e pelo menos dois morreram. Os bandidos exigiam o retorno de visitas íntimas, liberação de partidas de futebol, entre outros direitos que haviam sido suprimidos Presídio de Presidente Bernardes em função do combate à organização.
Além da sigla PCC, a organização é conhecida pelos números 1533, que correspoderiam às letras do alfabeto.
• Confira o estatuto do PCC, divulgado em 1996
1 – Lealdade, respeito e solidariedade acima de tudo ao Partido.
2 – A luta pela liberdade, justiça e paz.
3 – A união na luta contra as injustiças e a opressão dentro da prisão.
4 – A contribuição daqueles que estão em liberdade com os irmãos dentro da prisão, por meio de advogados, dinheiro, ajuda aos familiares e ação de resgate.
5 – O respeito e a solidariedade a todos os membros do Partido para que não haja conflitos internos – porque aquele que causar conflito interno dentro do Partido, tentando dividir a irmandade será excluído e repudiado pelo Partido.
6 – Jamais usar o Partido para resolver conflitos pessoais contra pessoas de fora. Porque o ideal do Partido está acima dos conflitos pessoais. Mas o Partido estará sempre leal e solidário a todos os seus integrantes para que não venham a sofrer nenhuma desigualdade ou injustiça em conflitos externos.
7 – Aquele que estiver em liberdade "bem estruturado", mas esquecer de contribuir com os irmãos que estão na cadeia, será condenado à morte sem perdão.
8 – Os integrantes do Partido tem de dar bom exemplo a serem seguidos e, por isso, o Partido não admite que haja assalto, estupro e extorsão dentro do Sistema.
9 – O Partido não admite mentiras, traição, inveja, cobiça, calúnia, egoísmo e interesse pessoal, mas sim a verdade, a fidelidade, a hombridade, solidariedade e o interesse comum de de todos porque somos um por todos e todos por um.
10 – Todo o integrante terá de respeitar a ordem, a disciplina do Partido. Cada um vai receber de acordo com aquilo que fez por merecer. A opinião de todos será ouvida e respeitada, mas a decisão final será dos fundadores do Partido.
11 – O Primeiro Comando da Capital – PCC – fundado no ano de 1993, numa luta descomunal, incansável contra a opressão e as injustiças do campo de concentração "Anexo da Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté", tem como lema absoluto "A Liberdade, a Justiça e a Paz."
12 – O Partido não admite rivalidade interna, disputa de poder na liderança do Comando pois cada integrante do Comando saberá a função que lhe compete de "acordo" com sua capacidade para o exercício.
13 – Temos de permanecer unidos e organizados para evitarmos que ocorra novamente um massacre semelhante ou pior ao ocorrido na Casa de Detenção em 2 de outubro de 1992, onde 111 presos foram covardemente assassinados, massacre esse que jamais será esquecido na consciência da sociedade brasileira. Porque nós do Comando vamos sacudir o sistema e fazer essas autoridades mudar a política carcerária, desumana, cheia de injustiça, opressão, tortura e massacres nas prisões.
14 – A prioridade do Comando no momento é pressionar o governador do Estado a desativar aquele campo de concentração "Anexo à casa de Custódia e Tratamento de Taubaté" de onde surgiu (sic) a semente e as raízes do Comando por meio de tantas lutas inglórias e tantos sofrimentos atrozes.
15 – Partindo do Comando Central da Capital do KG do Estado, as diretrizes de ações organizadas e simultâneas em todos os estabelecimentos penais do Estado são uma guerra sem trégua, sem fronteiras, até a vitória final.
16 – O importante de tudo é que ninguém nos deterá nesta luta porque a semente do Comando espalhou por todos os Sistemas Penitenciários do Estado e conseguimos nos estruturar também do lado de fora com muitos sacrifícios e muitas perdas irreparáveis mas nos consolidamos a nível estadual e a médio e longo prazo nos consolidaremos a nível nacional. Em coligação com o Comando Vermelho – CV e PCC iremos revolucionar o país de dentro das prisões e o nosso braço armado será o Terror dos Poderosos, opressores e tiranos que usam o Anexo de Taubaté e o Bangu I do Rio de Janeiro como instrumento de vingança da sociedade na fabricação de monstros. Conhecemos a nossa força e a força de nossos inimigos Poderosos, mas estamos preparados, unidos. E um povo unido jamais será vencido. Liberdade, Justiça e Paz.
O Quartel general do PCC, Primeiro Comando da Capital, em coligação com o Comando Vermelho – CV.
"Unidos Venceremos"
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