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Itapema FM  | 11/10/2012 15h35min

Entrevista: Fernando Gabeira fala sobre corrupção, o PT e relembra momentos marcantes de sua carreira

O ex-deputado federal encerrou o Fronteiras do Pensamento na quarta-feira, em Florianópolis

Roberta Ávila  |  roberta.avila@diario.com.br

É a terceira vez que Fernando Gabeira participa do Fronteiras do Pensamento, evento que traz pensadores importantes de várias partes do mundo para discuterem temas como sustentabilidade, o futuro do cinema e a filosofia no século 20.

Leia a primeira parte da entrevista de Gabeira

Diário Catarinense - Em um texto recente seu você escreveu que o pragmatismo cavou um abismo entre as propostas do passado do PT e a realidade presente. É necessário para um político deixar seus ideais de lado para se focar na prática?

FG - É exatamente isso que a gente tá questionando, existe uma máxima na política que por muito tempo dominou o pensamento de esquerda, que diz que os fins justificam os meios. A política do século 21, pelo menos o que ela tem de mais iluminada, já questiona isso. Se você desrespeita a lei para obter um determinado resultado, ainda que ele seja positivo, você compromete a sua decisão. Então os fins não justificam os meios, e os meios tem que ser democráticos também para que o fim seja democrático.

DC - Que é o o rouba mas faz...

FG - É! (risos) Ou o rouba mas faz, que era a visão populista de direita, ou a visão populista de esquerda que é: rouba, mas a população está melhorando de vida.

DC - Essa atitude do PT, como você colocou on seu texto, a dificuldade de fazer uma autocrítica, isso vai trazer prejuízo para a democracia brasileira?

FG - Eu acho que vai trazer um prejuízo para o PT. Existe uma tendência moderna de negar as evidências, de achar que você tendo uma versão e repetindo-a ad nauseum você vai confundir o espectador. Mas acontece que essas evidências foram passadas pelo tribunal e examinadas exaustivamente em televisão e ao vivo.

Esse choque com as evidências e essa recusa das evidências vai ser pior para o PT, mas a democracia, pelo contrário, ficará mais tranquila, já que o PT já definiu que não aceita a democracia quando ela não atende aos seus interesses. Dentro do PT existe uma hierarquia e é uma estrutura fechada, que não vai ser vencida pelo mensalão, vai ser vencida pela realidade, pela organização em rede.

Os partidos são anacrônicos, são elefantes do século passado e não respondem mais à realidade. Eles não agem como exércitos disciplinados e a guerra hoje é outra. Então acho que os partidos mais sólidos que virão no futuro não são os mais disciplinados, mas aqueles que sabem acionar a riqueza da sociedade, e esses são só uma parte dessa rede.

DC - A repetição é um método do PT para confundir a opinião pública?

FG - Eles têm vários métodos. Acham que a opinião pública não presta muita atenção nos fatos e se move de uma forma emocional. Então se você melhora as condições de vida dela você pode fazer qualquer coisa e quando acusado você diz: isso é uma acusação do meu adversário e as pessoas vão se colocar do lado de quem fez uma coisa boa por elas.

DC - Isso serve tanto para a imprensa quanto para a população?

FG - Sim. O Lula é o exemplo vivo disso. Ele fala o que quer na hora em que escolher e não se importa, porque ela acha que as pessoas acreditam nele independente de qualquer realidade.

DC - Você já levantou bandeiras como a da legalização da maconha e da prostituição e o casamento homossexual, como você vê esses assuntos hoje?

FG - Eu evolui a questão da legalização da maconha. Hoje eu acredito que para se fazer isso é preciso reformar a polícia. As experiências que eu tive na Holanda e na Inglaterra mostram uma polícia muito desenvolvida por trás disso, foi sugestão deles, inclusive, porque eles têm mais o que fazer do que ficar prendendo quem está fumando um baseado. Então hoje eu proponho a legalização com essas etapas.

No caso das prostitutas eu continuo achando que não há nenhuma razão para não se legalizar. Existem argumentos de que as prostitutas dissolvem a família. Não é verdade. Muitas vezes até elas fortalecem famílias que precisam dessa válvula de escape. Além disso, as prostitutas sustentam suas famílias. Existe o argumento das feministas de que o sexo deveria ser feito apenas com amor. Eu concordo, mas não posso proibir quem faz sexo sem amor.

E o casamento gay já é uma realidade, o próprio supremo chancelou, então essas lutas são apresentadas e com o tempo elas vão ficando mais populares, mais banais. Eu só peguei a fase mais popular, onde ainda era um escândalo falar disso. (risos)

DC - Você acompanhou muitos momentos históricos, como o golpe militar no Chile em 73, a queda do Muro de Berlim, também morou em muitos países, foi exilado, que momentos foram mais marcantes para você?

FG - Acompanhei a queda do império soviético e a fragmentação da Iugoslávia. Foi um momento muito interessante. A proclamação da independência da Croácia foi muito marcante. Eu por acaso estava chegando a Zagreb e não havia repórter nenhum. O presidente saiu pelas ruas correndo com os braços abertos e eu falei "peraí, deixa eu fazer uma foto então" e fiz. Foi muito interessante.

Na Eslovênia uma noite os jornalistas foram convidados para jantar com o presidente depois da independência e quando saímos os aviões estavam sobrevoando ameaçadoramente a cidade.

O golpe do Chile também foi muito impressionante. Eu estava em Santiago e o golpe do Chile foi preparado ao longo do tempo, mas quando ele aconteceu foi surpreendente. Eu por acaso estava perto do Palácio de la Moneda, que estava em chamas, vi os aviões sobrevoando e ouvi tiroteios, daí fui para a casa e esperei o momento para ir para a embaixada da Argentina e me preparar para o que viria.

Agora um momento de grande alegria foi quando eu voltei ao Brasil depois quase de 10 anos de exílio. Antes disso eu só tinha visto o Rio a caminho da Argentina, depois do golpe do Chile. Vi o Rio do avião.

DIÁRIO CATARINENSE
Daniel Conzi / Agencia RBS

"As apresentações têm um excelente nível e os convidados internacionais são muito bons"
Foto:  Daniel Conzi  /  Agencia RBS


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