| 26/02/2010 04h43min
O Ministério da Saúde promete para hoje a divulgação de um mapa completo da dengue no Brasil, mas as informações obtidas até o momento revelam uma preocupante escalada da doença. Em pelo menos seis Estados, a enfermidade atingiu o status de epidemia.
A explosão do número de doentes se deve sobretudo aos dias de calor intenso, só amenizados por chuvas constantes.
– Em períodos muito quentes e chuvosos, aumenta o número de criadouros do mosquito, em poças de água e nichos. E no calor, o mosquito Aedes aegypti se torna mais ativo. Associado às altas temperaturas, há um fator comportamental. Hoje em dia a movimentação de pessoas é muito grande, criando um cenário propício para o aumento dos casos – explica Jair Ferreira, epidemiologista do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
Em gráfico, entenda a doença:
Seis Estados já integram a lista da epidemia de dengue: Acre, Distrito Federal, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Rondônia. Em São Paulo, a estimativa do governo estadual é de que os casos já passam de 7 mil neste ano – quase o número registrado em todo 2009. Em Mato Grosso do Sul, há 43 cidades com incidência considerada alta: maior do que 300 casos por 100 mil habitantes. No Paraná, já foram feitas 3 mil notificações da dengue neste ano, com 530 confirmações – em 2009, foram 893 casos confirmados o ano inteiro. A primeira morte do Estado, em Londrina, foi confirmada ontem – algo que não ocorria desde 2002. No Rio Grande do Sul, o Hospital de Caridade de Ijuí reservou ontem uma ala com 50 leitos a pacientes com suspeita de dengue. Onze dos leitos já estavam ocupados.
A possibilidade de o vírus dos casos registrados em Ijuí ser de uma
tipagem diferente da do surto que
atingiu Giruá em 2007 é outro fator preocupante, como mostra o exemplo do Paraná.
– Quando há mais de um tipo de vírus em circulação juntos, e no Paraná estão circulando os três, aumentam as chances de uma pessoa sofrer uma segunda infecção por uma cepa diferente de vírus e desenvolver a dengue hemorrágica, em que, de cada cinco casos, três resultam em óbito – diz o secretário estadual de Saúde, o médico sanitarista Gilberto Martin.
Ijuí destinou uma equipe só para atender doentes
Devido a tantos sinais de alerta, a estratégia escolhida pelas autoridades tem sido a de prevenir e tentar diagnosticar os casos com rapidez. Em Ijuí, o Hospital de Clínicas está com uma equipe destinada exclusivamente para o atendimento a pessoas com suspeita de dengue (60 profissionais se revezam 24 horas por dia). Mesmo assim, a orientação segue sendo para que os moradores com sintomas de dengue procurem primeiro as unidades básicas de saúde dos bairros, que contam com
profissionais capacitados para
identificar a doença.
A cidade gaúcha também se assustou com a temida dengue hemorrágica. Uma mulher de 61 anos foi examinada, mas a suspeita não foi confirmada. De acordo com o médico que está acompanhando a paciente, Celso da Silva Mello, tratava-se de caso da dengue clássica, e a paciente já havia apresentado melhora.
Ontem à tarde, a prefeitura pôde dar continuidade aos trabalhos com a chegada de mais inseticida. A área de aplicação do fumacê foi ampliada. Segundo o secretário municipal de Saúde, Claudiomiro Pezetta, 244 quarteirões da cidade receberão o veneno para eliminar o mosquito.
Municípios próximos a Ijuí também começaram ontem a adotar medidas de prevenção. Apesar de não ter registrado nenhum paciente com suspeita de dengue, Santiago, distante a 220 quilômetros do foco da contaminação, decretou alerta epidemiológico. Seis agentes de saúde monitoraram armadilhas espalhadas para pegar o mosquito em bairros da cidade.
*Colaborou Leila Endruweit
Como Calae venceu a doença
Leandro Belles
O mecânico Adalberto Calae, 65 anos, foi um dos primeiros moradores de Giruá a ser contaminado com a dengue, no surto de 2007. Neste ano, o pequeno município, no noroeste do Estado, foi aterrorizado pela doença. Em poucas semanas, haviam mais de 230 casos suspeitos.
Ele recorda que acordou na madrugada de um domingo com fortes dores de cabeça e com febre alta. Levantou da cama e não dormiu mais. No final do dia, foi até um posto médico para procurar ajuda. Ele suspeitava que havia sido vítima da picada do mosquito.
– O médico me disse que era impossível, que não existia dengue no Rio Grande do Sul e muito menos em Giruá. Como já havia papo de que tinha o mosquito por aqui suspeitei – conta.
Medicado, Adalberto retornou para casa, mas não melhorou. Na segunda-feira, procurou outro médico que lhe repetiu a conversa do primeiro atendimento.
Com febre ainda alta e dores no corpo, recebeu o diagnóstico de uma
virose. Insatisfeito, pediu novamente que o teste da dengue fosse feito. A partir daí, começou a ser acompanhado pelo médico. Uma semana depois dos primeiros sintomas, quando seu estado de saúde havia melhorado, o resultado confirmou sua desconfiança: era dengue.
– Foi um susto, mas como já estava melhor, relaxei. Por sorte, ninguém da família pegou a doença – recorda.
Durante os sete dias em que esteve doente, o mecânico não foi ao trabalho e emagreceu quase 10 quilos. A mulher e seus dois filhos ficaram em prontidão para cuidar do pai.
O medo de contágio rondou a casa dos Calae por semanas. Agora, com a volta da doença na região, eles ajudam a prefeitura na vigilância de possíveis focos de dengue. Por já terem vivido o problema, querem evitar que a história se repita com outras famílias.