Não interessava o assunto
em debate - a crise do Oriente Médio, a privatização
da água, a situação dos índios,
o combate à Aids, a especulação financeira,
a guerra do Afeganistão. Qualquer conferência
do Fórum Social Mundial (FSM) sempre teve alguém
para mirar, por algum desvio da palestra, na Organização
das Nações Unidas (ONU).
Como esse foi o fórum
do julgamento dos organismos internacionais, a ONU pode pelo
menos consolar-se por não ter sido um alvo solitário.
O Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial
(Bird) e a Organização Mundial de Comércio
(OMC) também levaram bordoadas.
O argentino Adolfo Pérez
Esquivel, o americano Noam Chomsky, o português Mário
Soares, o francês Jean-Pierre Chèvenement - todos,
com dezenas de outros painelistas menos conhecidos, cutucaram
a ONU. A instituição tenta cuidar de tudo e
não estaria cuidando bem de nada. Tem organismos e
programas para alimentos e agricultura (FAO), saúde
(OMS), educação e cultura (Unesco), infância
(Unicef), drogas e crimes (UNDCP), trabalho (OIT), ambiente
(PNUMA), comércio (UNCTAD).
O colombiano José Antônio
Ocampo, por exemplo, que leu a carta do secretário-geral
Kofi Annan ao FSM, cuida da Comissão Econômica
para a América Latina e o Caribe (Cepal), uma entidade
com sede em Santiago do Chile, inquieta e perturbadora nos
anos 70, que já abrigou, como pesquisadores, Fernando
Henrique Cardoso, Celso Furtado, José Serra, Maria
da Conceição Tavares, Paulo Renato Souza, e
que hoje não tem nenhuma expressão.
A ONU esvazia-se em várias
frentes, mas sua fragilidade estaria exposta mesmo na omissão
do cumprimento do propósito número 1. Diz o
propósito que é missão da ONU "manter
a paz e a segurança internacionais". Os outros
três propósitos são: desenvolver relações
de igualdade de direitos entre as nações, conseguir
a cooperação internacional para resolver problemas
econômicos, sociais e culturais, estimulando o respeito
aos direitos humanos, e harmonizar as nações.
Esquivel - membro do comitê
executivo para Direitos Humanos da instituição
- acha que a ONU militarizou suas decisões, transferindo
para o Conselho de Segurança questões que deveriam
ser tratadas politicamente pela assembléia-geral, o
grande fórum da entidade.
Chomsky entende que a ONU
foi esvaziada porque os Estados Unidos "se opõem
aos esforços internacionais pelo domínio da
lei". E Mário Soares nota que os EUA demonstram
seu desprezo pela organização com o calote,
negando-se a pagar a contribuição como sócios.
Como última das superpotências, não têm
mais interesse em preservá-la.
A ONU foi criada em 1945,
um ano depois do FMI e do Bird. Todos são filhos do
esforço para que as relações mundiais
no pós-guerra fossem reguladas por organismos institucionais.
Esclerosados, não seriam inúteis - como defendem
os que querem a extinção de todos eles -, mas
estariam cansados e caducos.
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