Tarso Genro, prefeito de Porto Alegre
Porto Alegre cidade aberta

     Muito acima das questões de natureza partidária ou de facciosismos ideológicos, o fato de Porto Alegre, hoje, ser uma referência nacional e internacional, orgulha a todos os porto-alegrenses. Este resultado não é a conquista de um partido, mas produto de um acúmulo histórico da sua cidadania, logo de todos os partidos e posições políticas.

     Por diversas formas e através de diversos caminhos - inclusive na oposição - todos produzimos condições políticas, culturais e administrativas, que permitiram que a cidade se tornasse um exemplo de democracia. A vontade de justiça e de solidariedade, aqui, teve um palco privilegiado para os atores mais diversos e plurais.

     Não se trata de sustentar que tenhamos condições de vida superiores a outras grandes cidades do país e do mundo, mas de compreender que criamos instrumentos de resistência a um modo de vida, hoje quase universal. Nele a indiferença e o isolamento tornam-se normas de conduta: o egoísmo substitui, acima das convicções políticas e religiosas, as virtudes da afetividade, e os excluídos são apenas uma estatística das ocorrências policiais.

     Estamos recebendo visitantes de todos os cantos do mundo neste Fórum Social Mundial e neste 2º Fórum Mundial de Autoridades Locais Pela Inclusão Social. Numa época de chacinas tribais, de atentados terroristas insanos, de retorsões militares sem qualquer seletividade e violadoras do Direito Internacional; numa época em que a palavra solidariedade não tem qualquer significado e que querem nos impor a estetização da morte como lazer - através de vídeos e filmes -, a nossa cidade resiste e constrói.

     Em Porto Alegre nossos visitantes verão todos os problemas sociais que caracterizam, em maior ou menor grau, as suas próprias cidades: desemprego, exclusão, crianças e adolescentes instrumentalizados pelo crime, zonas urbanas empobrecidas e tristes. Quem conhece o mundo sabe que o primeiro mundo e a periferia unificaram-se, não somente pela globalização financeira, mas também pela degradação das condições de vida que, para vastas parcelas da população, tornaram-se as mesmas em todos os quadrantes do mundo.

     Mas os processos políticos que fizeram da nossa cidade uma referência democrática internacional - o Orçamento Participativo, a inversão das prioridades nos investimentos públicos, a cidade como sujeito ativo da política internacional, a melhoria dos indicadores sociais em momentos de crise aguda das políticas sociais em todo o mundo - estão presentes neste evento. Uma certa mitificação da cidade, que acompanha o seu prestígio, não tira o mérito das suas conquistas coletivas.

     Porto Alegre recebe com carinho os seus visitantes. Não é verdadeira a afirmativa de que estão aqui somente personalidades da esquerda mundial. Aqui estão representantes de todas as correntes de opinião de caráter democrático, que não aceitam o mundo como está, que rejeitam os padrões de desenvolvimento elitistas e predatórios dos manuais do FMI, que arrasaram a Argentina e vêm semeando pobreza e desespero.

     Aqui estão os inconformados de todas as ideologias democráticas e de todas as culturas libertárias que - com suas grandezas e limitações - apostam num mundo de fraternidade e de justiça. Aquela velha utopia iluminista, que persegue a Humanidade desde que os seres humanos passaram a reconhecer-se como iguais em direitos e destinados a viverem em liberdade.