Convidados
L.F. Verissimo - 27/12/2001

     Não é uma má idéia trazerem o Fidel Castro para o 2º Fórum Social Mundial de Porto Alegre. Como o José Bové provavelmente estará numa cadeia francesa, Fidel faria o seu papel, entretendo a imprensa e causando apoplexia na direita, o que também é divertido, enquanto o Fórum se ocupa de coisas sérias. Não há perigo de o Fidel atacar plantações de transgênicos como o Bové, pois Cuba faz suas próprias experiências com a biogenética, embora não, que se saiba, sob tutela da Monsanto, ou liderar manifestações contra os McDonalds, pois o que ele mais quer na sua ilha é turista americano, que, como se sabe, não é muito de "arroz com pollo". Além do Fidel para a parte festiva, sugiro que se convide o sociólogo brasileiro Fernando Henrique Cardoso (não confundir com o presidente do mesmo nome) para a parte conseqüente. Cardoso tem feito importantes pronunciamentos no Exterior sobre a necessidade de uma globalização solidária como a defendida pelo Fórum. Declarou-se favorável à tributação das operações internacionais do grande capital especulativo, outra reivindicação do Fórum, além de fazer críticas mais ou menos veladas ao modelo econômico neoliberal imposto no seu país pelo seu xará, muito criticado no Fórum. E não teve medo nem de chocar setores moderados do PT, sugerindo que as relações assimétricas da atual economia mundial também são uma forma de terrorismo. E isso pouco depois do 11/9!

     Outro que poderiam convidar é o Rubens Ricúpero, minha atual cult-figura, junto com a Patrícia Poeta. Recomendo a quem não leu o que Ricúpero escreveu na Folha de S. Paulo do último domingo, uma genealogia da crise argentina feita com sentimento e lucidez. "Ainda há quem pense que globalização e liberalização sejam sinônimos", escreve Ricúpero, "quando a verdade é que a primeira só se serve da segunda seletivamente, excluindo-a sempre que convenha a seus interesses, como se acaba de ver com o fast track nos Estados Unidos." Depois de ser uma filha mimada da globalização vitoriana, a Argentina foi expulsa da divisão internacional do trabalho e obrigada a endividar-se por não poder exportar os produtos em que era competitiva. Foi mais uma vítima do que Ricúpero chama de "integração perversa a uma globalização injusta que perpetua o subdesenvolvimento e as crises" e que precisa mudar de forma e qualidade. Rubens Ricúpero, é bom lembrar, é secretário-geral da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento, com sede em Genebra, não um perigoso radical de esquerda como eu e o Cardoso.