Pedro Rockenbach

Caminhos do contrabando

S

ão os motoristas quem normalmente caem nas mãos da polícia. Eles ganham, em média, entre R$ 700 e R$ 2 mil, dependendo do tamanho da carga. Em Santa Catarina, 270 pessoas foram presas por esse crime, desde 2014. Uma a cada cinco dias. Processos por contrabando e descaminho lideram as estatísticas da Justiça Federal catarinense.

É um dinheiro fácil, mas se o cara vai preso, acaba gastando cinco, 10 vezes mais com fiança e advogado. Conversei com um caminhoneiro preso em flagrante. Levava 400 mil maços de cigarro para Jaraguá do Sul.

– Eu trabalho puxando madeira. Mas meu caminhão está com o motor fundido há nove meses. Me ofereceram R$ 2 mil para levar essa carga. Acabei aceitando. Nunca fui preso, agora vou ter que ligar pra minha filha me ajudar. É aquela coisa, a gente paga caro pelo erro – disse.

Tem também uma multa da Receita de R$ 1 mil por caixa. No caso dele, R$ 800 mil ao todo. Dificilmente terá condições de pagar e vai passar pelo menos cinco anos com o CPF sujo.

Suja para eles, fica limpo para os patrões, aqueles que financiam as cargas. Mas esses raramente têm cara e nome. É muito difícil a polícia botar a mão neles.

– Grande parte das vezes, eles (motoristas) se mantêm em silêncio, não há outros elementos, as informações dos veículos são todas falsas e você não consegue explorar melhor os outros envolvidos, quem seria o dono da carga – Carlos Fistarol, chefe da delegacia Fazendária da PF em SC.

A maior operação da Polícia Federal no Estado, este ano, para pegar cigarreiros aconteceu em julho. Duas pessoas da mesma família foram presas, e 400 mil maços apreendidos. Valor da carga: R$ 1 milhão.

Só em 2017 já foram apreendidos R$ 54 milhões em cigarro contrabandeados em Santa Catarina. Quase todos os flagrantes aconteceram nas estradas. Ano passado, calcula-se em R$ 350 milhões a evasão fiscal relacionada a esse crime. Os números mostram que este ano deve ser ainda maior.

Subo a ladeira do Morro da Cruz, na região central de Florianópolis. Chego ao fim da minha caminhada na rota do contrabando. Da laje de um boteco fundo de quintal vejo o pôr do sol na Beira-Mar Norte. O lugar é uma bagunça. Engradados de cerveja empilhados de qualquer jeito, um fogão velho e todo engordurado se escora na parede para ficar em pé, panelas velhas estão ainda mais sujas, tomadas por moscas. Pergunto a um homem por que ele fuma cigarro paraguaio. Ele devolve sem surpresas na resposta.

— Porque é mais barato.

Conto tudo o que vi e descobri em três meses de apuração. E sigo com a entrevista. Quero saber se ele imaginava todo esse rastro de crimes e prejuízos escondidos dentro daquele cigarro.

— Nem imaginava – ele diz.

Finalizo a conversa com uma última pergunta:

— Vai deixar de fumar esse tipo de cigarro?

— Não, não vou. Sou honesto, admito que não vou. É o vício.

Antes de sair, vejo ele acender o próximo. Paro e olho com calma aquele ritual. E, então, entendo que ali, quando o fogo faz a brasa, não é o fim, mas o início de tudo.

QUEM SOMOS

Repórter

Pedro Rockenbach

Editora

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Editor de fotografia

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