Do amanhecer ao cair da noite, a vida não para. Trabalhadores sustentam a família abastecendo os navios que percorrem o mundo levando alimentos e produtos manufaturados. As toninhas, uma espécie de golfinho, nascem, crescem e envelhecem na Babitonga. O guará, ave aquática ameaçada de extinção, voltou para a baía após um século ausente. Peixes entram e saem e várias outras espécies se reproduzem e seguem, dia após dia, o ciclo natural da vida. Bem-vindo à baía da Babitonga.

São Francisco do Sul está a caminho de receber investimentos que somam cerca de R$ 1,5 bilhão, todos eles ligados à baía da Babitonga. Dois terminais portuários (TGB e Mar Azul) e um estaleiro (CMO) aguardam o licenciamento ambiental para iniciarem as obras. Diante da pressão mundial por alimentos, da crescente produção agrícola brasileira e da falta de infraestrutura para escoar toda a produção nacional, a vocação econômica da Babitonga tem atraído os olhares de empreendedores.

 

É o caso do Terminal Graneleiro da Babitonga (TGB). O investimento de cerca de R$ 500 milhões vai gerar mil empregos na fase de instalação e 295 depois que entrar em operação.

 

Já a Norsul, empresa responsável pelo terminal Mar Azul, vai investir R$ 350 milhões. Estão previstos 250 postos de trabalho na fase de implantação e cerca de 100 quando o porto estiver em operação.

 

O maior investimento, no entanto, vem do setor naval. O estaleiro CMO vai custar R$ 650 milhões. O empreendimento vai gerar 2 mil empregos na fase de instalação e 2,5 mil na fase operacional.

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Mil trabalhadores estão ligados a
toda cadeia
portuária

Para quem olha pela primeira vez, não parece tão atrativo. Com um pouco mais de atenção, a vida neste berçário e fonte de alimento para muitas espécies torna-se mais visível e fascinante.

A baía da Babitonga abriga a mais expressiva formação de manguezais de Santa Catarina, sendo também a última grande ocorrência deste ecossistema para o hemisfério Sul. Cercado por árvores típicas, o manguezal é um ambiente protegido das ondas, o que aumenta a sobrevivência das espécies.

 

A lama característica é rica em nutrientes que vêm dos rios e passam pelo mangue antes de ir para o mar. O caranguejo faz a sua parte: revolve a terra e, com isso, permite a passagem de oxigênio.

 

Os manguezais são considerados um dos sistemas ecológicos mais importantes. Estima-se que 70% das espécies relacionadas à pesca costeira comercial ou recreativa dependem do manguezal em alguma etapa de seu ciclo de vida.

Ele voltou e está sendo muito bem vigiado. O guará retornou à baía da Babitonga em 2011, após mais de cem anos ausente. Pesquisadores acompanham o repovoamento desta ave aquática cujas penas exibem um vermelho intenso. O pesquisador Alexandre Grose faz doutorado na Universidade Federal do Paraná em zoologia e estuda especialmente o guará. Ele explica que a ave nasce cinza e depende do caranguejo para se alimentar. À medida que se torna adulta, a partir do primeiro ano de vida, as penas cinzas ou brancas são substituídas gradualmente e o corpo todo fica vermelho. Se for impedida de comer caranguejo, porém, a pena voltará a ficar cinza. Existem mais de 50 ninhos de guará na lagoa do Saguaçu, na Babitonga, o único lugar em Santa Catarina onde eles vivem livremente.

Se fosse para escolher ser outra coisa na vida, Itamar Orestes Frigieri optaria novamente por ser pescador. Dos seus 43 anos, mais da metade deles teve como companheiras as águas da baía da Babitonga, de onde tira o sustento para manter a casa em que vive com os pais.

Lá, o relógio desperta cedo: às 5 horas, Itamar levanta e arruma o material de trabalho. Redes, gerival (conhecido como berimbau, utilizado para fazer o arrasto), água, gelo, colete salva-vidas, guarda-sol e documentação de pescador profissional vão com ele para o mar, por volta das 6 horas. O barco só volta a sentir a terra lá pelas 14 ou 15 horas, quando retorna com os camarões-brancos.

— Uns 20 quilos, se o dia for bom — enumera.

Conforme o vento e a maré, já é possível prever se a pesca será produtiva. A ajuda dos amigos é sempre bem-vinda.

— Quando estamos na água, avisamos os amigos onde está seguindo o camarão — explica Aristides Uller, 57 anos, conhecido na comunidade como Faixa.

 

Itamar e Faixa costumam estar próximos na hora da pescaria.

— Já vi a morte pelos olhos, às vezes somos pegos de surpresa — diz Itamar, que, para fugir do perigo, mantém a precaução. Caso o vento não sopre a favor, melhor ficar em casa.

A toninha é a espécie de golfinho mais ameaçada do oceano Atlântico Sul ocidental. Na Babitonga, fica a única população residente de uma baía. Isto significa que ela depende do estuário para se alimentar, se reproduzir e cuidar dos filhotes, e não faz movimentos de entrada e de saída do local. Faz parte da lista de animais ameaçados de extinção que encontram abrigo na baía.

 

As toninhas podem ser vistas o ano todo, mas não em todo lugar. Sensível, esta pequena população, com cerca de 50 indivíduos, restringe-se à região mais interna da baía. Em 15 anos, os pesquisadores nunca a viram perto dos portos.

 

Os leigos confundem a toninha com o boto-cinza, que é um pouco maior e mais exibido. Por ser mais tolerante, ele se aproxima do canal de acesso em busca de alimento, uma vez que ali é área de passagem para a grande maioria das espécies de peixes marinhos, explica a bióloga Marta Cremer.

 

Os botos até se aproximam dos navios e usam a embarcação como barreira para encurralar o cardume de peixe. Na Babitonga, a população de botos-cinza é maior do que a de toninhas e chega a 208 indivíduos.

A força dos portos

 

A atividade portuária na região da Babitonga gera cerca de 10 mil empregos, considerando-se toda a cadeia envolvida, na estimativa do prefeito de São Francisco do Sul, Luiz Zera.

 

A cidade depende do porto público. Sozinho, ele representa 70% da receita da Prefeitura. A movimentação de grãos é intensa e responde por 10% de toda a soja exportada no Brasil. Fazem parte do corredor de exportação as empresas Terlogs, Bunge e Cidasc. Em 2014, o Porto de São Francisco do Sul registrou recorde histórico de 13,3 milhões de toneladas movimentadas.

 

Um novo terminal privado, em terreno contíguo ao porto, foi aprovado pela Secretaria Especial de Portos da Presidência da República no ano passado. O Terminal de Granéis de Santa Catarina (TGSC) representa um investimento de R$ 600 milhões.

 

Próximo ao canal de acesso está o Porto Itapoá, inaugurado em 2011. O terminal tem capacidade para movimentar 500 mil TEUs (contêiner de 20 pés) por ano. Em 2013, chegou a quase 100% de sua capacidade operacional de movimentação.

Vocação
natural para
o transporte marítimo

A dieta do caranguejo é
o que dá a
cor vermelha
ao guará

Caranguejo ajuda a
oxigenar
a terra

Se saltar é boto-cinza. A toninha é mais discreta

PASSE O MOUSE

Mangue é vital para a atividade pesqueira

10% da soja brasileira ganham o mundo a partir da Babitonga

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