| 15/03/2006 16h32min
Com estréia planejada para o dia da independência, a TV brasileira deve ser digital até setembro, mas o padrão será importado. Conforme o professor e pesquisador da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Valério Brittos, o Brasil ainda está longe de um padrão próprio do sistema.
– A pesquisa (no Brasil) avançou bastante, especialmente no desenvolvimento do set top boxes e de componentes, podendo chegar a ao que eu chamo de solução nacional, que seria uma adaptação evolutiva de um dos grandes três padrões consagrados. Mas ainda estamos longe de um padrão brasileiro de TV Digital – lamenta o professor.
Em entrevista online concedida ao clicRBS, o pesquisador falou sobre as implicações por trás da demora na escolha do padrão, que está entre Estados Unidos, Europa e Japão, além de explicar as mudanças que a tecnologia deve trazer para o meio e para a população.
– Cada vez mais as pessoas interessam-se pelo avanço tecnológico,. O problema, agravado no Brasil, é a dificuldade de recursos de grande parte da população brasileira.
Mesmo distante de um padrão próprio, o alvo não é inalcançável:
– Em tese é possível, pois temos inteligência nacional para tal. Mas isso demanda recursos econômicos e tempo que o Brasil não terá como dispor.
Enquanto a proclamação da independência tecnológica não chega, a pedida é ter cautela com o bolso, na hora de considerar trocar de aparelho.
– Se a pessoa puder esperar vale a pena já que inexiste no Brasil venda regular de televisores capacitados para receber a transmissão digital a ser adotada no país. Contudo, não será necessário trocar de aparelho doméstico imediatamente.A atual transmissão analógica prosseguirá por um período de, no mínimo, 10 anos – aconselha e esclarece o professor
• Leia a íntegra da entervista
Pergunta de internauta: Por que o governo está demorando tanto para anunciar o padrão que será
usado no Brasil? O que isso envolve?
Valério Brittos: Envolve muito dinheiro e interesse, por parte dos detentores dos padrões, radiodifusores, empresas de telefonia e fabricantes de equipamentos da área em geral. A pressão tem sido muito grande por todos os lados. O problema é que os operadores dos canais abertos tradicionalmente dispõem de um poder de barganha e influência muito superior a qualquer outro agente. No meio disto está a sociedade, que normalmente não é ouvida. A decisão ainda não saiu, principalmente, pela ação do padrão europeu, que agora está disposto a avançar a negociação, e as telefônicas. Mas a tendência é que seja vitoriosa a proposta dos radiodifusores.
Pergunta de internauta: As empresas de telefonia móvel não vão entrar em conflito com empresas de mídia pra difundir conteúdo de imagem e som?
Valério Brittos: Pelo modelo que o Brasil deve adotar, não. Tudo indica que a transmissão ficará concentrada nos atuais radiodifusores. Um outro caminho, que é separar a distribuição da programação/produção de conteúdos, não deve ser adotada no país.
Pergunta de internauta: Qual é a primeira ação da TV digital que o usuário comum vai perceber? Haverá mudanças imediatas no sinal convencional?
Valério Brittos: A primeira ação de TV digital a ser percebida depende do caminho a ser adotado no Brasil, na conjunção regulamentação e estratégias operacionais das emissoras. A idéia do governo brasileiro, até agora, é começar a transmissão regular de tv digital em 7 de setembro deste ano. Se isso for efetivado, certamente os primeiros conteúdos terão a ver com o esta data histórica, e tudo que ela representa e pode ser explorada em termos audiovisuais.
clicRBS: Brittos. Quais as características que o senhor destacaria como as mais marcantes na TV Digital?
Valério Brittos: A possibilidade de ampliar quantitativamente e qualitativamente o que é a televisão, trazendo novos conteúdos, inclusive alguns não tradicionais do sistema televisivo.
clicRBS: Que tipos de conteúdos, por exemplo?
Valério Brittos: Bom, além do conteúdo televisivo propriamente dito, ou seja, todo tipo de programa que as pessoas estão habituadas a assistir na televisão, também é possível receber informações no modelo da internet.
clicRBS: Falando em internet. Que tipo de interatividade o sistema digital de televisão possibilitará aos seus usuários?
Valério Brittos: A interatividade pode ser de vários graus, dependendo da existência ou não de um canal de retorno. Mesmo sem este canal alguma interatividade será possível com as emissoras enviando conteúdos que serão escolhidos pelos receptores a partir de tôo material já enviado.No entanto, havendo um canal de retorno a interatividade pode ser bem mais ampla, próximo ao que se tem na internet, mas isso vai depender do que for decidido no modelo de serviços e negócios da televisão digital no país, não só do padrão de modulação.
Pergunta de internauta: Já houve alguma sinalização por parte da grande mídia de algum projeto novo, decorrente da implantação do modelo televisivo digital, que seria inviável no padrão atual?
Valério Brittos: As grandes redes, especialmente, estão desenvolvendo projetos de conteúdos digitais, já estando com grande parte do processo de produção já no patamar digital. Quem está mais avançada nesta dinâmica é a Rede Globo. Os projetos em geral das emissoras envolve transmissão em alta definição e para receptores móveis, essencialmente os celulares.
clicRBS: Qual sua opinião sobre as opções com as quais o governo trabalha (EUA, Europa e Japão) para o padrão brasileiro?
Valério Brittos: Dentre esses três padrões, o japonês é o que oferece melhores condições para a implantação no Brasil, pelos seus próprios recursos e pelo que o governo brasileiro está negociando com seus detentores. Mas acredito que o Brasil deveria investir mais na pesquisa nacional sobre a questão.
clicRBS: Quão adiantada está a pesquisa no Brasil?
Valério Brittos: No Brasil, centrada entre várias universidades e coordenada pelo CPQd, avançou bastante, especialmente no desenvolvimento do set top boxes e de componentes, podendo chegar a ao que eu chamo de solução nacional, que seria uma adaptação evolutiva de um dos grandes três padrões consagrados. Mas ainda estamos longe de um padrão brasileiro de tv digital.
clicRBS: É possível que um dia o Brasil tenha um padrão próprio?
Valério Brittos: Sim, em tese é possível, pois temos inteligência nacional para tal. Mas isso demanda recursos econômicos e tempo que o Brasil não terá como dispor. Além do mais, assim que decidido por um padrão específico, não há como em outro momento o país mudar de opção, mesmo que seja por tecnologia própria, pois isso representaria um desperdício incalculável para operadores e consumidores.
clicRBS: Qual deve ser o comportamento da população quanto ao sistema digital? Deve aderir rapidamente ou é possível que haja resistência?
Valério Brittos: Cada vez mais as pessoas interessam-se pelo avanço tecnológico, fazendo up grades em seus equipamentos. Isso é mais sensível ainda quando se trata de televisão, a grande mídia mundial a nacional. O problema, agravado no Brasil, é a dificuldade de recursos de grande parte da população brasileira. Esse tema é da maior importância e temos muito o que debater. É importante que toda a sociedade se envolva com isso, não só empresários, governos e especialistas.
Pergunta de internauta: Vale a pena comprar uma TV de plasma agora ou é melhor esperar?
Valério Brittos: Se a pessoa puder esperar vale a pena já que inexiste no Brasil venda regular de televisores capacitados para receber a transmissão digital a ser adotada no país. Contudo, não será necessário trocar de aparelho doméstico imediatamente. De um lado haverão os chamados set top box, que funcionarão como conversores da transmissão digital para o atual televisor analógico. Esse set top box também não deve ter preço muito reduzido em um primeiro momento, orçado ao redor de R$ 400. De outro lado, a atual transmissão analógica prosseguirá por um período de, no mínimo, 10 anos.
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