Consumo Consciente | 23/06/2011 11h50min
Cena típica da classe média brasileira. A mãe chega em casa após o trabalho, percebe que faltam na geladeira alguns itens fundamentais para a rotina da família, e tira novamente automóvel da garagem rumo ao supermercado. Três quadras adiante, chega à loja de uma das maiores redes de varejo na cidade. Precavida, carrega consigo uma sacola de pano comprada na mesma loja, dias atrás.
Andando pelos corredores, lembra-se de comprar mais alguns produtos: alimentos industrializados, produtos de limpeza. Elementos básicos da vida de qualquer um. Chegando ao caixa, percebe que a sacola de pano não é suficientemente grande para carregar tudo. Aproveita, então, para levar mais uma ecobag para casa.
São agora oito sacolas ecológicas, feitas de algodão, guardadas em um armário do apartamento de dois quartos. A família, orgulhosa de sua atitude ambientalmente consciente, aboliu o uso de sacolas plásticas há poucos meses. Anos atrás, exibira aos vizinhos um verdadeiro sistema doméstico de separação de lixo. A reciclagem, diz a filha de 15 anos, é importante para salvar o planeta.
Infelizmente, para 88% da população brasileira, separar o lixo é uma atitude absolutamente inútil. Apenas uma pequena parte da população do país é coberta pelo serviço de coleta seletiva. Segundo o Cempre (organização sem fins lucrativos mantida por um consórcio de grandes empresas) o custo da coleta seletiva de resíduos urbanos é hoje quatro vezes maior do que o da coleta regular.
Mesmo se tiver a sorte de estar em uma das escassas zonas de cobertura da coleta seletiva, a família não tem muito o que comemorar. A reciclagem é - no Brasil e em qualquer lugar do mundo - um processo relativamente ineficiente. Por aqui, ainda perde-se muito material reciclável devido ao pouco cuidado na separação doméstica, à precariedade do transporte, e à má triagem realizada em estações distribuídas pelas cidades. Aliás, ainda que isso tudo melhore nos próximos anos, sempre teremos perdas materiais e energéticas importantes nesse processo.
Esquecem de dizer aos jovens que reciclar é apenas uma das lições a serem aprendidas. As mais importantes - reduzir e reutilizar - ainda ganham pouco espaço em campanhas educacionais.
Pois é justamente a reutilização o que deveria praticar quem abandona o plástico e adota a sacola de pano. Mas isso nem sempre acontece. Pergunte a seus colegas de trabalho quantas ecobags cada um tem em casa e surpreenda-se com um número crescente desses pequenos artefatos de pano guardados em suas despensas.
Será que algum deles já parou para pensar no processo de fabricação de uma sacola de pano? Do plantio do algodão, extremamente intensivo em fertilizantes e pesticidas, até a confecção, passando por um tingimento extremamente agressivo? A ecobag precisa ser reutilizada muitas e muitas vezes para tornar-se realmente eco.
Somente uma cuidadosa análise do ciclo de vida das ecobags pode realmente apurar se a queda no uso de sacolas plásticas é positiva do ponto de vista ambiental. Dois efeitos colaterais desse decréscimo são especialmente relevantes: o aumento no consumo de sacos de lixo (já que as pessoas deixam de reusar as sacolinhas nas lixeiras) e o crescimento da atividade da produção têxtil.
A ecobag apresenta-se como uma solução mais vantajosa em países onde a população tem uma cultura de reutilização mais consolidada. Ou então em lugares onde as sacolas plásticas não são usadas em lixeiras domésticas porque o resíduo reciclável vai direto para containers (que vão para a reciclagem) e o lixo orgânico é compostado.
Mas, afinal, o que resta do espírito ecológico da família de classe média que descobre que a reciclagem não resolve o problema do lixo e que a sacola de pano não é tão verde quanto parecia?
Pois apresento quatro maneiras simples de reduzir a pegada ecológica na hora das compras:
1) Carregue sempre uma sacola ou mochila (feita de qualquer material). Se esquecê-la em casa, prefira as sacolas plásticas. Você pode reutilizá-las depois para depositar o lixo doméstico.
2) Compre alimentos produzidos localmente e reduza seu consumo de carne bovina. Assim você ajuda a combater o aquecimento global e ainda melhora sua dieta.
3) Deixe seu carro em casa sempre que possível. Aproveite para fazer um exercício (a pé ou de bicicleta) ou para testar aquele mito do péssimo transporte público na sua cidade.
4) Seja criativo! Já pensou em ter uma horta em casa ou na vizinhança? Quem sabe organizar uma vaquinha entre os colegas de trabalho para comprar hortaliças de um produtor local? Ou ainda abrir uma lojinha de alimentos orgânicos e mudar logo essa rotina estressante?
E, se estiver disposto a participar da vida política de sua cidade, proponha um sistema público de gestão de resíduos inteligente, que também oriente a população sobre a importância do reduzir e do reutilizar.
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