| 19/10/2005 07h20min
Depois de ter sido um dos protagonistas do cenário político nos últimos três anos, Tarso Genro se prepara para mergulhar num futuro nebuloso a partir de sábado, quando passará a presidência nacional do PT a Ricardo Berzoini. Uma das primeiras medidas ao retornar a Porto Alegre será retomar as caminhadas diárias no Parcão – principalmente para perder os três quilos que adquiriu nos quatro meses em que esteve no comando do PT.
Inicialmente, Tarso irá se dedicar à atualização de um capítulo do seu livro Esquerda em Processo, que será publicado na Espanha, além de restabelecer a sua inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Ex-prefeito e ex-ministro da Educação, Tarso trabalha com a perspectiva de ser candidato a governador em 2006, mas sabe que a batalha será dura no PT. Embora não descarte concorrer a deputado nem a senador, revela que gostaria mesmo – caso fique de fora da disputa ao Piratini – de coordenar o programa de governo de Lula numa eventual candidatura à reeleição.
Na segunda, Tarso recebeu Zero Hora em seu escritório no bairro Moinhos de Vento, em Porto Alegre, para a seguinte entrevista:
Zero Hora - O senhor não se arrepende de ter trocado o Ministério da Educação por apenas quatro meses na presidência nacional do PT?
Tarso Genro - A presidência do PT foi o período mais difícil da minha vida. De um lado, fiquei recebendo um ataque forte da esquerda do partido, que me acusava de ser a continuidade de tudo. De outro, imprensado por uma tentativa de continuísmo do núcleo dirigente anterior. Estava num conflito de duas legitimidades das quais eu discordava. Isso determinou a retirada da minha candidatura à presidência do PT. Resolvi sacrificar a possibilidade de ser eleito para poder fazer uma transição e propor um nível mínimo de conciliação que pudesse recuperar o partido. Estou feliz porque isso consegui.
ZH - A partir de sábado o senhor ficará sem cargo
de projeção. Para um político isso não é preocupante?
Tarso - Tenho uma sensação ambígua. A primeira é positiva, de dever cumprido. Fui indicado para fazer uma transição e a fiz. As condições para recuperação do partido estão dadas. A segunda é de frustração por não permanecer como elemento-chave no processo. Vai ficar reduzida a minha capacidade de intervenção numa disputa política do partido, mas não acho que isso seja irrecuperável.
ZH - Até que ponto a crise vai afetar o desempenho do PT nas eleições?
Tarso - O PT vai perder representação, e merecidamente. Mas hoje posso dizer que já há dezenas de motivos para votar no PT, inclusive do ponto de vista ético. Jamais um partido na história do Brasil fez uma autocrítica tão séria, tão profunda e tão drástica como o PT. O governo retomou o crescimento do país, desenvolveu uma política para o país no cenário internacional e desenvolveu políticas sociais que por si só justificam a reeleição do presidente Lula. Todos os indicativos são
superiores aos do governo Fernando
Henrique.
ZH - Como é possível falar em medidas drásticas se o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, que é o pivô de toda a crise, ainda não foi punido?
Tarso - Mas será. O PT vai punir antes das CPIs. O processo de Delúbio será julgado dia 22 (a comissão de ética do partido pede a expulsão do ex-tesoureiro). Ocorre que se criou uma ideologia da execução sumária em relação ao PT fundada em acusações justas e injustas. Por dentro dessa luta contra a corrupção brasileira e dos erros graves que o PT cometeu se travou também uma luta política de destruição do PT, aproveitada de maneira sábia pelos adversários.
ZH - Até agora não se sabe a origem do dinheiro que financiou ilegalmente os deputados. Não é um esqueleto muito pesado dentro do armário para o PT carregar na próxima campanha?
Tarso - As investigações estão paralisadas nas CPIs exatamente porque não é uma questão que diga respeito só ao
PT. Diz respeito a um processo sistêmico de corrupção e de
ilegalidades no financiamento das campanhas. Defendo que essa investigação não fique datada a partir da eleição de Lula. Que vá até o início da década de 90. Temos de aproveitar essa oportunidade não só para punir os erros do PT, mas para ajudar a limpar o sistema político brasileiro.
ZH - O senhor é candidato a governador?
Tarso - Não tem candidato previamente determinado, e as forças políticas têm de chegar a um acordo para ver quem é o melhor nome de maneira racional e fundamentada. Não é adequado dizer que Tarso é melhor porque amplia mais ou que Olívio (Dutra) é mais candidato porque está mais vinculado aos trabalhadores que estão na origem do partido. São argumentos que não se sustentam.
ZH - Quais são os argumentos que sustentam uma candidatura?
Tarso - Capacidade de mobilizar o partido e de ampliar apoios no segundo turno, compromissos com o projeto do partido, capacidade de dar
sustentação para um projeto nacional, capacidade de fazer uma
boa gestão e capacidade de fazer um debate político com o adversário. Se olharmos de maneira imediata, quatro ou cinco pessoas têm essas condições no Estado. Não me considero a priori nem o pior nem o melhor nome.
ZH - Há possibilidade de o senhor voltar para o governo?
Tarso - O presidente levantou essa hipótese. Pedi a ele para congelar o assunto. Não só porque não tinha terminado o meu mandato na presidência do PT como também porque eu e ele sabemos que se eu voltar não será para o Ministério da Educação.
ZH - O senhor não lamenta estar fora do governo?
Tarso - Não, porque estava com muita vontade de voltar para meu Estado. Isso é um elemento que nós, gaúchos, temos e que eu não sabia que tinha de maneira tão intensa. Ficar dois anos e meio deslocado das minhas relações políticas, pessoais e afetivas era uma coisa que não estava me fazendo bem. Foi muito duro o primeiro ano de governo,
o ano da implantação do Conselho de Desenvolvimento
Econômico e Social. Mais duro do que o trabalho no MEC, onde tinha uma equipe de alto nível e uma estrutura de trabalho também muito boa. O Conselho não se tornou um instrumento fundamental de concertação do Brasil, mas se tornou um elemento importante de disputa na sociedade e que pode ainda se transformar numa estrutura de concertação estratégica para o Brasil.
ZH - O senhor teria vontade de voltar para terminar esse trabalho no Conselho?
Tarso - Fiz uma brincadeira com o presidente Lula que vou contar pela primeira vez. Quando ele me convidou para o Ministério da Educação disse para ele: "Presidente, o senhor está me demitindo para cima". E nós rimos. Lula entendia que aquele momento não era o de mudar a política econômica, baixar a taxa de juros e reduzir drasticamente o superávit como o Conselho estava demandando de maneira formal por meio das cartas de concertação. Esse é um juízo do presidente que respeito e acato. Por isso fiz essa
brincadeira. Se o presidente me
dissesse que está na hora de voltar para o Conselho, obviamente voltaria com muito prazer.
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