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 | 09/03/2005 14h32min

Confira a íntegra da carta do 16º Fórum Nacional da Soja

Documento contém os principais pontos discutidos por produtores

O Brasil assistiu, nestes últimos anos, a uma progressão significativa do agronegócio no contexto da economia nacional. O meio rural modernizou seu sistema de produção e buscou se adaptar aos novos tempos de globalização e economia aberta. O resultado deste esforço se encontra no fato de que o agronegócio, em 2004, correspondeu a 30% do PIB total do país e a 40% das exportações nacionais, que foram recordes (pelo segundo ano consecutivo, todo o superávit comercial brasileiro foi bancado pelo agronegócio, na medida em que no total alcançamos US$ 33,7 bilhões e o agronegócio registrou um superávit de US$ 34,1 bilhões).

A economia em geral foi alavancada pelos inúmeros investimentos que o setor realizou neste período, na busca constante de modernização, seguindo as indicações tecnológicas, as quais, muitas vezes, estiveram apoiadas pelos encaminhamentos oficiais. E a soja, neste contexto, representa mais de 23 milhões de hectares plantados, uma geração de renda direta ao redor de US$ 10,8 bilhões, fato que permite alavancar 10% do valor das exportações nacionais, o que eqüivale a mais de US$ 10 bilhões somente em vendas externas.

Esta pujança de um setor, que historicamente sempre caracterizou a competitividade comercial brasileira no exterior, auxiliou na geração de milhares de empregos e a consolidação de famílias rurais no campo, inclusive junto às regiões de minifúndio.

Particularmente, no que diz respeito à cadeia da soja, novos mercados foram abertos. Dentre eles a Ásia e, nela, particularmente o mercado chinês. Este país, que importava apenas 2,9 milhões de toneladas de grãos de soja em 1997, sendo 15% de origem brasileira, passou a 20,7 milhões de toneladas em 2003, com o Brasil fornecendo 31% deste total. No ano passado, apesar das expectativas iniciais, uma estratégia comercial chinesa, associada a problemas fitossanitários em algumas cargas brasileiras, levou a China a reduzir suas compras totais para 20,2 milhões de toneladas, com a participação brasileira recuando para 28% do total ou 5,6 milhões de toneladas.

Para 2005, após amplas negociações entre os governos dos dois países, e diversas reuniões de trabalho entre os respectivos empresários, a tendência é um aumento nas importações chinesas de soja, com a retomada da participação brasileira, especialmente se uma parceria comercial entre os produtores brasileiros e importadores chineses possa ser construída de forma conveniente para ambos os lados. O esforço da cadeia produtiva da soja, no Brasil, será neste sentido, assim como no de ampliar seu comércio para outros países asiáticos, pois nós brasileiros somos altamente competitivos na produção.

Paralelamente, na medida em que os produtos transgênicos são cada vez mais aceitos nos diferentes países, inclusive junto àqueles que compõem a União Européia, cabe salientar que a cadeia da soja permanecerá presente no mercado com todos os tipos de soja (orgânica, convencional e transgênica), tendo cada produtor rural, empresa, cooperativa e exportador a liberdade, conforme a demanda, de escolher o produto específico que deseja comercializar. Para tanto, foi fundamental a aprovação, pelo Congresso Nacional, da Lei de Biossegurança, que autoriza, finalmente, o desenvolvimento de sementes adaptadas às nossas regiões, o plantio e a comercialização da soja transgênica. Assim, passado um ano do último Fórum, quando abordamos diretamente esta questão, o Brasil conseguiu uma Lei que regulamenta tão importante matéria.

Todavia, cabe destacar que a cadeia da soja, desde meados de 2004, vem passando por uma realidade mais difícil, com uma forte influência negativa de alguns fatores econômico-financeiros. De fato, a soja no Brasil convive com um enorme prejuízo econômico na safra 2004/05. Os preços médios no balcão recuaram em 50% e a pequena recuperação ocorrida nestes últimos dias está longe de ser suficiente. No Rio Grande do Sul e outras regiões vizinhas, a realidade é ainda pior porque nem mesmo o clima tem colaborado nestes últimos dois anos. No Estado gaúcho, a seca já provocou uma quebra de safra bem superior a 50% neste momento. Assim, hoje, e ainda utilizando o exemplo do sojicultor gaúcho, sua produtividade média, neste ano, será ao redor de 15 sacas/hectare em a situação climática não se agravando mais, havendo regiões com menos do que isto. Em termos de custos operacionais, mesmo considerando o plantio da soja transgênica, naturalmente mais barata, o aumento é de 42% entre as safras de 2003/04 e 2004/05 (o custo operacional passando de R$ 663,00/ha para R$ 941,20/ha no período). Não há produtividade média que pague tal defasagem.

Para além do fator clima e dos custos de produção, o mercado internacional das commodities passou a apresentar um recuo sensível de preços. Neste sentido, o setor da soja vive uma situação em que parte de suas perdas econômicas atuais está centrada no câmbio, hoje longe de sua paridade de poder de compra, que destrói o sistema produtivo e, por extensão, os demais setores situados a montante e a jusante da produção, com uma conseqüente geração de desemprego, já praticada em muitas regiões do país neste momento. Trata-se, na verdade, de uma violenta defasagem cambial, na medida em que vivemos um longo período em que o real está sobrevalorizado em relação ao dólar. A referida defasagem chega a 22% neste momento, em se considerando o câmbio praticado em agosto de 2003, quando era de R$ 3,00. Ou seja, a moeda brasileira deveria estar numa relação de R$ 3,18 por um dólar. Na prática, vivemos um câmbio ao redor de R$ 2,67 (há poucos dias chegamos a ter R$ 2,56 por dólar), fato que destrói ainda mais o poder aquisitivo dos produtores rurais, comprometendo totalmente a sobrevivência de suas cooperativas, os pagamentos (pois todos estão com financiamentos a pagar, sendo que 50% realizados com recursos de fontes não oficiais), e a cadeia produtiva inteira. O efeito de tal defasagem cambial, diretamente sobre o preço médio da soja pago ao produtor gaúcho, neste momento, é de uma perda aproximada de seis reais por saca.

Torna-se urgente o governo federal construir mecanismos, na área econômica, para reverter este quadro, ou compensá-lo com medidas emergenciais diretamente ao agronegócio exportador em geral e à cadeia da soja em particular. Não se trata de intervir no câmbio mas sim de se criar mecanismos que compensem tal situação. Em caso contrário, teremos um quadro falimentar de longo prazo instalado, desde os produtores rurais até às empresas exportadoras. É um contra-senso deixar um setor de tamanha importância, assim como outros, à mercê de movimentos artificiais do câmbio no cenário internacional, alimentados por elevações dos juros internos.

Novos mecanismos oficiais, bem construídos, possibilitarão que o produtor rural em geral, e o sojicultor em particular, possa enfrentar melhor estes problemas conjunturais, se tornando ainda mais produtivo e competitivo, pois ousado no uso das tecnologias disponíveis ele já o é.

No entanto, precisamos juntos resolver ainda problemas graves e pendentes, em nível estrutural, muitos dos quais já destacados em Fóruns anteriores. Problemas, que ao serem superados, criariam as condições de uma agenda positiva sustentável. Em primeiro lugar, a logística de armazenagem e particularmente de transporte, o qual chega a penalizar em US$ 75,00 por tonelada os produtores de soja do Centro-Oeste brasileiro e em mais de US$ 20,00 por tonelada o produtor do sul do país. Por outro lado, a produtividade do setor primário não se dá unicamente pela exploração da terra. Urge desenvolver ainda mais o seguro de safra, os financiamentos agrícolas, os financiamentos para os investimentos primários, para a pesquisa agropecuária, para a cadeia produtiva em geral.

Enfim, o agronegócio em geral, e a cadeia da soja em particular, é um dos mais desenvolvidos do Planeta, a ponto de sermos considerados, pelos nossos concorrentes, como país de Primeiro Mundo nesta área. Não podemos deixar que os problemas atuais e nossas deficiências, sejam elas políticas, econômicas ou estruturais, impeçam a continuidade deste avanço, e destruam a capacidade produtiva do setor, hoje tecnologicamente desenvolvido e que busca o mesmo desenvolvimento, de forma permanente, na área econômica.

O nosso futuro é promissor, e este Fórum assim o demonstrou. Porém, somente o alcançaremos com a soma do trabalho de todos a fim de vencermos, de forma permanente, os problemas que ainda persistem na cadeia produtiva da soja em particular e do agronegócio em geral.

Não-Me-Toque (RS), 08 de março de 2005.

 
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