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 | 04/06/2010 03h19min

Regularização dos flanelinhas não evita extorsão de motoristas nas ruas da Capital

Em julho de 2009, a prefeitura anunciou o cadastramento de guardadores

Prestes a completar um ano, a parceria entre a prefeitura, a Brigada Militar e uma cooperativa de guardadores de carros não conseguiu romper a farra dos flanelinhas em Porto Alegre.

Entre segunda-feira e ontem, Zero Hora estacionou carros nas áreas mais movimentadas da Capital e constatou que flanelinhas irregulares seguem agindo livremente, enquanto guardadores legalizados achacam vestidos com jaleco e crachá oficiais.

Em julho de 2009, a prefeitura anunciou o cadastramento de guardadores, aceitos após apresentarem bons antecedentes e concordarem em atuar em regiões restritas da cidade. Neste ano, vereadores aprovaram lei, estabelecendo critérios semelhantes. Mas ninguém fiscaliza.

Na prática, Zero Hora constatou que alguns guardadores legalizados seguem estabelecendo valores a serem pagos pelos motoristas – prática proibida pela prefeitura.

Na Rua Padre Chagas, há até “serviço especial” aos motoristas. Um guardador com o uniforme de autorizado disse que aceita o que o condutor quiser dar, mas sugeriu à reportagem o estacionamento sobre a calçada, em área coberta de um estabelecimento comercial, por R$ 5. A região, uma das mais badaladas da cidade, tem um dos espaços mais nobres no chamado loteamento da flanela. Em 2008, reportagem de Zero Hora revelou a cobrança de “aluguel” de R$ 400 por mês exigido pelo “dono da rua” para que guardadores sem ponto pudessem trabalhar no local. O guardador que controlava as ruas ainda trabalha por lá, mas perdeu o posto com a chegada da cooperativa.

No estacionamento da Avenida Engenheiro Luiz Englert, na UFRGS, outro guardador de jaleco tabelou o serviço: pediu R$ 5 durante um evento na universidade. No local, há relatos de desembolsos de até R$ 20 em ocasiões como formaturas e outros eventos. A região da universidade é um ponto disputadíssimo. A rótula da Redenção, no entanto, já tem dono há anos. Sadi Feliciano, que trabalha no local, disse ter uma sociedade com outros seis guardadores da cooperativa. A cobrança é feita sem rodeios.

A legalização dos guardadores, feita pelo secretário anterior, Idenir Cecchim, é combatida com veemência pelo atual titular, Valter Nagelstein – ambos do mesmo PMDB.

– Somos contra os que defendem que guardador de carro é uma profissão. Para mim, o guardador de carro muitas vezes encobre o crime – diz Nagelstein.

Cecchim não foi encontrado ontem por ZH para se manifestar.

Quando não há a presença dos cooperativados, os flanelinhas irregulares atacam. Na Rua Lima e Silva, no bairro Cidade Baixa, de segunda a quarta, o preço é livre. De quinta em diante e nos feriados, a conversa começa a partir de R$ 2.

O esquema é combinado entre os jovens que garantem cuidar dos carros ao longo da via. Dependendo do ponto, como em frente a cafés e restaurantes, eles podem pedir até R$ 5.

– Não trabalho em feriado e faço R$ 1 mil por mês – gaba-se Nataniel Oliveira, 21 anos, com ponto em frente ao Café Segredo.

O comandante de Policiamento da Capital, coronel Antero Batista, avisa que reforçará o cerco contra os ilegais. A corporação esbarra, porém, no grande número de infratores espalhados pela cidade.

Legais x ilegais
- Em julho de 2009, a prefeitura e a Brigada Militar firmaram uma parceria com a Cooperativa de Auxílio Amplo (Cooperamplo). Um grupo de 154 flanelinhas atuaria uniformizado e em locais pré-determinados. Para trabalhar nas ruas, o cooperativado precisa se cadastrar e apresentar atestados criminais. Ganharam jalecos e crachás.
- Nessa semana, a Cooperamplo e o sindicato da categoria sugeriram o tabelamento do serviço que partiria de R$ 0,50 chegando a R$ 5 nos eventos. A ideia, segundo eles, é que o preço estabelecido terminaria com o achaque.

Uma lei nova e ninguém fiscaliza

Um lei recém sancionada poderia resolver o problema dos flanelinhas na Capital.

Mas nem um dos autores da legislação acredita que isso possa ocorrer. O vereador Adeli Sell (PT) não vê futuro para que a lei criada por ele e sua colega de Câmara Juliana Brizola (PDT) possam sair do papel. Para ele, se alguém não assumir a função de fiscalizar os guardadores de carro, nada impedirá os achaques.

– Eu sou o autor da lei, mas sou o primeiro a reconhecer que ela pode não resolver nada. Na verdade, quem tem que resolver o problema é o poder público municipal, que tem o poder de polícia administrativa – aponta.

Adeli diz que seu sonho era ver a Capital livre de qualquer tipo de flanelinha. Mas uma lei federal, de 1975, regulariza a profissão e impede a proibição da atividade.

Por causa disso, os vereadores propuseram que os guardadores sejam cadastrados pelo município. Quem não for registrado ou atuar fora da área permitida, seria obrigado a pagar multas que variam de R$ 24 a R$ 123.

– A Smic seria a responsável, mas a EPTC conta com agentes de fiscalização e pode fazer esse serviço – indica.

Para o vereador, a parceria com cooperativa, anunciada no ano passado, não passou de pirotecnia.

– Não adianta dar jaleco se não tem fiscalização. Se alguém não peitar, não vai adiantar – lamenta.

O vereador espera que a prefeitura aponte o órgão que fará a fiscalização e também ficará responsável pelo cadastro dos guardadores.

Na prefeitura, no entanto, o assunto é visto como uma batata quente. O secretário da Produção, Indústria e Comércio, Valter Nagelstein, aponta que a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) ficará com o encargo.

Ontem, a assessoria da EPTC afirmou não ter nenhum projeto em andamento para assumir a função. Os agentes não teriam condições de fiscalizar e multar uma profissão, o que seria atribuição da Smic.

ZERO HORA
Jefferson Botega / 

Guardadores cobram até R$ 10 para cuidarem veículos em ruas de Porto Alegre
Foto:  Jefferson Botega


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