| 29/10/2005 17h05min
Propulsora do crescimento mundial, a economia dos Estados Unidos se prepara para mudar de comandante. A indicação de Ben Bernanke, chefe da assessoria econômica da Casa Branca, como futuro presidente do Federal Reserve (Fed) foi um alívio no país abatido pelas falhas no socorro aos atingidos pelo furacão Katrina. Republicano respeitado pela atuação acadêmica, Bernanke tem estatura para substituir o já mítico Alan Greenspan.
É num momento crítico que ele assumirá o cargo mais importante no planeta dinheiro: a meio caminho da correção do juro negativo, à beira de dois monumentais rombos - no orçamento e na balança comercial - e sob risco de estouro de uma nova bolha, agora a imobiliária
– Se for muito rápido, pode provocar uma recessão desnecessária. Se for muito devagar, pode levar a economia a um alto risco – pondera Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central (BC), sobre o ritmo de elevação do juro.
– Bernanke representa continuidade da política de aumentos graduais de Greenspan, o que permite esperar elevações de 0,25 ponto percentual –projeta Sérgio Werlang, diretor do Itaú e responsável pela implementação do sistema de metas de inflação no Brasil.
Ainda que o mercado tenha festejado Bernanke, o ex-diretor do BC Carlos Thadeu de Freitas prevê mais instabilidade na economia mundial até que o sucessor de Greenspan confirme as expectativas.
– Até que ele seja compreendido vai haver alguma instabilidade, o que é natural, mas poderá se exacerbar se errar a mão, ainda mais porque não é visto como um monetarista radical, 100% contra a inflação – explica Freitas.
Com a sintonia fina do juro pela frente, Bernanke, que ainda tem de ser aprovado no Senado, só deve implantar a médio prazo o sistema de metas de inflação nos EUA.
– Ele não decide sozinho, tem um voto. Vai tentar convencer os demais membros do conselho e, quando tiver maioria sólida, coloca em votação - aponta Werlang.
Se no foco do Fed Bernanke tem de compor para reinar, na administração dos déficits gêmeos existem ainda mais limites.
– A atuação será indireta, pelos alertas que fará em declarações públicas. Por meio da taxa de juro, poderá pressionar o governo a adotar soluções. Pelo tamanho do aumento, mostra que a situação está ruim – explica Raul Velloso, especialista em contas públicas.
Entre as mudanças não só esperadas como desejadas está o tom dos pronunciamentos do próximo presidente do Fed. Greenspan especializou-se em discursos cifrados, cuja interpretação consome a paciência de analistas. Loyola explica que Bernanke é mais acadêmico e, por isso, dá mais importância às expectativas - então pode ser mais claro.
– Presidente de banco central não fala o que quer, não. Às vezes, ocorre um descuido, mas tem consciência de que está passando uma mensagem e tem de levar em conta que quem ouve está tirando conclusões – testemunha Loyola.
MARTA SFREDO/ZERO HORA