| hmin
Às vésperas dos 40 anos do golpe de 1964, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva editou, na semana passada, uma medida provisória que deve beneficiar com indenizações as famílias de conhecidas vítimas do regime militar que comandou o país por 21 anos, como Iara Iavelberg, a mulher de Carlos Lamarca, e Frei Tito de Alencar Lima.
A MP 176 altera a Lei dos Mortos e Desaparecidos Políticos, de dezembro de 1995, que só envolvia os mortos em lugares fechados, dependências policiais ou “assemelhados''. Assim, casos de suicídio, versão oficial para a morte de Iara; de mortes no exílio, como Frei Tito; ou em conflitos durante passeatas, como a que causou a morte do estudante secundarista José Guimarães agora podem obter êxito na reivindicação de indenizações junto ao governo federal.
O valor de cada indenização é estimado entre R$ 100 mil e R$ 150 mil.
– Já deveria ter ocorrido há muito tempo o ressarcimento dos que perderam a vida no governo de exceção. Para mim, mais importante do que a indenização é ter o reconhecimento do governo –disse Ladislau Topolovzski, irmão de José Guimarães.
Guimarães foi baleado no dia 3 de outubro de 1968, durante o conflito entre estudantes da USP e do Mackenzie, em São Paulo, dois meses antes da edição do Ato Institucional nãoº 5 (AI-5). Sua camisa banhada de sangue foi carregada em passeata, na época, pelo líder estudantil José Dirceu, hoje ministro-chefe da Casa Civil.
Segundo Waldomiro Batista, líder do grupo Tortura Nunca Mais de Goiás, foram “sete anos de luta”, desde o governo de Fernando Henrique Cardoso, quando a Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos do Ministério da Justiça reconheceu apenas os direitos de três dos estudantes mortos durante passeatas, entre eles o carioca Edson Luís, e raros casos de mortes durante confronto – como o dos guerrilheiros Carlos Lamarca e Carlos Marighella.
O próprio Batista, líder entre as famílias que vêm pedindo indenizações, é irmão de Marco Antônio Dias Baptista, aos 15 anos a mais jovem vítima da ditadura durante passeatas. O ativista conta que foram pelo menos 17 mortos em manifestações públicas. Um deles é o do metalúrgico Santo Dias, que dá nome em São Paulo a um centro de direitos humanos, morto no dia 30 de outubro de 1979.
A lei anterior, atualizada pela MP, abrangia apenas o período entre 1964 e 1980. A nova versão estende o período para entre 1961 e para 1985. Mas é mesmo a partir de 1964 que os casos vão ficando mais volumosos. Mais precisamente, a partir do início de abril de 1964, nos primeiros dias do regime militar.
Naqueles dias, vários líderes morreram devido ao que os familiares chamam de “indução ao suicídio”. Entre eles os sindicalistas Antogildo Pascoal Viana, em 8 de abril de 1964, no Rio, e Albertino José de Faria, presidente das Ligas Camponesas de Vitória de Santo Antão (PE), em 24 de abril de 1964.
As mortes em confronto com as forças do regime também estão abrangidas na lei. Pelo menos um nome se destaca: o de José Wilson Sabag, em São Paulo, morto no dia 3 de setembro de 1969. Acusado da morte do norte-americano Henning Albert Boilensen, presidente da Ultragás e tido como financiador da tortura, ele era amigo de José Dirceu.
– As passeatas de 1968 passavam pela casa de Sabag – relata Batista, ele mesmo testemunha de várias ações, como a morte de José Guimarães na Maria Antônia.
Segundo Batista, a MP saiu graças ao empenho do ministro Nilmário Miranda (PT-MG), da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, depois das modificações terem sido prometidas por inúmeros ministros nos últimos anos.
As informações são da Reuters.