| 22/06/2006 19h41min
Zico não fala japonês. Para se comunicar com seus comandados, o treinador do Japão contou com um tradutor durante os 90 minutos do jogo contra o Brasil. Mesmo assim, não soube se fazer entender pelos jogadores nipônicos. Levou 4 a 1 e se despediu de forma melancólica da Copa do Mundo.
Na sede porto-alegrense da Sociedade dos Surdos do Rio Grande do Sul, Nara Vidal foi uma assistente de melhor desempenho. O idioma não era o japonês, mas a Língua Brasileira de Sinais (Libras). No local, portadores de deficiência auditiva se reuniram para assistir ao confronto. Com precisão, Nara traduziu os depoimentos desses torcedores especiais para um mundo que não está acostumado a ouvi-los.
De quatro em quatro anos, a instituição se veste de verde e amarelo, gruda na TV (ou melhor, no telão) para não perder um lance da Seleção Brasileira em campo. O salão estava todo enfeitado. Bandeiras, faixas, bolão a R$ 1, rostos pintados, pipoca e roda de chimarrão. Não faltava nada. O ambiente estava repleto de crianças, jovens e adultos, homens e mulheres. A maioria com roupas em verde e amarelo, que iam chegando e se acomodando nas cadeiras, dispostas como uma arquibancada de estádio de futebol.
O ambiente pré-jogo era de pura empolgação. Zoeira, apitos, batucadas e cornetas. Todos estavam eufóricos. Bola rolando, os olhos voltados para o telão e, a cada investida do Brasil, surgiam gritos e barulho, muito barulho. Eles não escutam o som, mas sentem a vibração provocada por ele.
Nervosos, conversavam, por meio da linguagem dos sinais, numa velocidade maior do que as descidas de Robinho e Cicinho pelo lado direito do ataque. Numa outra sala, mais reservada, homens e mulheres da terceira idade também acompanhavam a partida.
No começo do primeiro tempo, o universitário Rodrigo Nogueira, de 23 anos, sempre com um olho no telão, destacou que há muita pressão sobre a equipe de Carlos Alberto Parreira, devido à grande quantidade de talentos individuais:
– Acredito que vai melhorar nas oitavas – disse Nogueira, interrompendo a conversa para acompanhar o replay de um chute a gol de Ronaldo aos seis minutos.
Cacau Mourão, de 33, também estava confiante:
– O Brasil está melhor, mas precisa fazer um gol, até para os jogadores se incentivarem – disse aos 22 minutos.
Porém, 12 minutos depois, o incentivo surgiu do lado adversário com o japonês Tamada justamente quando parecia que o Brasil abriria o placar. Muita gente se mostrou indignada. Mesmo assim, a empolgação não diminuiu e o grito de gol saiu nos acréscimos, com um cabeceio de Ronaldo.
No intervalo, o gremista Marcelo Sander, 27 anos, “fanático de ir ao estádio” como ressaltou Nara, disse estar acompanhando todos os jogos do Mundial. Em casa, na frente da TV, ele fica vidrado nas partidas de Alemanha, Argentina, e claro, do Brasil. Anota todos os resultados na tabela que leva sempre no bolso.
Sander soube traduzir e entender bem o jogo. Ele gostou das alterações promovidas pelo técnico Parreira, que deixaram o time mais veloz, tocando a bola com facilidade. O acerto foi confirmado na segunda etapa, quando o time verde-amarelo deslanchou e aplicou uma goleada no Japão.
Sentadas em um sofá, as amigas Sandra Milano, 38 anos, e Adriana Rezende, 32, agouravam, erguendo as mãos, cada vez que o time de Zico tentava organizar uma jogada ofensiva. As duas coloradas adoram tanto futebol que acompanham os jogos também quando o assunto não é Copa do Mundo:
– Acompanho sempre pela TV, aqui na Sociedade, e às vezes vou ao Beira-Rio – contou Sandra.
– Compro tudo relacionado ao Colorado, mas o sofrimento é igual, tanto pelo Inter como pela Seleção – declarou Adriana.
Fim de jogo. Brasil em primeiro no grupo. A torcida, agora, já se organiza para o confronto contra Gana, pelas oitavas-de-final. Mais um em que Nara estará atenta aos comentários da turma da Sociedade dos Surdos. Pronta para traduzi-los com a eficiência que faltou ao ajudante de Zico.
ANA ACKER E RODRIGO CELENTEGrupo RBS Dúvidas Frequentes | Fale Conosco | Anuncie | Trabalhe no Grupo RBS - © 2008 clicRBS.com.br Todos os direitos reservados.