Ayrton, Ayrton, Ayrton Senna do Brasil
“Meu nome é Ayrton Senna da Silva, vou chegar na Fórmula-1 e o senhor vai narrar muita corrida minha”. O ano era 1982, estávamos na sala de imprensa do circuito de Zolder, na Bélgica, e na minha frente se apresentava um rapaz magrinho, orelhudo, 10 anos mais jovem que eu e me chamando de “seu” Galvão. Foi nosso primeiro encontro.
Dois anos depois, o menino começava a virar adulto, em memoráveis batalhas contra os melhores da sua geração. Nos anos seguintes, tornou-se nosso grande campeão, o herói brasileiro das pistas internacionais, o garoto que levantava uma bandeira do Brasil em todos os pódios onde estourava garrafas de champanhe.
No começo, nosso relacionamento era profissional apenas. Eu era o jornalista e narrador da Rede Globo e ele, uma privilegiada fonte de informação sobre o circo da F-1. Ao longo dos anos nos tornamos amigos. Ayrton Senna era uma pessoa incrível, fantástica. Um profissional intenso, detalhista, que passava horas e horas analisando dados técnicos que transformavam décimos de segundo em vantagens estratégicas que ele fazia valer nos momentos decisivos de uma corrida. Implacável com seus adversários, era exigente consigo mesmo, a ponto de se cobrar resultados mesmo já sendo tricampeão. Como muitos de sua profissão, Ayrton amadureceu cedo e eu, que era 10 anos mais velho, acabei tendo nele um conselheiro sempre pronto e atento.
Me considero um privilegiado por ter sido o narrador de praticamente toda a carreira dele. Eu me sentia genuinamente emocionado com aquelas vitórias, que alegravam os domingos brasileiros. Foram 41 vitórias, 41 vezes chamando o Tema da Vitória. "Ayrton, Ayrton, Ayrton Senna do Brasil".
Sempre tive a certeza de que ele era um grande ídolo. Hoje, 20 anos depois de sua partida, tenho consciência de que ele é mais do que isso. Parece que ele pertence à outra dimensão. As pessoas conheciam muito o Senna como piloto determinado, corajoso, dedicado, valente... Mas poucos conheceram o Ayrton ser humano, de coração grande e alma de menino. Ayrton gostava de brincar, vivia pregando peças em amigos e colegas de trabalho, eu mesmo fui “vítima” de algumas de suas malandragens. Tinha um humor fino, sofisticado. Um ser humano especial, educado por uma família que sempre pregou o respeito ao próximo.
Resumindo: era uma pessoa adorável. Tivemos uma amizade muito intensa, muito bacana. Eu gosto de me lembrar do Ayrton pelos bons momentos que passamos juntos, pelos momentos divertidos, pelas grandes emoções das pistas. Não penso em tragédia.