A infância iluminada pela luz do lampião e algumas poucas velas na casa dos pais, na área rural de São Francisco de Paula, ensinou Luciana Olga Soares que o interior de si mesmo é um lugar bom e seguro para se viver. A vida introspectiva e saudosa do passado que se apaga diante do questionável progresso de uma sociedade desapegada de tradições, revela a essência de uma casa tão deslumbrante quanto aconchegante na por si só acolhedora cidade que logo se faz chamar pelo apelido, São Chico. Visitar a Livraria Miragem é uma experiência que remete aos valores mais caros ao gaúcho do campo: as noites de quietude, o barulho do fogo queimando, o amor pelos animais e a hospitalidade para receber quem vem de fora.
Cada canto da livraria é um convite a permanecer um pouco mais, descobrir um novo exemplar, conhecer melhor a história daquela terra pelas fotografias e pelos versos de seus poetas, espalhados pelas paredes. Para Luciana, não faria sentido seu negócio existir longe das raízes campeiras e do clima frio que faz a alma procurar abrigo. O prazer de perguntar ao turista se fez boa viagem e oferecer uma cadeira revestida por um cobertor para melhor aquecê-lo, e poder sugerir a ele o fino da literatura, e não necessariamente o autor mais vendido, são diferenciais que se percebe com clareza nas muitas páginas preenchidas do caderno de visitas. Cada assinatura é acompanhada de um depoimento acalorado, talvez alguma poesia ou uma memória a que o ambiente remeteu, ou os votos de que aquele lugar mágico nunca ceda à realidade.
Cada canto da livraria é um convite a permanecer um pouco mais, descobrir um novo exemplar, conhecer melhor a história daquela terra pelas fotografias e versos de seus poetas, espalhados pelas paredes. Para Luciana, não faria sentido seu negócio existir longe das raízes campeiras e do clima frio que faz a alma procurar abrigo.
Na contramão dos "supermercados de livros", como a proprietária se refere a lojas de finalidade meramente comerciais, a Miragem expõe os exemplares de forma descontraída e até um pouco bagunçada. Não tem problema, por exemplo, se o cliente retirar um livro para folheá-lo no primeiro andar, e de repente deixá-lo em algum canto do terceiro piso. Organizar lado a lado na prateleira facilitaria a localização, mas tornaria o ambiente frio e pouco convidativo à leitura. E como tornar frio um local onde as únicas máquinas são um computador e a máquina de calcular? A livraria, justifica Luciana, propõe um contraponto à solidão atroz enfrentada pelas pessoas nessa época de relações quase sempre mediadas pela tecnologia. A anfitriã quer que seus livros possam olhar de frente, como deveriam fazer as pessoas.