Alguns me chamam de Topete. Não que seja esse meu nome, porque nome mesmo eu não tenho. O pessoal diz que não estou aqui para ser tratado como um pet, e sim como um animal que inspira cuidados por ter sido tirado de seu habitat natural. Mas eles sabem que alguns estagiários não resistem e sempre nos dão algum apelido simpático. Como a jiboia Janis Joplin lá do serpentário, que, aliás, tem uma história triste e bem parecida com a minha.
Não nasci para viver no frio do Sul, e nunca quis ver neve em Gramado. Preciso de temperaturas quentes para sobreviver, e só estou encarando esse inverno pois o destino me fez ser mais uma vítima do tráfico de animais silvestres, que tem nas matas do Norte o alvo principal. Sou um dos saguis abrigados pelo zoológico da Universidade de Caxias do Sul. Sagui-de-tufos-pretos, o que me faz parecer mais jovem do que meus irmãos saguis-de-tufos-brancos, que lembram muito o Albert Einstein. A exemplo das jiboias, jabutis e araras que habitam o zoo, fui capturado na Mata Atlântica para ser um animal de estimação de algum diferentão, desses que pagam R$ 2 mil por um primata como eu. Por que não um gato ou um cachorro, já que existem tantos por aí?
Sei que o leitor deve estar se perguntando se longe da minha floresta eu sou um bichinho triste. Qual imigrante não sente falta de casa, não é mesmo? Mas com todo o esforço que fazem aqui para me aclimatar, já estou quase virando gringo.
O que esses mal-educados ambientais não aprendem é que filhotes crescem e podem sair do controle. A jiboia, por exemplo, foi vendida a um caminhoneiro em Belo Horizonte e veio para o Sul ainda pequena. Quando chegou à idade adulta, media três metros e começou a deixar o cara assustado, até que ele se desfez dela. Os jabutis, que são comprados como tartaruguinhas bonitinhas, quando crescem são abandonados. No meu caso, comecei a causar problemas pelo meu comportamento endiabrado. Não tem porta que eu não abra, nem fio que eu não morda. E eu estou sempre brincando de pular de galho em galho, como se nunca tivesse saído da floresta. Quando meu dono enjoou de mim, era tarde para que eu me readaptasse à vida selvagem. Por isso vim parar aqui, onde estou bem cuidado e protegido, principalmente nesses dias mais frios.