infraestrutura contraponto gestão soluções judicialização viagens
dívida agrava diagnóstico da dor Aumento do rombo na Secretaria da Saúde, falha na reposição de utensílios básicos e déficit de servidores em hospitais mantidos pelo Estado pioram quadro de quem precisa de tratamento, exame ou medicamento em Santa Catarina
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vanilde Duarte, 52 anos, mora no bairro da Saudade, Biguaçu, na Grande Florianópolis. Sentada à frente de um varal com radiografias do joelho penduradas, é uma das catarinenses que retratam a aflição da saúde pública no Estado. Em 2011, a usuária do Sistema Único de Saúde (SUS) teve diagnóstico de artrose no joelho esquerdo. A doença inflamatória e degenerativa nas juntas provoca desgaste das cartilagens que cobrem as extremidades dos ossos. Dói, incha, deforma. Por isso, a indicação de cirurgia e colocação de prótese. Quase seis anos depois, a operação não foi realizada.

Esforço pessoal não faltou. Na expectativa da cirurgia, Evanilde emagreceu 20 quilos. Mas sequer chegou à frente do ortopedista. Todas as vezes que foi se informar, recebeu a mesma resposta:

– A fila é grande. Tem que aguardar.

As justificativas são conhecidas da população que, independentemente da especialidade, precisa de algum procedimento. Não importa a complexidade. Faltam médicos, leitos, insumos. A dívida da Secretaria Estadual da Saúde, que chega a R$ 508 milhões, agravou o quadro já crônico em uma área debilitada e delicada. Que o digam os ostomizados, pessoas que usam bolsas coletoras para eliminar fezes e urina: pelo menos 1,4 mil dos 3,6 mil cadastrados na Secretaria de Estado da Saúde estão com o fornecimento suspenso. Um fator limitador das rotinas, pois quem usa as bolsas não sente mais vontade de fazer xixi ou cocô. A eliminação do organismo é involuntária.

Nem as crianças são poupadas desse rombo na área da saúde. No final de agosto, a direção do Hospital Infantil Joana de Gusmão, em Florianópolis, suspendeu as cirurgias eletivas. Medida também baseada na falta de material básico, como fio cirúrgico. Servidores relatam que pais precisaram comprar medicamentos mesmo enquanto os pequenos estavam internados na UTI.

 Igualmente atingidos foram os pacientes do Centro de Pesquisas Oncológicas, o Cepon, que atende 500 pessoas por dia em consultas, tratamento de quimioterapia, radioterapia e cirurgia ambulatorial. A dívida acumulada do governo em R$ 42 milhões (2017) se agravou com a suspensão de repasse mensal de cerca de R$ 6 milhões.

Resultado: além do comprometimento dos serviços essenciais para um lugar vulnerável, faltou remédio até para tratar câncer de mama.

O quadro da saúde pública piorou com o aumento do desemprego, suspensão dos planos de saúde e redução da renda dos catarinenses. Com isso, o antes desmerecido SUS virou salvação para muita gente. Porém, ele demora para atualizar a tabela e os remédios e pacientes se veem obrigados a buscar na Justiça a medicação para doenças raras.  Evanilde, que trabalha na casa de uma família de classe média, se deu conta disso:

– Até minha patroa está se tratando no SUS.

O aumento na demanda contribuiu para um mosaico desolador formado na rede hospitalar.

O Estado não fornece os números de quem aguarda medicamento, procedimento ou exames – promete para outubro, mas as filas afunilaram e aumentaram. Pacientes são “internados” em cadeiras. Servidores têm cargas adicionais de trabalho. Há gente espremida em corredores, quase grudada em paredes mofadas e com infiltrações, como no Hospital Regional Homero de Miranda Gomes, em São José. Inaugurado em 1987, o prédio nunca passou por uma reforma geral. Ali se encontram personagens de um cenário que lembra pós-guerra, às vezes refrescado por ventiladores trazidos de casa e aquecida por cobertores carregados dos próprios lares.

Nos últimos seis anos, período de espera de Ivanilde, o Estado teve quatro secretários na pasta. Nenhuma gestão conseguiu aliviar o sofrimento dela e de milhares de pacientes que integram as filas da saúde em Santa Catarina e vivem de esperanças. Exatamente o que falta para Evanilde, que apesar do cansaço segue esperando:– Quando toca o telefone a gente sempre acha que pode ser um aviso para a cirurgia.