GRITO DE
RESISTÊNCIA
ritmo e poesia nas batalhas de rima refletem a realidade das periferias de Florianópolis e dão o recado em um discurso de luta contra o preconceito
TEXTO | rafael thomé
rafael.thome@somosnsc.com.br
R
itmo e poesia, vulgo rap (do inglês, rhythm and poetry). Junte o break dance, o grafite, os samplers e scratches e está formada a expressão cultural conhecida como hip hop. Arte em cima de arte, ritmo em cima do ritmo, resistência pela resistência. Esse movimento surgiu no anos 1970 como forma de protesto e lazer nos subúrbios de Nova York (EUA), onde as comunidades mais pobres conviviam com diversos problemas sociais — principalmente racismo, tráfico de drogas e violência. Não é diferente na Grande Florianópolis do século 21.
Nas comunidades periféricas e marginalizadas, a população carece de oportunidades de renda e trabalho de qualidade e fica à mercê do poder paralelo e do braço forte e mão (pouco) amiga do Estado. Tal qual aconteceu com os imigrantes latinos e afro-descendentes norte-americanos que viviam na maior cidade ocidental 40 anos atrás, o hip hop unificou as diferentes quebradas e bairros da Capital catarinense e apresentou novas perspectivas à juventude pobre — e preta em sua maioria.
— O hip hop são cinco elementos: grafite, DJ, B-boys (break dance), o MC (mestre de cerimônias/rapper) e o conhecimento. Dentro disso, o rap tem que falar da quebrada, da violência policial e do Estado, das mortes silenciadas, das pessoas que não têm voz, do sistema carcerário... Tem que falar do que é a nossa crise cotidiana, que a gente só disfarça — avalia Yara Tatiane Espíndola, vulgo Berra, de 24 anos.
As batalhas entre MCs surgiram quase concomitantemente com o rap, como uma forma de apaziguar as tretas entre as diferentes gangues de Nova York. Enquanto The Sugarhill Gang e Grandmaster Flash sampleavam clássicos do funk soul e apresentavam ao mundo a raiz do hip hop em seus videoclipes, dezenas de MCs participavam das primeiras Batalhas de Sangue (disputa de rima improvisada entre dois rappers, onde um tenta desmoralizar o outro) para extravasar a raiva reprimida de maneira construtiva, em vez de partir para a violência.
Não demorou para a cultura hip hop chegar ao Brasil e, com ela, as batalhas. No final dos anos 1980 surgiram os primeiros grupos de rap no Brasil, movimento consagrado com o lançamento do disco Raio-X do Brasil (1993), do Racionais MC’s, em São Paulo. De lá para cá, a cena cresceu, transitou por diversos espectros (da crítica social à curtição da noite, passando pelo romance e o estilo gangster de ostentação) e ganhou milhões de adeptos em todo o país. Ainda assim, a consolidação das batalhas de rima como um evento regular de características bem definidas aconteceu só em 2003, com a Batalha do Real, no Rio de Janeiro.
Na Grande Florianópolis, nomes como o nosso querido Edsoul e o grande Negro Rudhy impulsionaram o rap no final dos anos 1990. Duas décadas depois, a nova geração do rap ilhéu entra de cabeça no mundo das batalhas para apresentar a realidade das quebradas e marcar um movimento social, político e cultural de construção coletiva que valoriza identidades, a conquista do espaço público e o reconhecimento social de uma população marginalizada e criminalizada pelos mais abastados.
As batalhas de rima em Florianópolis surgiram timidamente em 2009, com a Batalha do Mercado, no Centro da cidade. Aos poucos, o movimento cresceu e migrou para o Largo da Alfândega, até que, em 2014, o poder público encarou o encontro como um problema e decidiu dar fim à manifestação cultural. O tiro saiu pela culatra. Não só o movimento hip hop encampou a defesa, como diversas entidades se colocaram em favor da Batalha da Alfândega e lutaram para garantir sua continuidade (o documentário A Causa é Legítima, de 2016, conta bem essa história).
Apesar de na última semana a Guarda Municipal de Florianópolis tentar dispersar o encontro no Largo da Alfândega com oito viaturas, a cena só se fortalece. A Batalha da Alfândega, que acontece toda quinta-feira, ainda é a maior da cidade, mas o movimento se espalhou para outras regiões e, atualmente, há batalhas todos os dias da semana, cada uma em um lugar diferente. Embora hajam pequenas diferenças regionais entre uma batalha e outra, a raiz delas é a mesma: resistência de cultura negra periférica.
— A gente não pode nunca esquecer isso. Ficar rimando groselha é fácil, mas o lance é olhar para si mesmo e tentar matar o racista que a gente tem por dentro. Ninguém é culpado por ser branco, mas a gente é responsável por olhar para dentro de nós mesmo e refletir sobre nosso posicionamento, quem estamos silenciando e quem estamos respeitando – comenta Isabel Garcia ou Koi Za, de 28 anos.
Mensagens como esta são rotina nas batalhas de rima. Frente à frente, os MCs são portadores da voz da comunidade, são aqueles que colocam o pensamento e o sentimento em ação por meio da poesia marginal. Quem vai às batalhas vai, principalmente, para escutar uma mensagem, transmitir informação ou abraçar uma ideia para a caminhada.
— O rap vem muito disso. Da liberdade de expressão, daquela voz que está dentro da gente louca pra gritar, mas que muitas vezes é reprimida — atesta Pedro Augusto Garcéz, o Dropê, de 23 anos.
É por isso que o espaço da batalha de rima é a rua. O encontro não é apenas para cantar rap, é para juntar pessoas de diferentes realidades em um mesmo movimento sócio-cultural, dar voz, libertar amarras e, é claro, garantir a diversão gratuita para quem pouco tem ou pouco pode.
— As batalhas, hoje, são um encontro de arte urbana. Tem o rap como o carro-chefe, mas todo mundo que está aqui faz alguma coisa de arte urbana. Seja um grafite, seja poesia... Aqui tu encontra tudo isso, além de muita liberdade, muita expressão, muita gente que vem aqui para se sentir bem — conta Felipe Ribeiro, vulgo Quick, de 25 anos, designer e ilustrador que frequenta a Batalha da Alfândega, mas só faz rap “em segredinho”.
Mapa da rima
Onde e quando ocorrem as batalhas em Florianópolis
“Eu não tenho a letra.
Eu tenho a palavra”
Dona Fiota
Minas Gerais, 2006
BATALHA DO NORTE
DOMINGO
(trapiche de Canasvieiras)
Canasvieiras
BATALHA DA LAGOA
SÁBADO
(Praça do centrinho da Lagoa)
Lagoa da Conceição
BATALHA DA CENTRAL
TERÇA-FEIRA
(Padaria Recanto dos Pães, Campeche)
Campeche
BATALHA DA ARMAÇÃO
SEXTA-FEIRA
(entrada principal da
praia da Armação)
Armação
BATALHA DO PEDREGAL
DOMINGO
(Campinho do Puca, Tapera)
Tapera
BATALHA DA COSTEIRA
QUARTA-FEIRA
(pista de skate da
Costeira do Pirajubaé)
Costeira do Pirajubaé
BATALHA DO IFSC
SEGUNDA-FEIRA
(IFSC, Centro)
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BATALHA DA ALFÂNDEGA
QUINTA-FEIRA
(Largo da Alfândega, Centro)
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BATALHA DAS MINAS
SÁBADO
(Terminal Velho, Centro)
Centro
Língua das ruas
BATALHA DE SANGUE
Disputa de rimas improvisadas entre dois MCs, um desmoralizando o outro
BATALHA DE CONHECIMENTO
Disputa de rimas improvisadas entre dois MCs sobre temas sugeridos pelo público
BEATBOX
percursão vocal do Hip Hop
FLOW
Fluidez
FREESTYLE
Rima improvisada
MC
Mestre de cerimônia; rimador
RAP
Ritmo e poesia, do inglês rhythm and poetry
SAMPLE
trecho de música utilizado como base para nova construção musical
SCRATCH
Técnica musical utilizada para produzir sons ao “arranhar” o disco de vinil para frente e para trás repetidas vezes
VULGO
apelido/nome artístico
A
As batalhas de rima ocorrem em duas modalidades: sangue e conhecimento. A primeira consiste em dois MCs fortemente armados de palavras, prontos para disparar rimas que desmoralizem o adversário (só não vale ofender a família ou a etnia, nem fomentar a pederastia). Na de conhecimento, a ideia é que cada MC tente expor da melhor maneira sua opinião sobre um assunto sugerido pelo público.
— Muita gente tem pensamentos, de certa forma, violentos, até por falta de uma boa educação ou de oportunidade. Aí tu vai pra batalha e a de sangue serve para quê? Para desestressar, tirar aquela energia de dentro. Depois, já agrega em cima o conhecimento — comenta Thalles Maeski Firmino, vulgo Caru, de 18 anos.
Tal qual os movimentos tribais, a galera se junta em rodas para compartilhar vivências, opiniões e sentimentos. Há quem prefira a batalha de sangue justamente para aliviar a tensão cotidiana e quem prefira a batalha de conhecimento para aprender algo novo.
— Venho para debater e agregar um conhecimento que não é passado para a gente. A batalha de conhecimento traz uma reforma de consciência para os jovens e a de sangue trabalha a desconstrução do ego — afirma Lucas Edgar, vulgo Karma, de 19 anos.
— É mais suave trabalhar o conhecimento, porque você pode puxar as temáticas latentes e testar o conhecimento real do MC. Não adianta só ter flow. Já a batalha de sangue mexe muito mais, te sacode todo, porque tem que responder (a tiração do adversário) em tempo real, lidando com as emoções e tentando ser consciente — complementa Koi Za.
As rimas podem ser feitas à capela — e há, até, um novo movimento focado nisso, o Slam Poetry, que é uma competição de recital de poesias —, mas geralmente são usadas bases musicais para embalar os MCs. Atualmente, as caixas de som portáteis são bem acessíveis, mas a galera ainda aposta em um dos pilares do hip hop, o beatbox – uma percussão vocal que consiste na arte de reproduzir sons de bateria com a boca e o nariz. Também envolve o cacarejo, imitação com a voz de efeitos de DJs, simulação de cornetas, cordas e outros instrumentos musicais, além de outros efeitos sonoros. Em Floripa, um dos grande nomes do beatbox é o mediador de diversas batalhas João Paulo Breis Vieira, vulgo Jota, de 19 anos.
— Comecei fazendo as batidas mais simples de rap e funk lá no Campeche. Daí, fui brincando de tentar imitar os sons, tentado fazer uma música do 50 Cent (Just A Lil Bit). Depois que aprendi uma, não parei mais — conta.
O bigode estilo Mano Brown, a camiseta larga e o boné na cabeça rotulam a preferência musical de Jota pelo rap, mas o beatboxer vai muito além do hip hop. Segundo ele, nem todo mundo gosta de beatbox, mas todo mundo gosta de música. Assim, partiu para outros gêneros e hoje embala o ouvido da galera com músicas do Tom Jobim, Cássia Eller, Zé Ramalho e outros nomes da MPB.
— A pessoa pode não gostar tanto de beatbox, mas se eu fizer de uma música que ela gosta, pode passar a curtir. É por isso que eu tento abranger o maior número de músicas possíveis — afirma.
Dos anos 1980 em diante, Florianópolis passou a receber moradores de outras cidades atraídos pela chamada “qualidade de vida”. Segundo pesquisa divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em abril de 2012, apenas 48,29% dos moradores da Capital são nativos. Mais da metade da população veio de fora, o que garantiu ares cosmopolitas à cidade.
No movimento hip hop não é diferente. Apesar do grande número de manezinhos que frequentam as batalhas de rima, gaúchos, paranaenses e paulistas, principalmente, marcam presença em uma coexistência pacífica.
De sete rappers entrevistados nas batalhas da Alfândega e das Mina, apenas dois são de Florianópolis: Koi Za e Karma. Berra e Jota também são catarinenses, mas nascidos, respectivamente, em Ituporanga e Joinville. K47 é de Ponta Grossa (PR), Caru é de Porto Alegre (RS) e Dropê, de Lagoa Vermelha (RS).
— São diversas características, tem daqui, mas tem rapper de tudo quanto é lugar. Cada um recebeu um chamado para estar em Floripa e é isso aí — comenta Karma, nascido no Hospital Regional e morador da Vila Aparecida.
Quis o destino que Karma construísse sua família com uma paranaense, a também rapper Karina Alves, vulgo K47, de 27 anos. Há alguns meses, os dois deram vida ao casal de gêmeos Cauâ Sol e Glória Lua e hoje se dividem entre a criação dos filhos e o movimento hip hop. Para K47, é importante que a galera de fora some forças, mas é fundamental que os rappers ilhéus representem a cena.
— Às vezes, Floripa é representada por nomes que são de fora, mas é necessário que as pessoas que nasceram aqui levem o nome da cidade. Além disso, o sotaque manezinho é uma marca única. Tem que ter esse sotaque, trazer os jargões, que é o diferencial do rap daqui — afirma a rapper.
“Quem sabe o segredo do hip-hop
Sabe o ouro que nossos ancestrais deixaram pra nós e
Quem rima hoje tá aqui
Pra não aplaudir adversário
Rimando, versando, desmascarando cenários (...)
Repito palavras pra ficar mais claro
Ligue todos os meus sons e verás um diário
Do baque diário
De querer vencer nesse sistema que me quer como presidiário
E eu que como tão pouco
Soube de informações me embrulham o estômago só de lembrar
Preço alto, paga alto pra despertar” (Valsinha, Karma)
Desde a gênese, o rap brasileiro enraizou a cultura politizada da periferia, e é da Vila Aparecida, na região continental de Florianópolis, que vem um dos exemplos de engajamento político dos MCs que fazem as batalhas de rima. Enquanto o maior expoente atual do rap manezinho faz sucesso com amenidades no YouTube — o Mussoumano —, é a Valsinha, do rapper Karma, que grita nos ouvidos mais atentos o desencanto com este mundo de pós-verdades e ânimos acirrados que alimentam os podres poderes.
— Querendo ou não, a gente vive uma guerra civil. Quem está dentro das comunidades sabe disso. A gente vive isso. Quer arrumar um trampo? É mais pretinho, mais escurinho. Aqui é cidade de burguês, não se tem acesso a trampo de qualidade. A criminalidade está batendo na nossa porta, mas a cultura traz uma reforma de consciência para poder se viver a partir de outros princípios — analisa Karma.
Aí que reside a importância das batalhas de rima para a cidade: a cultura oral de falar sobre vivências de forma aberta, sem passar por edição. Quem está nas batalhas fala do que está vivendo, da realidade de sua quebrada e, é claro, do preconceito cotidiano que sofrem os moradores de regiões periféricas e/ou marginalizadas.
— Tenho muito orgulho de fazer rap, e só faço porque sou preta. É muita emoção quando você está rimando, porque você está falando das coisas que viveu. É uma via para extravasar, colocar a tua frustração e transformar aquilo em algo que pode dar força para outra pessoa enquanto está dando força para ti também — comenta Berra.
— A gente está se destruindo, chegando numa etapa do mundo em que as relações interpessoais estão cada vez mais difíceis. O mundo está pedindo uma nova evolução para poder seguir em uma construção harmônica. Acredito que estamos em uma fase de despertar da consciência coletiva — aponta Dropê.
A voz das minas
“Batalha das Minas, o que significa? Representatividade feminina!”
É
assim que as MCs dão início à Batalha das Mina, todos os sábados, no Terminal Velho do Centro de Florianópolis. O grito de guerra marca posição no combate ao machismo cotidiano e ao regime patriarcal que coloca as mulheres submissas aos homens em casa, nos empregos e, até mesmo, na cultura. Como elas mesmas deixam bem claro, a luta não é apenas no hip hop.
— A sociedade é machista, não só o rap. Eu venho do meio do punk hardcore, onde era a mesma coisa. Mesmo no rock clássico. Se você parar para ver, os Beatles tem letras onde ameaçam a companheira (Run For Your Life, I’ll Cry Instead e Getting Better, por exemplo). É todo um contexto social que acaba levando a predominar a violência, o esvaziamento de relações, a mistificação de que a mulher só serve para cama, mesa e banho — afirma Koi Za.
A Batalha das Mina acontece há pouco mais de um ano. Nesse período, a constatação é de que o cenário mudou, muitas mulheres se empoderaram e passaram a usar o rap para falar da realidade. É raro ver episódios de rivalidade acirrada nos encontros semanais, como eventualmente acontece nas batalhas abertas a homens.
— Com as minas, não tem campeã. A gente dá o máximo para a outra MC dar o máximo também. Tem um lance muito de troca. Por ser um espaço só de mulheres, trabalhamos temas que não estão em outros lugares e isso dispara muitos gatilhos — comenta Berra.
Para Koi Za, quando se fala em MC, a sensação é de que se trata de alguém com uma história longa no rap, mas não é necessariamente assim. É claro que já existiam MCs mulheres em Florianópolis antes da Batalha das Mina — algumas delas inspiradas em Viviane Lopes Matias, vulgo Dina Di, considerada a primeira a alcançar sucesso no rap brasileiro —, mas a realidade é que eram muito poucas.
— Várias pessoas que nunca tiveram coragem de falar ou ler uma poesia em público, mesmo que praticassem em casa, têm sentido a experiência de soltar a voz e construir uma história mesmo que ainda curta, mas com muita qualidade — afirma Koi Za.
A participação maciça das mulheres nas batalhas de Florianópolis teve início, de fato, depois da consolidação da Batalha das Mina. Antes, muitas MCs não se sentiam à vontade para batalhar com homens.
— A batalha das minas, pras minas, traz segurança, um abraço e um aconchego pra que elas tenham coragem de começar — comenta K47, uma das poucas MCs a enfrentar batalhas abertas antes da Batalha das Mina.
Berra é uma das MCs que se sentiu acolhida pelas minas e deu o start no rap freestyle. Ela diz que costumava colar na Batalha da Alfândega para assistir, mas não se sentia confortável para arriscar algumas rimas:
— No começo, você sente vergonha, até porque os caras já estão bem avançados. Aí tu vai chegar lá e vai travar, ainda mais sendo mina. Entre as gurias é bem mais receptivo, bem mais fácil começar.
Ainda que o machismo esteja sempre à espera de uma brecha para ecoar nas batalhas de rima, a sensação é a de que a Batalha das Mina fortaleceu a causa e está conscientizando MCs e o público que faz acontecer o movimento hip hop. Para Koi Za, é nítida a mudança de postura dos rappers quando estão diante das minas.
— Agora, a gente sente que o respeito é outro nas batalhas. Existe uma preocupação muito grande do que vai ser dito, até um certo medo. É através da rima do oponente que você vai brincar com aquilo, então, se ele deslizar, a gente vai trabalhar em cima disso e vai levar (a batalha) de certeza — comenta Koi Za.
Koi Za, K47 e Berra são apenas três das inúmeras MCs que meteram a cara nas batalhas de rima e sonham em viver de arte. Sonham, não. Em certa medida, já vivem da arte. Se o rap ainda não gera uma renda suficiente para se manterem, o jeito é aproveitar outros talentos.
Karina Alves, por exemplo, faz e vende artesanato, mandalas e objetos em pedra. Isabel Garcia aposta na ilustração, grafite, publicações impressas, brechós e bicos em bares, mas comemora o fato de estar há oito anos sem um emprego formal.
— Com certeza eu não sentiria o que eu sinto com relação à minha experiência enquanto pessoa no mundo e minha relação com meu filho (Pedro, de 12 anos), se não fosse a arte. Eu estaria dentro da caixinha que me colocaram enquanto pessoa pobre, num subemprego, queimando a cabeça para pagar as contas. Continuo com essas preocupações, mas eu vivo em outra realidade também. A arte me salvou — afirma Koi Za.
K47 compartilha das ideias de Isabel e vai além: é uma sonhadora convicta. Para Karina, as batalhas de rap podem ser uma fagulha para que mais pessoas abram a cabeça para outros aspectos da vida além do trabalho e das obrigações como cidadão e mudem a própria realidade.
— Os sonhadores acreditam. Seguimos até o fim acreditando no nosso sonho. Não é só um sonho de fazer música, é um sonho de viver do que a gente ama.
A gente tem que viver do que a gente ama, seja o que for. Sonhadores acreditam, temos que acreditar e seguir fazendo arte na guerra.
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