Itaimbezinho

Churriado

Fortaleza

Da Pedra

Malacara

DUAS PERSPECTIVAS DO CÂNION FORTALEZA

á 135 milhões de anos, a região que hoje define a divisa entre os estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul sofreu com sucessivos derramamentos de lava. Quando da separação dos continentes, a parte oriental do planalto se rompeu e ergueu, deixando à mostra as escarpas. Coube ao vento, às chuvas e aos rios apararem as arestas, redesenharem os contornos e formarem os cânions.

Dessa forma, quem vem por Santa Catarina e chega a Jacinto Machado ou a Praia Grande, se depara com um imenso degrau, com mais de mil metros de altitude em alguns pontos e que se estende por cerca de 200 quilômetros com a mesma característica de relevo desde o extremo Sul do estado até a região de Urubici, no Morro da Igreja.

Onde a diferença entre a planície costeira e o planalto é mais acentuada foi criado o Parque Nacional Aparados da Serra, em 1959, com 130 quilômetros quadrados distribuídos entre Rio Grande do Sul e Santa Catarina. O parque abriga o cânion Itaimbezinho, que chama a atenção pela profundidade de 700 metros das suas paredes verticais até a base do Rio do Boi. Lá embaixo, o leito parece um risco que por horas reflete a luz do sol. Em 1992, a área de preservação foi ampliada para 300 quilômetros quadrados com a criação do Parque Nacional da Serra Geral que incluiu outros cânions como o Malacara, Churriado e Fortaleza.

 

OS CÂNIONS ENTRE SC E RS

Sobre o planalto, em terras gaúchas e a apenas 200 metros do precipício do Itaimbezinho, está a base do Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio). Em uma sala, no segundo andar da principal casa, o diretor do Parque Nacional Aparados da Serra e do Parque Nacional da Serra Geral, Deonir Zimmerman está sentado com diversos papeis sobre sua mesa.

O catarinense nascido em Concórdia olha pela janela e observa a névoa que se forma ao final de tarde e transforma a paisagem. Ainda que seja verão, a brisa que carrega as nuvens rentes ao solo não deixa de lembrar da altitude.

Da mesma forma que as nuvens se contorcem em espirais entre as copas das araucárias enquanto avançam, na mente de Deonir o acampamento de caçadores, a trilha fechada, o pneu estourado de uma camionete e o leão-baio parecem se entrelaçar. São pensamentos, que como os ecossistemas da região,  dependem de diversos fatores, mas ainda sobrevivem ao longo dos anos.

Mas esses estão longe de serem os principais problemas para manutenção dos parques. O não ressarcimento aos proprietários das terras que hoje fazem parte dos parques é o principal motivo pela falta de soberania do projeto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Apenas 57% do Parque da Serra Geral e 77% dos Aparados estão adequadamente registrados.

— É uma diretriz nossa respeitar o proprietário não indenizado e evitar processos judiciais desnecessários — explica Deonir.

Apesar de o relacionamento, com pontuais exceções, ser amigável com proprietários não indenizados, a razão desses números atrapalha os trabalhos dos pesquisadores e ambientalistas.

— O nosso trabalho fica prejudicado porque não podemos ter plena autonomia em determinadas áreas para realizar as pesquisas de campo. Fora o aspecto público turístico que também fica restrito, pois não há acesso livre a todas as áreas - revela o ambientalista Magnus Machado Severo.

Se na parte superior dos cânions, os campos de cima da serra cobrem as colinas, exceto pelas araucárias que se erguem verticalmente como um eixo de bicicleta com seus raios na ponta, na parte interna, entre os paredões há uma profusão de tons de verde. Enquanto na borda gaúcha se pisa sobre pasto raso ao lado de flores do campo, um metro para frente e centenas para baixo se observa a mata atlântica frondosa, em terras catarinenses.

Entre os turistas que fazem as mais variadas fotos e tentam evitar que o vento despenteie seus cabelos, alguém pergunta:

— Será que tem como ir lá embaixo? — e aponta para a estreita linha do rio que corre em meio ao verde.

Galeria dos parques

Fortaleza tem incontáveis piscinas naturais

 

Lá em baixo, onde o Rio Tigre Preto cavou ao longo dos anos seu curso, estão incontáveis piscinas naturais. Cada cânion tem uma característica em particular, o interior do Fortaleza é perfeito para tomar banho de rio. Acompanhado de um guia credenciado, partimos de Jacinto Machado de carro por mais 20 quilômetros através de uma estrada de terra. No caminho, o verde da mata está por todos os lados e o ar úmido espalha o cheiro de chuva de verão. Mas o céu está claro e a sensação vem do rio que corre ao lado.

O primeiro passo da trilha é dentro da água. A partir dali serão seis quilômetros de caminhada rio acima e bastaram alguns metros para logo encontrar a primeira piscina de água cristalina.

Após dois quilômetros, o rio faz uma curva e se observa o interior do cânion Fortaleza em formato de "v". Os valores de grandeza são devastados pela imensidão de 900 metros que despenca em tons de mata frondosa e de pedras brancas assoladas pelos ventos, lá no alto. Quase seis vezes mais alto que o maior prédio residencial do Brasil, que tem 160 metros.

Na mesma perspectiva, está algo tangível como um banho de cachoeira e algo avassalador como a altura dos paredões que te cercam. A água estrala em respingos, sussurra em pequenas cachoeiras e ruge em corredeiras. Ainda que 500 vezes menor que altura dos paredões, basta outro banho de rio para o peso dos ombros escorrer e te nutrir com uma sensação de liberdade e a eternidade.

— Parece que ficamos mais perto da nossa essência de ser humano em lugar assim. Nos ajudamos durante a trilha, ainda que nos conhecemos há apenas algumas horas. Tudo de forma instintiva e livre por escolha — explica Ricardo Orling.

Galeria do Itaimbezinho e cânion da Pedra

Difícil e intensa trilha pelo cânion da Pedra

 

O cânion da Pedra não está dentro da área de preservação do parques e se encontra exatamente no limite Norte do Parque da Serra Geral. A propriedade é particular, mas assim como nas áreas preservadas, é preciso estar acompanho de um guia para conhecer a trilha. Diferente dos cânions Itaimbezinho e Fortaleza, a trilha é mais íngreme e o Rio Pai José é menor que o Tigre Preto e Rio do Boi.

Ainda assim, há algumas piscinas naturais durante a caminhada, mas o primeiro ponto que chama atenção durante a trilha é quando a fenda se divide e pedras imensas, do tamanho de carros, se aglomeram uma sobre as outras como se tivessem despencado dos paredões e rolado pelo rio. Entre elas, troncos de árvores retorcidas ainda servem de abrigo para bromélias. Ao correr sobre as pedras, o rio forma diversas pequenas cachoeiras que são perfeitas para recuperar as energias antes de seguir a caminhada.

O brete é o trecho em que o rio se espreme entre duas paredes de 20 metros de altura cada e afastadas apenas cinco metros uma da outra. Não há outro caminho a seguir se não entrar o desfiladeiro com água até a altura do peito e as mochilas sobre as cabeças. O sol raramente consegue iluminar aquele ponto que respira umidade e as pedras são geladas como a água, que de tão fria, parece remover o fôlego dos pulmões.

Logo em seguida, a cachoeira Ana Shirriata surge como um prêmio após o "aperto" do brete. As águas caem de 40 metros de altura em um poço amplo e fundo. O som da queda d'água ecoa dentro do espaço cercado pelas paredes de pedra. No alto, o verde saturado contrasta com o azul do céu e surge uma sensação de que ninguém seria capaz de te achar ali, nadando em meio à natureza.

 

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Paredões de 500 metros no Itaimbezinho

 

Pela estrada de chão que percorre as colinas de  vegetação rasteira do planalto chega-se a base do ICMBio, dentro do Parque Nacional de Aparados da Serra. A entrada custa R$ 13, mas brasileiros tem 50% de desconto. Ao lado da casa, que serve de estrutura principal dos parques, está a enorme fenda do cânion Itaimbezinho, com 700 metros de profundidade naquela área.

Há duas trilhas na parte superior, a do Vértice e do Cotovelo. A primeira com 500 metros de extensão te coloca de frente para a cachoeira Andorinhas. A segunda, com três quilômetros, te leva para a borda do cânion onde ele faz uma curva sentido Leste. Do outro lado do abismo, alguns pinheiros de araucária se colocam à margem do penhasco e como se sentissem vertigem ao olhar para baixo, se resguardam.

Do fundo do cânion, onde corre o Rio do Boi, a mata frondosa e verde escalou as paredes até onde conseguiu. A trilha do Rio do Boi consiste em subir a pé o leito do rio até o interior do cânion e ao longo da caminhada percebe-se que os morros ficam cada vez mais íngremes e altos, até que se está completamente engolido pelo Itaimbezinho. De cada um dos lados, os paredões de pedra sobem 500 metros. Se no Fortaleza as piscinas naturais são a identidade do cânion, no Itaimbezinho a proximidade com os paredões e o fato de serem quase que verticais até a base do rio e estarem ao alcance das mãos, dão a dimensão de sua grandeza para quem explora seu interior.

 

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A região dos cânions, na divisa dos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, encanta pelas escarpas com 900 metros de altura que formam um imenso degrau. Entre essas fendas estão rios com cachoeiras e piscinas naturais acessíveis por trilhas que desafiam aventureiros

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Reportagem: Erich Casagrande

Edição: Salvador Gomes

Fotos: Alvarélio Kurossu e Erich Casagrande

Design: Mariana Weber

Parque Nacional Aparados da Serra (PNAS)

Criado em 17/12/1959

Área: 130 km²

Cânions: Itaimbezinho

 

Parque Nacional da Serra Geral (PNSG)

Criado em 20/05/1992

Áera: 172 km²

Cânions: Malacara, Churriado, Fortaleza

 

Cidades: Praia Grande (SC), Jacinto Machado (SC), Cambará do Sul (RS)

Animais emblemáticos: Graxains, Quatis, Tatus, cervos, Puma, Macaco Bugio, Jaguatirica, Urubu-rei, Águia-Chilena, Jararaca

Importância Hídrica: Rios e nascentes das bacias hidrográficas do Araranguá, Mampituba e Taquari/Antas

 

Em 2013, 37 pesquisas ambientais foram liberadas para a realização dos estudos dentro da área dos parques

 

Parques na região