| 03/03/2005 19h52min
Para garantir o crescimento do agronegócio brasileiro é preciso agregar valor aos produtos exportados. De acordo com o economista Luís Humberto Willwock, coordenador do MBA em Economia e Gestão dos Agronegócios da Unisinos, o Brasil voltará a ser uma economia primária exportadora se não forem desenvolvidas políticas que incentivem os produtores do setor agrícola a beneficiar seus produtos em vez de vendê-los em estado bruto.
Willwock participou na tarde desta quinta, dia 3, da mesa que proferiu palestra intitulada Tendências do Agronegócio na sede da Fundação de Economia e Estatística (FEE), em Porto Alegre. O evento, que faz parte do Seminário Tendências da Economia Gaúcha para Bancos de Fomento, organizado pela CaixaRS em parceria com a FEE, também contou com a participação da economista Maria Domingues Benetti, do quadro da Fundação.
Em levantamento realizado nos últimos oito anos com dados coletados nas seções de economia dos jornais Valor Econômico e Gazeta Mercantil, Benetti apresentou dados sobre o aumento da concentração das agroindústrias brasileiras. Conforme a economista, a partir do final da década de 80 o Brasil passou a ocupar papel estratégico para os investidores estrangeiros, especialmente europeus: o de grande fornecedor de matéria prima.
– As empresas nacionais foram tomadas de amores pelo capital estrangeiro, e a compra de empresas do Brasil por multinacionais se deu de forma impressionante.
Conforme Benetti, as dificuldades de manutenção das agroindústrias nacionais durante o período de abertura econômica no Brasil fizeram com que empresas de outros países encontrassem um cenário favorável para aquisições no país. Num primeiro momento, explicou a economista, houve uma grande concentração de alguns setores (leite, carnes, sementes) nas mãos de multinacionais. Num segundo momento houve uma reestruturação do setor agroindustrial brasileiro, com a revenda de empresas entre estrangeiros e a focalização em atividades específicas – situação que, por sua vez, provocou uma explosão da produção agrícola (soja, aves, suínos), agora consumida por grandes conglomerados multinacionais estabelecidos no país e voltados para a exportação.
Conforme levantamento realizado por Benetti, apenas no setor de alimentos e bebidas a participação de empresas estrangeiras aumentou quase cinco vezes entre 1996 e 2002, passando de 2,4% do total de agroindústrias para 11,3% num período de seis anos. Exemplo apresentado pela economista revelou que em 1990 as quatro maiores empresas do setor de soja e derivados – multinacionais ou integrantes de grupos estrangeiros – detinham 31% da agroindústrias de soja e derivados; em 2004 as mesmas quatro empresas (ou o que resultou de fusões em que elas se envolveram) detinham 80% do mercado de soja.
Neste mesmo período as exportações brasileiras em bruto (commodities sem nenhum valor agregado) também aumentaram de forma significativa: em 1997 o fumo não beneficiado exportado pelo Brasil representava 60% das vendas externas; em 2003 o percentual já era de 95%. No mesmo ano a soja exportada em bruto respondeu por 90% do volume vendido para o Exterior, o café em bruto superou os 80%, o açúcar 60% e a celulose para papel, 60%. Atualmente, destacou Márcia Benetti, as commodities primárias respondem por 77,2% do total das exportações brasileiras.
O economista Luís Humberto Villwock, por sua vez, reforçou a tese de Benetti de que "estamos perdendo a soberania dos nossos negócios".
– O crescimento da economia agroindustrial é muito grande, gera muita renda. O problema é que a festa vai ser aqui, no Brasil, mas não não vamos ser convidados – brincou.
Villwock lembrou que até mesmo a sazonalidade agrícola, que impedia que a produção fosse encarada de forma industrial pela impossibilidade de se colher o ano todo em função do clima e dos períodos de plantio, já está sendo superada. O economista citou como exemplo produtores de soja americanos que plantam o grão seis meses por ano nos Estados Unidos e nos seis meses restantes produzem em terras compradas ou arrendadas no Brasil, mantendo assim a oferta de grãos o ano todo.
O economista reforçou a idéia de que o Brasil está fadado a ser um grande celeiro produtor de produtos agrícolas para o resto do mundo, vendendo sua produção sem valor agregado, a não ser que sejam postas em prática políticas de valorização do produto nacional.
– O Brasil, hoje, exporta produtos de baixa-média intensidade tecnológica, sem grande valor agregado, e importa produtos de média-alta intensidade tecnológica, com grande diferença de valor – explicou Villwock.
De acordo com o economista, uma possível alternativa para que o Brasil não seja eternamente um fornecedor de produtos primários é a valorização da produção nacional através de seu beneficiamento. Villwock lembrou que existem dificuldades externas como a imposição de barreiras tarifárias e protecionismo, mas destacou que a principal barreira que o Brasil precisa superar é a falta de conhecimento e de pessoas qualificadas para participar de um processo de modernização da agroindústria nacional e valorização da produção.
A alternativa defendida por Villwock é a formação de Consórcios de Exportação – grupos de empresas com interesses comuns que se unem para produzir em grande quantidade a preços menores, para negociar melhores preços e para se apoiar, sem haver a necessidade de fusão física. O desafio, alertou o especialista, é superar o preconceito existente contra o cooperativismo e partir para uma "atitude de colaboração", além de preparar profissionais aptos a coordenar estes consórcios e a orientar as empresas.
– A soberania depende de educação. Inteligência não nos falta, nós só precisamos saber o que fazer com ela. Falta qualificação, e é isso que os brasileiros precisam buscar.
Benetti e Villwock defenderam, por fim, a destinação de recursos das agências de financiamento e fomento especialmente para alavancar empresas
que tenham projetos que agregam
valor aos produtos de exportação ou projetos de logística, buscando uma maior competitividade das agroindútrias brasileiras.
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