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 | 03/08/2006 13h42min

Libanês que retornou ao Brasil diz que Israel impede ajuda humanitária

Mohamed Ibrahim participou de bate-papo com internautas do clicRBS

Não existem lugares seguros no Líbano e Israel está impedindo ajuda humanitária ao país, já que bombardeia tudo o que se move nas estradas. A opinião é de Mohamed Ibrahim, libanês que retornou com parte de sua família para Pelotas, no Rio Grande do Sul, na terça-feira, da zona de conflito no Oriente Médio.

– Ninguém saía de casa se não fosse para buscar alimentos. Mesmo assim era arriscado. Israel bate tudo o que se move nas estradas – disse o libanês.

Ibrahim participou de bate-papo com internautas do clicRBS e falou um pouco sobre o que mudou com o início do conflito armado na região. Segundo ele, o exército israelense não tem nenhuma preocupação com a população do Líbano.

– Éramos três pessoas e eu abriguei comigo mais 25. Tudo mudou. Aumentaram as despesas com a procura de alimentos, água potável e remédios. Israel começou a bombardear toda a infraestrutura do país – disse Ibrahim.

O chat foi mediado por Vanessa Costa e conduzido pelo jornalista Diego Guichard.

Confira a íntegra do bate-papo.

Pergunta – Em qual cidade do Líbano o senhor morava?

Mohamed Ibrahim – Beirute, residência a 10 quilômetros do centro atacado por aviões.

Pergunta – Qual era a sua ocupação? O senhor trabalhava lá?

Mohamed Ibrahim – Não, estava visitando minha família que mora lá.

Pergunta – Quanto tempo o senhor ficou no Líbano?

Mohamed Ibrahim – Cinco meses. Nesse período, assisti 12 dias de combate.

Pergunta – Desde quando os bombardeios começaram a assustar a população?

Mohamed Ibrahim – Desde o primeiro dia, onde foi atacados o aeroporto, o quartel-general do Hezbollah e a redondeza que era de prédios residenciais.

Pergunta – Nesses 12 dias de combate, o que mais chocou o senhor?

Mohamed Ibrahim – O que mais me chocou foi o estado dos civis que estavam vindo do sul do Líbano e crianças chorando, às vezes perdidas de suas famílias. Todos somente com a roupa do corpo.

Pergunta – Como foi a reação da população local e da sua família, no primeiro dia do ataque?

Mohamed Ibrahim – Muito medo, nervosismo e orações para que não acontecesse nada de errado para nós. Começamos a procurar pessoas que vem do sul para ajudá-los e achar abrigo para eles.

Pergunta – O senhor morava com quantas pessoas em casa? O que mudou na vida de vocês depois que o conflito iniciou?

Mohamed Ibrahim – Éramos três pessoas e eu abriguei comigo mais 25. Tudo mudou. Aumentaram as despesas com a procura de alimentos, água potável e remédios. Israel começou a bombardear toda a infraestrutura do país(portos, aeroportos e estradas).

Pergunta – Vocês se sentiam seguros em casa?

Mohamed Ibrahim – A minha região era turística e não enfrentava tanto perigo na época.

Pergunta – Teve algum amigo ou conhecido que morreu por causa do conflito?

Mohamed Ibrahim – Conhecíamos uma família do sul do Líbano que morreu soterrada. Eram dois adultos e cinco crianças. Eles moravam quase na fronteira com Israel, tinham de mudar para a casa nova, estavam felizes. Eu os vi 15 dias antes de acontecer tudo!

Pergunta – O que vocês faziam para se sentirem mais seguros? Vocês tinham regras?

Mohamed Ibrahim – Sim, ninguém saía de casa se não fosse para para buscar alimentos. Mesmo assim era arriscado. Israel bate tudo o que se move nas estradas. Fica difícil até buscar por amigos e familiares. Para segurança, todos procuram abrigo nas partes mais baixas dos edifícios. Mas nem sempre são seguros. Um exemplo é o que aconteceu em Qana, onde morreram cerca de 60 pessoas, na maioria crianças.

Pergunta – Como ficou o comércio? Postos de gasolina ou shoppings funcionam?

Mohamed Ibrahim – Todo comércio fechado. Postos de gasolina só funcionam até o término do depósito. Muitos foram atacados.

Pergunta do internauta – O senhor é a favor ou contra a Hezbollah?

Mohamed Ibrahim – Eu sou a favor da resistência libanesa, que está defendendo seu solo.

Pergunta – Sendo a favor da resistência libanesa, o que o senhor acha do Hezbollah?

Mohamed Ibrahim – Eles são libaneses, defendendo o Líbano, estou com eles dentro do Líbano. Não sou a favor de ataque na Europa ou em outro lugar, que não seja a defesa do país e seu povo.

Pergunta – Israel também culpou o Hezbollah pelo atentado em Qana. A milícia se preocupa com a população local?

Mohamed Ibrahim – Negativo! Diversos jornais e muitos outros americanos  estavam no local, em Qana, e nunca viram um soldado do Hezbollah ou qualquer veículo militar no local.

Pergunta – E as ações de Israel contra o Líbano? O senhor acredita que o exército israelense é cuidadoso em relação a vida dos civis?

Mohamed Ibrahim – Óbvio que não. Cerca de 900 pessoas já morreram. Além disso, tem mais 500 desaparecidos nos escombros, três mil feridos, 900 mil refugiados. Imagina se Israel se preocupa e cuida dos civis. Israel é o único país do mundo que não tem fronteiras, sempre aumenta, anexa terra ao território, aumenta desabrigados e refugiados, destruindo casas e famílias. Isso tudo só faz aumentar o ódio!

Pergunta – O senhor sentiu falta de ajuda humanitária vindo de outros países?

Mohamed Ibrahim – Não chega ajuda, pois os carros são todos bombardeados por aviões israelenses.

Pergunta – Mas então como ficam as pessoas que continuam lá? Vai faltar alimento, não?

Mohamed Ibrahim – Já falta. Existem locais onde a ajuda não consegue chegar, e as pessoas já estão há 10 dias sem alimentos e remédios. O medo de epidemias ronda a todos os refugiados e os médicos que conseguem trabalhar

Pergunta – Vocês têm muitos amigos na região?

Mohamed Ibrahim – Sim, muitos amigos e familiares. Moro no Brasil há 30 anos, mas toda minha família está lá!

Pergunta – Como o senhor fez com sua família para retornar ao Brasil?

Mohamed Ibrahim – Viemos com a ajuda do governo brasileiro e da FAB, que deram uma aula de civismo para outras nações. Eu, como milhares, saí de lá em comboios para a Turquia, e de lá pela FAB até o Brasil.

Pergunta – A maioria da sua família mora lá, então? O senhor consegue se comunicar com eles?

Mohamed Ibrahim – Meus familiares estão em Damasco no momento, seguros. Falo diariamente com eles por telefone celular.

Pergunta – Eles podem tentar vir para o Brasil?

Mohamed Ibrahim – Se eles acharem por bem, podem sim vir para o Brasil.

Pergunta – Quais são as suas perspectivas a respeito do conflito? Acredita que a guerra vai terminar logo ou vai receber intervenção de outros países?

Mohamed Ibrahim – Acredito que o conflito vá terminar logo. Também acredito que uma força internacional deva entrar entre os dois lados, no território dos dois países! Desde que não sejam liderados por americanos e ingleses.

DIEGO GUICHARD
 

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