Itapema FM | 20/07/2016 06h51min
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Não há o que discutir: o auge para qualquer um que dança em Joinville é o grande festival de julho (que começa hoje em Joinville), oportunidade única no ano para experimentar todas as facetas de sua arte. Entretanto, é um delírio que dura onze dias. No restante do tempo, prevalece a dura rotina das aulas, ensaios, preparativos para competições ou a simples dedicação à paixão artística. Sendo um ou outro, o fato é que dançar é uma atividade que na última década voltou a ganhar impulso no dia a dia na cidade, resultando em novos grupos, cursos, eventos, academias e interessados. Se não é a prova máxima, as 34 companhias joinvilenses inscritas na seletiva das mostras Competitiva e Meia Ponta do Festival deste ano — o maior número desde 2006 — são um indicativo dessa onda.
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Mas é apressado julgar que, neste caso, quantidade não significa qualidade. Ely Diniz, presidente do Instituto Festival de Dança, é o primeiro a dizer que o conselho responsável pela seleção dos grupos e coreografias não detectou nenhum trabalho fraco entre os 34 grupos locais inscritos para a Mostra Competitiva e o Meia Ponta (nove grupos foram escolhidos, com 14 coreografias). Ele salienta que isso não é por acaso e que a melhora dos trabalhos joinvilenses acompanha a média nacional. A justificativa é até simples: um maior rigor na avaliação, provocado pelo aumento, ano a ano, de interessados em participar do evento. Em 2016, foram 3,1 mil coreografias enviadas à banca, o dobro do verificado há cinco anos.
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— Quanto mais você é rigoroso, quanto mais você aumenta o grau de dificuldade, mais o pessoal se esforça para vir. Só o fato de o grupo se classificar para dançar no Festival já é um baita reconhecimento — confirma Diniz, ressaltando que o raciocínio também vale para o Meia Ponta e os Palcos Abertos.
— Os grupos aproveitam outros eventos para se prepararem para o Festival. Com certeza, é um termômetro de qualidade para escolas e grupos amadores.
Sheila Melatti, da Escola AZ Arte, identifica pelo menos um acréscimo no cenário local: a maior especialização dos coreógrafos, motivada pela concorrência com profissionais de fora da cidade. Na outra ponta, os conflitos de ideias, a busca por experiências e divisões naturais motivaram o surgimento de novos grupos na cidade em tempos recentes, observa a bailarina e professora, que preferiu o caminho da união de forças, no caso, com o Grupo Fernando Lima.
— Hoje, as parcerias são menos comuns. Uma pena, pois o futuro não prevê o egocentrismo, as alianças é que irão fortalecer a classe. Hoje, somos unidos não só durante o Festival, trocamos ideias o ano todo com grandes grupos do Brasil. Uma troca de ideias e de sabedoria — explica.
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Para o coreógrafo Fernando Lima, que recentemente esteve com seu grupo na Europa, o incremento da qualidade técnica dos grupos de Joinville é notória e acompanha o crescimento do Festival. Na opinião dele, os grupos e escolas não medem esforços ao investirem em aulas, criações e produções para apresentarem na Mostra Competitiva.
— Na verdade, não existe segredo para emplacar inúmeras participações. Existe muito trabalho, estudo, e aprendo muito com o retorno dos próprios jurados do Festival —explica.
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Por falar nisso, Ely Diniz reconhece que prêmios e participações no Festival de Joinville se refletem em mais alunos nas escolas e academias. Se as de Joinville estão cheias, há olhares divergentes. Para Bianca Espíndola, professora de balé clássico do Studio S de Dança, a resposta é sim. De um ano para cá, o número de frequentadores dobrou. Ela observa, inclusive, o maior volume de pessoas mais velhas interessadas em simplesmente praticar a dança, e não necessariamente tornar-se profissional ou competir num festival.
— As pessoas querem se divertir, praticar. É uma atividade física, e mais legal do que ir à academia — opina Bianca, formada pelo Bolshoi e ex-aluna da Escola Municipal de Dança.
— Em 2013, tínhamos uma procura maior. De outubro pra cá, percebo uma queda, mas acho que é devido à questão econômica — interpreta Sheila.
— Mas, sem dúvida, hoje se vê mais a preocupação com a saúde e isso faz com que as academias fiquem mais cheias. A procura ainda é maior na área fitness. Precisamos conscientizar de que a dança é uma forma de ter saúde com divertimento.
Arte acima de tudo
De fato, o prazer de dançar deve ser a motivação principal de quem procura integrar grupos e escolas. Ainda que companhias e bailarinos busquem o seu melhor ao se preparem para concursos, a competição não deve vir antes da arte, opina Bianca.
— A partir do momento que não é feito pela arte, não vale a pena.
É a mesma restrição que faz Elizete Demonti, diretora da Escola Municipal de Ballet, referência no ensino do balé em Joinville, presente em todas as edições do Festival de Dança e merecedora, em 2015, da Medalha Cruz e Sousa, maior reconhecimento entregue pelo governo do Estado.
— Nós formamos bailarinos para a arte, para integrarem companhias, e não para festivais. Se fez muito isso em Joinville — conclui a professora e ex-bailarina.
Da mesma opinião compartilha Fernando Lima. Para ele, não é possível pensar na dança apenas como uma empresa, apesar da necessidade que o artista tem de pagar as contas. Afinal, há a responsabilidade de formar artistas, e no campo didático, estudo, oportunidade e investimentos são tão importantes quanto a troca de experiências.
— As pessoas vivem intensamente os 11 dias de Festival e depois se fecham em suas salas, não compartilham. A união da classe seria de extrema importância. Precisamos olhar com cuidado para nossa arte, somos responsáveis por encantar as pessoas.
Conscientização quanto a pesquisa, troca de ideias e “respirar mais a dança o ano todo, não só se apresentando, mas estudando”, são pontos enumerados por Sheila Melatti que fariam a dança crescer ainda mais em Joinville. Já a falta de experiência e de graduação de parte dos profissionais locais é empecilho na hora de buscar professores para a Escola Municipal de Dança, segundo Elizete, que teve a sorte de compartilhar palcos e salas de aula com mestres como Jair Moraes, Cristina Helena, Ana Botafogo e Cecília Kerche. Uma oportunidade que ela espera oferecer a seus alunos com a criação da companhia de dança da escola, cujo projeto já está pronto.
Se é fato que o cenário da dança vem crescendo em Joinville e, entre outras coisas, pode render conquistas para a cidade em concursos, dois gêneros específicos são verdadeiros “papa-prêmios” no Festival, e não é de hoje: danças populares e danças urbanas. O motivo, nem o presidente do Instituto Festival de Dança, Ely Diniz, sabe explicar.
— Já tivemos discussões no conselho artístico a esse respeito e não chegamos a uma conclusão do porquê Joinville ter ficado tão forte nesses gêneros — garante.
Thiago Moreira, coordenador do Maniacs Crew, grupo que já faturou nove prêmios no evento, verifica que a força das danças urbanas na cidade vem do fato de a cidade ter dançarinos com farta bagagem teórica e prática, adquirido ao longo de anos de experiência. Para ele, grupos recheados de conquistas, como o Fúria das Ruas e o próprio Maniacs Crew, serão seguidos de outros grupos “que estão vindo com um grande conhecimento prático e prometem fazer história também”.
Talvez não seja coincidência que o único joinvilense a ganhar o prêmio de melhor bailarino do Festival (em 2011) venha das trincheiras da street dance. Egresso das duas companhias icônicas citadas acima, Felipe Cardoso já rodou o País dançando e faturando prêmios e hoje tem sua própria companhia, a Nu Monkeys, com quem estará na Mostra Competitiva e nos Palcos Abertos.
— Joinville, hoje, é uma referência (na dança de rua), mas acredito que temos e vamos chegar mais longe dentro de alguns anos. Sou de uma geração nova que foi estimulada desde cedo, vendo vários grupos e pessoas importantes no cenário nacional e internacional se apresentando na nossa frente em todo mês de julho. Isso era o combustível. Inclusive, vejo colegas que começaram na mesma época que eu vivendo bem com a dança hoje em dia. O Festival trouxe grande impacto para várias gerações, sem sombra de dúvida — explica Felipe.
As ressalvas, claro, existem. Moreira cobra um olhar mais atencioso para as danças urbanas, com ações que elevem o nível técnico dos grupos, como workshops e palestras. Na sua opinião, para a cidade se tornar de fato uma referência na área, o trabalho deve ser desenvolvido com regularidade e para além do festival.
— É preciso trabalhar o ano todo em prol do desenvolvimento das danças urbanas, não somente em julho. Alguns grupos e dançarinos se tornaram referência, mas, na minha opinião, a cidade precisa ter mais atividades promovendo as danças urbanas.
Professora do Projeto Dançando na Escola, Elisiane Wiggers ostenta, desde 2008, sete primeiros nas danças populares da Mostra Competitiva. Em 2012, além dos troféus, faturou uma indicação ao prêmio de coreógrafa-revelação do Festival. Claros indicadores da potência do gênero em Joinville e de sua representatividade no grande evento. Crente da evolução da dança de um modo geral na cidade nos últimos dez anos — o que ela credita a uma maior qualificação dos profissionais da área — , Elisiane tenta explicar o interesse por danças populares pelo prisma de seu próprio trabalho, movido por uma paixão pela cultura brasileira que acaba “contaminando” os alunos-bailarinos. Segundo ela, a criação de cada coreografia se baseia em muito estudo e pesquisa histórica.
— Não foi algo proposital, foi algo construído ao longo dos anos — diz a professora.
Tal encantamento pegou de jeito alguns alunos de Elisiane, que, sem idade e tempo para participar do grupo dela, resolveram criar seu próprio núcleo de danças populares. A Cia. de Dança Raízes nasceu há pouco mais de um ano e já tem um Festival de Dança no currículo. Mateus Pedroso, um dos cinco integrantes, confirma que o contexto histórico e cultural das coreografias é um atrativo e tanto para capturar novos praticantes do gênero.
— Quando o professor vai montar um trabalho conosco, ele conta toda a história (da dança), como chegou ao Brasil etc. Então, quem gosta de danças populares se interessa pelo contexto histórico da coreografia — explica o rapaz, que, com a Raízes, voltará ao Festival via Palcos Abertos.
Segundo Mateus, o grupo ensaia de sexta a domingo e tem planos de participar de outros eventos de dança.
— A gente abre mão do nosso final de semana para ensaiar, mas é bem gratificante, porque estamos levando uma coisa nova para o Festival de Dança — conta.
SERVIÇO
O quê: 34° Festival de Dança de Joinville.
Quando: de hoje até 30 de julho.
Onde: Centreventos Cau Hansen, Expocentro
Edmundo Doubrawa, Teatro Juarez Machado, praças, shoppings e outros espaços da cidade.
Quanto: os ingressos para as noites especiais, Mostra Competitiva, Meia Ponta, Mostra Contemporânea e Estímulo Mostra de Dança estão à venda no site oficial www.festivaldedanca.com.br e na sede do Instituto Festival de Dança (Centreventos), de segunda a sexta-feira, das 10h às 12h e das 13h30 às 17h30. A entrada na Feira da Sapatilha e nos espaços públicos é gratuita.
Representantes de diferentes grupos joinvilenses que vão participar do Festival deste ano posaram em um dos palcos da dança para ilustrar esta reportagem
Foto:
Maykon Lammerhirt
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