Itapema FM | 07/09/2015 07h31min
Entre os grandes desafios do artista, criar uma identidade única – aquela que torna sua obra reconhecível mesmo sem assinatura – está no início da lista. Carlos Sorín, cineasta argentino que esteve em Joinville na semana passada, pode celebrar este trunfo. Com uma filmografia premiada, o diretor de 71 anos é dono de um estilo inconfundível que pode ser visto em obras como Histórias Mínimas (2002), O Cachorro (2004) e Filha Distante (2012).
Na contramão do cinema comercial, Sorín não se rende às soluções fáceis dos diálogos explicativos e dos cortes rápidos. Seus filmes são contemplativos, tratam o cenário como mais um personagem – geralmente, as paisagens do Sul da Argentina –, focam nas questões humanas e têm como palavras de ordem a intuição e a simplicidade.
– Em meus filmes, mais importante do que as histórias são os personagens. Trabalho muito os diálogos, os olhares, as textualidades – explica.
Sorín veio a Joinville a convite do fotógrafo Alceu Bett para oferecer quatro dias de aulas com profissionais de audiovisual da região na Galeria 33. Em entrevista ao Anexo, ele contou sobre o processo de criação e avaliou a produção latino-americana, em especial, a de seu próprio país.
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Produção
Filmo muito, faço muitas tomadas. Quanto mais material tenho para editar, melhor. Porque o milagre do cinema ocorre na edição, é ali que nasce o filme. Antigamente, isso era caro, porque tinha que comprar película. Agora, com a tecnologia digital, eu poderia ficar com a câmera ligada o dia inteiro.
Trabalho de não atores
Às vezes, trabalho com gente que não tem experiência em atuação. Então, me dedico para que sejam o mais parecidos possíveis com os personagens, para que não tenham que atuar. Estão fazendo a si mesmos. Meu único trabalho é tirar os medos e as inibições que uma pessoa que nunca atuou diante de uma câmera tem. Assim, é como se eles estivessem ensaiando para estes papéis há 20 ou 30 anos.
Sentimentos humanos
Creio que entre um professor universitário da Sorbonne e um camponês do Equador não há tanta diferença. Os abismos são iguais. Tudo depende de como você conta a história. Eu conto histórias de gente – e sempre conto a partir do ponto de vista de um personagem. A ligação entre o espectador e o personagem é a essência do cinema.
Cinema na Argentina
O motivo de a produção na Argentina estar bem é o mesmo de a produção da Argentina estar mal: se produz muitos filmes, não é tão difícil de filmar. Mas encontrar uma obra-prima é difícil. Reproduzem-se cem, 120 filmes por ano, e não há mercado, não há gente para assistir. A maior parte desses filmes não é vista por mais do que os parentes do diretor e dos atores. Ao mesmo tempo, este sistema dá possibilidade a quem tem talento. E surgem novos diretores realmente muito interessantes. Se não fosse este sistema, estes talentos não apareceriam.
Cinema latino-americano
Tenho uma sensação sobre as filmografias latino-americanas de que há uma relação quase direta entre a potência dos filmes que fazem e a tragédia social em que vivem. O cinema mais interessante da Argentina é o feito depois da ditadura. Dessa noite terrível surge um cinema muito forte. Sinto isso ainda mais claramente no México – é um país açoitado por todo tipo de tragédia, desigualdade social, narcotráfico, terremotos... E tem um cinema de uma potência e uma vitalidade!
Por isso, acredito que há uma relação entre as tragédias de uma sociedade e o cinema que ela faz, é mais comprometido e intenso. O cinema argentino, depois deste auge dos anos 1990, chegou em um momento em que não há mais tantos filmes interessantes, e acho que é porque a Argentina se normalizou como país. Não há mais dramas tão profundos.
Na contramão do cinema comercial, Sorín não se rende às soluções fáceis da direção de um filme
Foto:
calos sorin,galeria 33,residência internacional em cinema
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