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Itapema FM  | 21/03/2015 15h05min

"Um evento mais sobre as pessoas do que sobre tecnologia", diz o diretor de interatividade do SXSW

Hugh Forrest, 52 anos, foi entrevistado para o projeto The Communication (R)Evolution

A contratação saiu graças a um computador, em 1989. Mais especificamente, um Macintosh Plus. Hugh Forrest, 52 anos, entrou no mundo do South by Southwest, hoje maior evento de criatividade do mundo, para fazer um banco de dados. Lá se vão mais de 20 anos de experiência no SXSW, a maior parte como diretor da área que hoje atrai a maioria dos olhares para Austin, no Texas (EUA): a interatividade.

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Ao longo dos 10 dias de festival, a diretora de Inovação e Linguagem do Grupo RBS, Flavia Moraes, coletou novas entrevistas para o estudo The Communication (R)Evolution. Nomes como o de Joshua Klein, tecnólogo, escritor e hacker, Elliot Kotek, editor-chefe da NotImpossibleNow.com, e Devon Smith, diretora de Analytics e Social Media na agência Threespot, entraram na pauta. Forrest concedeu entrevista à Flavia na quinta-feira. Confira o bate-papo, que também estará em vídeo em thecommunicationrevolution.com.br a partir deste domingo.

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ENTREVISTA

Você pode falar um pouco da sua trajetória?

Nasci e cresci em Austin, cursei uma faculdade pequena em Ohio, onde me graduei em Inglês. Sempre quis ser um escritor. Ainda quero ser um escritor quando eu crescer. Voltei a Austin após a formatura e fundei um jornal alternativo — mais pela periodicidade do que pela orientação política. Meu pai me convenceu a comprar um Macintosh Plus para incrementar meu trabalho. Reduzimos muito os custos. Foi o início da era do desktop na área editorial. Eu conhecia o pessoal do Austin Chronicle, éramos concorrentes amigáveis. Sabia que eles estavam trabalhando em um evento chamado South by Southwest (SXSW). Me procuraram duas semanas antes da segunda edição e perguntaram: "É possível colocar nosso banco de dados em um computador?". "É para isso que servem os computadores", respondi. Houve uma pequena pausa, e então me disseram: "Que tal o seu computador?". Fui contratado porque tinha um computador. Se você pensar no seu iPhone ou no seu iPad, um Mac Plus era mais ou menos um milésimo da capacidade do que temos hoje. Esse foi o começo da minha história de mais de duas décadas no SXSW.

Eu tive um Mac Plus. Imagine isso no Brasil nos anos 1980... Era praticamente um alien. Lembro que pulava da cama, ligava a máquina e só depois ia escovar os dentes, levava horas para inicializar.

Mas parecia rápido na época, não é?

Talvez porque estávamos aprendendo uma nova língua. O que é o SXSW depois de todos esses anos?

Conseguimos trazer palestrantes de maior renome, bandas de maior renome, marcas de maior renome. Mais pessoas — hoje o festival é muito maior do que quando começou. O foco em reunir pessoas muito criativas, inovadoras, que podem nos inspirar com a forma como interpretam o mundo e como conduzem suas carreiras, com suas impressões sobre a arte, isso tudo mudou muito desde que o evento começou, em 1987. Enquanto conseguirmos focar em criatividade, inovação e inspiração, continuaremos a ter um evento atraente.

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E para você, qual foi o grande aprendizado?

Contamos muito com a comunidade para produzir nosso conteúdo. Muito do aprendizado é simplesmente lembrar que o público, muitas vezes, sabe bem mais do que nós. Além disso, trabalhamos bastante com os detalhes, investimos tempo, meses nisso.

Interatividade costumava ser a menor parte do evento. Transformou-se na maior?

É a maior em termos de participação da indústria. A música ainda é a porção mais significativa, se você pensar em todas as bandas e em todos os consumidores que vêm à cidade. Mas na perspectiva da indústria e do número de sessões, interatividade é a maior, com folga. Isso reflete o quanto a tecnologia mudou tudo na última década. Há poucos negócios, organizações ou entidades que não têm de interagir com a tecnologia. Dada a escala do evento, podemos oferecer muito para muitas pessoas diferentes.

É possível dizer quando exatamente "virou"?

Batalhamos muito nos primeiros 10 anos. Fizemos algumas coisas certas e muitas coisas erradas. Percebemos que as coisas certas atraíam muita gente. Começamos a observar um crescimento positivo a partir de 2004. Tivemos um ciclo de 10 anos de crescimento.

Acho que os dois maiores componentes desse crescimento foram mídias sociais e startups. Estávamos no lugar certo e na hora certa para a revolução das mídias sociais. Entramos muito cedo no ramo das startups, que teve uma explosão. Em 2007, o fato de o Twitter ficar conhecido e fazer sucesso mudou as coisas para nós (a rede social estourou no SXSW daquele ano). Muito mais startups e investidores queriam estar no SXSW, impulsionando nosso crescimento. Claro que isso apresenta outros desafios. Tentamos focar menos em números e mais na qualidade da experiência.

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Que tipo de concessão vocês tiveram de fazer para tornar o festival mais lucrativo?

Espero que não tenhamos nos comprometido. Por mim, tudo bem se uma corporação quiser patrocinar o festival, desde que possamos continuar tendo pequenas organizações não governamentais envolvidas. Tudo bem se Rand Paul falar sobre sua visão da política do Tea Party, desde que Edward Snowden fale, no mesmo dia, sobre como a invasão de privacidade bagunçou este país. Quanto maior a diversidade de vozes, mais interessante.

The Comunications (R)Evolution aponta que, graças à tecnologia houve uma retomada de conceitos há muito esquecidos, como verdade, confiança... O que você acha?

A tecnologia nos ajuda com muitas coisas. Basicamente, é apenas mais uma ferramenta. Sempre digo que somos mais um evento sobre criatividade do que tecnologia. Nosso objetivo é reunir pessoas muito, muito criativas. Muitas trabalham com tecnologia e expressam sua criatividade através da tecnologia. São pessoas autênticas, reais, verdadeiras, e isso atrai o público. Quanto mais pudermos exibir isso, mais fascinante o evento se torna.

Você é um dos curadores do festival.

Acho isso questionável. O que importa mais não somos nós, mas a comunidade lá fora que criou isso. Tentamos apenas manter esse barco no rumo certo. Quanto mais conseguirmos nos comunicar e engajar essa comunidade, melhor fica o evento.

Como funciona o PanelPicker?

É uma interface que encoraja qualquer um que acesse a internet a fazer sugestões de apresentações, painéis etc., e as pessoas podem votar nessas ideias. Isso é muito útil. Permite que experts de qualquer área sejam de fato experts, em vez de nós nos apresentarmos como especialistas, e nos mostra o que a comunidade mais está interessada em ouvir. Também nos provê com um mecanismo para comunicação e engajamento com a comunidade. Quanto mais você se engaja com sua audiência, mais forte você se torna.

Como é a relação entre o festival e a cidade de Austin? Há chance de o evento chegar a outros países em versões pocket? Brasil, por exemplo.

O festival começou independentemente da cidade. A cidade não investiu um monte de dinheiro. Empreendedores, há 25 anos, decidiram que era uma boa coisa a se fazer. O evento aumentou muito até hoje. Trabalhamos de forma muito próxima com a administração municipal sobre vários assuntos: bloqueios de ruas, presença de policiais para fazer a segurança etc. Pensamos muito sobre isso: poderíamos fazer coisas semelhantes em outras cidades? Austin é uma cidade muito criativa, e muito dessa criatividade é o que faz o SXSW tão atraente. Não sei se um evento como esse poderia ser realizado em outra cidade. Austin tem um DNA criativo único, e o SXSW divulga isso muito bem.

É uma cidade pequena, segura, onde se pode caminhar, e tem uma cultura incrível.

Outro ponto importante a ser mencionado: no mês de março, quando está começando a ficar mais quente, as pessoas gostam de vir para cá, principalmente quem mora na costa leste dos EUA, onde está frio. É uma junção de elementos: boa comida, boas pessoas, bom clima, boa conversa.

Quais foram os grandes destaques desta edição?

Uma das mensagens que divulgamos de forma mais eficiente é a da diversidade e da inclusão. Algo em que trabalhamos por um longo tempo, mas que, por algum motivo, ganhou mais atenção este ano. Precisamos de mais mulheres em tecnologia, mais negros, mais latino-americanos. Que esse ecossistema seja mais inclusivo para tornar-se mais forte. Neste ano, três dos cinco grandes palestrantes eram mulheres. Tivemos muitos negros e latinos também. Acabamos de tocar a superfície do que podemos e devemos fazer aqui. Espero que isso possa se espalhar pelo mundo.

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Milhares de pessoas vêm a Austin em busca de conhecimento e inspiração, mas, enquanto estão aqui, vivem em uma espécie de "bolha". Qual o verdadeiro impacto do festival, no momento em que retomam a vida em suas cidades?

O que levam daqui é inspiração. Elas encontraram alguém, ouviram alguém, conversaram com alguém que lhes deu uma nova ideia. Levam essa criatividade para o lugar de onde vieram, têm um pouco mais de energia para investir no que estão trabalhando. É uma das coisas que fazemos melhor.

Como você vê o futuro próximo, daqui a cinco ou 10 anos?

Há muitas mudanças em progresso, desde a área de transportes — com carros autônomos —, passando pela da medicina e até a de realidade virtual. Por mais que tenhamos todas essas inovações em tecnologia, um evento como o SXSW mostra que o que as pessoas querem, ao final do dia, é se conectar com outras pessoas em tempo real. Você pode falar o quanto quiser sobre tecnologia, mas a mágica de um evento como esse é permitir que elas façam conexões face a face. Ainda não temos a tecnologia capaz de mudar isso. Há algo especial em poder sentar com alguém para tomar um café. Você pode olhar o outro nos olhos, saber se quer trabalhar com ele, conhecer suas impressões. É isso que torna o SXSW tão especial. É um evento mais sobre as pessoas do que sobre tecnologia.

Você deve saber que o SXSW está crescendo muito no Brasil. Já somos o quarto ou quinto país em número de inscrições.

Fiz duas palestras no Brasil nos últimos três anos e, sim, existe muito interesse no festival. Vou adorar ver esse pipeline continuar crescendo. Um dos aspectos mais gratificantes é que a participação internacional está cada vez maior. Você vem a Austin e encontra pessoas incríveis de Ruanda, da China, tudo num intervalo de uma hora. Não é genial?

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