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Itapema FM  | 19/02/2015 10h17min

Thiago Momm comenta o livro Adiós a la Universidad, do espanhol Jordi Llovet

Autor lembra o quanto as humanidades têm para dar e por que deveríamos cuidar melhor delas

Atualizada às 10h17min Thiago Momm  |  thiagomomm@gmail.com

Sem coleguismo

Enquanto sertanejamos nosso gosto, semipensamos no Whatsapp, precificamos todas experiências, nos padronizamos de boa vontade, planejamos carreiras só com base no dinheiro, um livro como Adiós a la Universidad - El Eclipse de las Humanidades, do catalão Jordi Llovet (R$ 79,60 a versão espanhola em livrariacultura.com.br), só pode soar o manifesto de um planeta distante.

A problematização do declínio das humanidades é manjada, mas raras vezes tão franca, erudita e bem estruturada quanto no livro de Llovet, um catedrático de Literatura Comparada da Universidade de Barcelona, jubilado há alguns anos.

Livre das limitações do coleguismo e do carreirismo, ele coloca os dedos em muitas feridas: nas cretinices do politicamente correto; nas teses de doutorado estéreis, de temas esdrúxulos; na "ignorância enciclopédica" (Josep Pla) de alunos; na "baixeza e ruindade" de departamentos universitários, com reuniões parecidas "ao campo de Agramante ou a uma permuta ou a um regateio de bagatelas em um bazar oriental".

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Llovet traduziu livros em diversas línguas e é um raro polímata ainda em circulação por aí. Isso fez dele um dos professores de Literatura mais respeitados da Espanha. Não é todo dia que alguém assim escancara tanto. Estudantes, diz, fazem teses sobre "qualquer minúcia supérflua, tediosa e impertinente" que "ao próprio professor sempre deu preguiça estudar por conta própria". Assim, os alunos perdem "uma boa porção do melhor tempo da sua vida em uma banalidade". A tese, lida "por cima" pelo tribunal, é uma "comediografia".

Claro que o eclipse das humanidades conta também com fatores externos. Elas "terminarão se parecendo à informação jornalística das últimas notícias" porque estamos sob uma cultura do "tempo-zero", da "tirania do momento", conceito que o professor norueguês Thomas Hylland Eriksen usou para afirmar que o passado e o futuro entendidos como categorias mentais estão ameaçados. Alunos e sociedade agora veem a história como nada além da soma não articulada dos momentos atuais. Isso afeta diretamente as humanidades porque, claro, elas dependem do acúmulo de conhecimento através dos séculos. Desanimados, professores europeus perdem a devoção "pelas conquistas da história cultural e espiritual do continente".

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Outra crítica de Llovet é o excesso de especialização, nosso costume crescente de entender a árvore isoladamente em relação ao bosque. Já o polonês-alemão Schleiermacher (1768-1834) alertava que isolar as "interrelações mais vivas" entre conhecimentos e ciências só pode resultar "na asfixia da liberdade da educação superior e de toda sorte de espírito científico" - logo, resultar no pior dos pragmatismos.

O livro mescla essas considerações a sagas acadêmicas pessoais e à história remota e recente das universidades europeias. Llovet não é um crítico inerte, tendo participado ativamente de movimentos da universidade na sua época de aluno e nos seus últimos anos como professor. Além disso, a própria qualidade das críticas lembra o quanto as humanidades têm para dar e por que deveríamos cuidar muito melhor delas.

ANEXO
Divulgação / Divulgação

Llovet traduziu livros em diversas línguas e é um raro polímata ainda em circulação, o que fez dele um dos professores de Literatura mais respeitados da Espanha
Foto:  Divulgação  /  Divulgação


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