Você sabe o que esperar de Frank Sinatra (1915 – 1998). Nada menos do que a potência vocal inconfundível, a interpretação arrebatadora. E o que esperar de Bob Dylan cantando Sinatra? Essa é a pergunta que chega com Shadows in the Night, 36º disco de estúdio do músico que fará 74 anos em maio.

Nos últimos álbuns, muito se falou sobre a condição vocal do bardo. O surpreendente é que agora Dylan mostra sua melhor voz em anos. Para interpretar 10 canções do chamado Great American Songbook eternizadas por Sinatra, ele deixou de lado a rouquidão e os rosnados quase inaudíveis dos últimos trabalhos para se assumir como um crooner com garganta afiada.

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Dylan não tem a mesma força vocal do "The Voice", mas se sai bem ao cantar em volume mais baixo, em andamentos mais lentos do que os de Sinatra. E isso funciona também porque, em lugar das orquestrações que amparam a voz do "Blue Eyes", Dylan reuniu os músicos com quem tem tocado nos últimos anos para uma gravação sem excessos, com instrumentação mínima.

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A voz de Dylan é acompanhada por arranjos bem diferentes das versões cantadas por Sinatra. Além de guitarras, baixo acústico e quase nenhuma percussão, destacam-se os sopros discretos e o pedal steel de guitarra que dão certo tom sombrio, parecendo um disco torto, fora de rotação, mas incrivelmente belo e assombroso ao mesmo tempo.

– Quando você começa a cantar essas músicas, Frank tem que estar em sua mente. Porque ele é a montanha. E essa é a montanha que você tem que subir, mesmo que você só tenha uma parte do caminho – disse Dylan à AARP The Magazine, na única entrevista que concedeu sobre o disco.

Dylan, aliás, tentou fazer com que as músicas soassem ainda mais antigas do que as de Sinatra, registradas entre os anos 1940 e 60. Recrutou seus músicos para uma sessão em que as faixas foram gravadas ao vivo na mesma ordem em que estão no álbum. O resultado são 35 minutos de uma sonoridade crua e rústica.

– Ao longo dos anos, ouvi essas músicas (as cantadas por Sinatra) serem gravadas por outras pessoas. E eu sempre quis fazer isso – disse Dylan à AARP The Magazine.

Em 2009, com o disco natalino Christmas in the Heart, Dylan já havia se aventurado em repertórios do passado para além de sua habitual linha country/folk. A verdade é que, desde Time Out of Mind (1997), ele vem lançando álbuns sobre sua relação com a velhice, como um homem fora do tempo lidando com memórias e fantasmas do passado. Pode ser, mas o certo é que Dylan parece cada vez mais consciente de seu próprio tempo.

Shadows in the Night
De Bob Dylan
Sony Music, 10 faixas, R$ 25 (em média)
Cotação: 5 de 5