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Itapema FM  | 19/01/2015 09h59min

Artistas catarinenses fazem um verdadeiro malabarismo para sobreviverem de editais

Grupos enfrentam rígidas exigências nos processos de distribuição de recursos

RAFAELA MAZZARO  |  rafaela.mazzaro@an.com.br

Em um ponto, os artistas de Santa Catarina parecem concordar, não importa a área em que atuem: já não é mais possível viver sem os editais de apoio à cultura. Se por um lado a consolidação do sistema de distribuição de verba para projetos demonstra que o setor é reconhecido como necessidade básica e, portanto, merecedor de fatia da arrecadação de impostos, por outro, cria um ciclo de dependência. Enquanto o público se acostuma a receber eventos praticamente de graça, os artistas vão abandonando aos poucos a ideia de sobreviver apenas de bilheteria.

O resultado vem em forma de agonia para quem vive de cultura no Estado. O sentimento é motivado principalmente pela inconstância do repasse de verba para a área. A edição 2014 do Edital Elisabete Anderle, principal via de incentivo estadual em Santa Catarina, encerra as inscrições somente em 11 de fevereiro, prazo que deixou muitos proponentes – que imaginavam colocar em prática suas iniciativas no ano passado – a ver navios.

Os artistas joinvilenses viveram agonia semelhante em 2014, quando o sistema municipal demorou para divulgar o resultado dos contemplados do ano: a lista só foi divulgada em dezembro e a verba ainda não foi disponibilizada. O Fundo Estadual de Incentivo à Cultura (Funcultural), ainda pouco transparente em seu processo, também oferece insegurança no repasse: prova disso foi o adiamento da realização do 18º Festival Catarinense de Teatro, que ocorreria no ano passado, mas ficou para o período de 20 a 28 de março de 2015.

Quem se mantém exclusivamente com editais, como é o caso da Cia. de Dança Cena 11, de Florianópolis, vive na corda bamba, mesmo sendo um grupo com trajetória reconhecida nacionalmente. Isso porque nem sempre os projetos aprovados dão conta de subsidiar a manutenção da estrutura do grupo, que mantém uma pesquisa permanente em dança. Com as dificuldades, a companhia – uma das mais antigas e famosas da Capital – chegou a atrasar em cinco meses o salário dos bailarinos em 2014.

– Hoje, nenhum grupo sobrevive só de bilheteria, mesmo os grandes, como a Cia. Deborah Colker – avalia o diretor do Cena 11, Alejandro Ahmed, citando a companhia carioca reconhecida internacionalmente, que é patrocinada pela Petrobras.

Grupos menores, segundo o presidente da Federação Catarinense de Teatro (Fecate), Cassio Correia, acabam restringindo a atuação somente ao período de execução dos projetos aprovados. Eles montam o trabalho, realizam as apresentações previstas no documento e, após a conclusão da prestação de contas, a ação adormece.

– A busca de uma solução para o fato de os projetos terem um percurso momentâneo está muito presente nas discussões entre os artistas – conta.

:: Proponentes precisam enfrentar rígidas exigências e limitações impostas pelo processo de distribuição de recursos via editais de cultura

Mesmo com restrições, os editais de incentivo à cultura continuam sendo a forma mais democrática de distribuição de renda para a área, na avaliação da gestora cultural Mariane Feil. Delegada do Colegiado Nacional de Teatro, com passagens pela curadoria do Prêmio Myriam Muniz da Funarte, ela avalia que o direito de acesso aos recursos públicos é uma conquista que demostra a mudança de visão em relação à importância social do setor:

– A arte também melhora a vida das pessoas, assim como a saúde, a educação. Os editais são uma forma de levá-la a alcançar a sociedade.

Submeter processos criativos à burocracia dos editais é outro fator que incomoda os artistas catarinenses. Pita Belli, coordenadora do Festival Universitário de Teatro de Blumenau, chega a compará- los a licitações voltadas para empresas de prestação de serviços, tamanha a exigência.

– Falta a compreensão de que se está lidando com arte, algo subjetivo – diz.

Como cada edital apresenta especificações diferentes, a inscrição requer atenção dos proponentes e o máximo de descrições. Inevitavelmente, o primeiro detalhe observado acaba sendo o valor-teto previsto para a categoria que se pretende contemplar.

– É como se a gente tivesse de limitar uma ideia dentro de um orçamento – analisa Alejandro Ahmed, diretor da companhia de dança Cena 11, de Florianópolis.

Ser objetivo em relação à proposta e reunir a documentação necessária também não são tarefas fáceis. Tanto que, há três anos, Mariane Feil passou a oferecer consultorias particulares e oficinas, quando percebeu que as dúvidas dos artistas prejudicavam a realização de grandes projetos.

– Às vezes, uma ideia genial não é aprovada porque faltaram informações, não estava bem escrita – explica.

Ela aconselha que, antes de tudo, os proponentes leiam com atenção todos os itens do edital e, como exercício, criem o hábito de colocar no papel todas as suas iniciativas, mesmo aquelas que não forem submetidas à busca de recursos públicos.

:: Alternativa está na união

Se as limitações e burocracias dos editais não são atrativas, há outras saídas para se colocar um projeto cultural de pé, garante Helga Tytlik, proprietária da Tucunaré Desenvolvimento Cultural, sediada em Joinville. A empresa oferece consultoria e palestras com foco na economia criativa.

– Não se pode tirar a responsabilidade do governo em relação à cultura, mas os artistas não podem depender apenas desta fonte – defende.

A abordagem da Tucunaré nem sempre é recebida com bons olhos pela classe artística, já que trata a cultura como um produto que pode impactar no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro como qualquer outro negócio.

– Ainda há muito resistência, mas a cultura também é uma forma de ganhar a vida. Então por que não pensar nisso? – defende Helga.

O conceito de economia criativa ainda é recente e está em construção, mas prevê os ciclos de criação, produção, difusão, circulação e consumo de bens e serviços simbólicos. Ou seja, tem como principal processo o ato criativo e entende que este também gera empregos e riquezas para o país. Para Helga, não existe fórmula para executar projetos por meios alternativos, mas a saída pode estar muito próxima da união de forças entre público-privado ou comunidade- artistas, como as associações e cooperativas culturais.

:: EDITAIS ABERTOS

Ministério da Cultura


- Apoio à produção audiovisual afro-brasileira. Inscrições até 30 de janeiro
- Prêmio Funarte de Dança Klauss Vianna. Inscrições até 19 de janeiro
- Modernização de Museus: Microprojetos e Pontos de Memória. Inscrições até 3 de fevereiro
- Prêmio de Pesquisa Memórias Reveladas. Inscrições até 27 de fevereiro
- Programa Brasil de Todas as Telas, para a seleção de um projeto de produção independente para televisão em Florianópolis. Inscrições até 2 de fevereiro

Fundação Catarinense de Cultura

- Elisabete Anderle. Inscrições até 11 de fevereiro

Municipal

- Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Itajaí. Inscrições até 21 de janeiro

Nacional

- Programa Petrobras Distribuidora de Cultura. Inscrições até 30 de janeiro

A NOTÍCIA
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