Notícias

Itapema FM  | 25/09/2014 10h02min

Um animal diferente

Colunista Thiago Momm fala sobre a influência da literatura nas séries de TV americanas

Atualizada às 10h02min Thiago Momm  |  thiagomomm@gmail.com

Existe um novo animal literário por aí: a série ambiciosa de TV americana. Faz tempo que uma literatura mais comum inspira séries. O que é novo, como notou a revista The Atlantic em 2012, é a alta qualidade: The Wire seria Charles Dickens; Mad Men, John Cheever; Friday Night Lights, John Steinbeck. Antes, na virada do milênio, Os Sopranos era uma exceção.

Leia também:
Fabiano Moraes: conheça o trabalho da cantora Helena Sofia
Curta a página do caderno Anexo no Facebook

As influências são fortes, mas o resultado é específico. "Essas séries não são romances visuais, tampouco filmes de 50 horas", diz a Atlantic. "São um tipo completamente diferente de animal, infinitamente mais reativo e espontâneo, que aprendeu a imitar romances, a copiar virtudes romanescas, a sugerir uma visão ampla ou uma afirmação definitiva que não estão exatamente ali".

Para o escritor Salman Rushdie, falando ao jornal inglês The Telegraph, a TV está unindo "o melhor dos dois mundos".

A influência da literatura aprofunda temas, tramas e personagens. As séries com longos episódios são ideais para isso. Terminando em 2015, como previsto, Mad Men vai ter somado mais de 70 horas em 91 episódios. É tempo suficiente para ler os cinco romances de John Cheever, ou todos os seus contos.

Para uma série em que os capítulos funcionam mais como soma do que como exibição avulsa, é tempo suficiente para construir um protagonista como Donald Draper, que fazendo o caminho inverso entraria perfeitamente em um grande romance. O prolongamento de Mad Men matiza traços gerais da sua personalidade em inúmeras circunstâncias específicas. Draper se revela um gênio publicitário falível; um machão que pede uns tabefes para uma garota de programa; um outsider muitas vezes desconfortável tanto entre os caretas como entre os liberais; um homem que assombra pela autoconfiança, mas não evita que ela se metamorfoseie em falta de controle.

>> Leia outras colunas de Thiago Momm

Como rabiscou Scott Fitzgerald ao produzir seu último romance, o inacabado O Último Magnata, "ação é personagem". Tomado literalmente, isso tornaria os personagens do Vin Diesel insuperáveis, mas o que Fitzgerald quer dizer, ou pelo menos o que O Último Magnata prova, é que ações bem selecionadas revelam uma personalidade até mais do que os melhores insights psicológicos.

Espalhar essas ações por vários anos, claro, só ajuda. Mad Men aproveita a sua duração para nuançar vários personagens além de Draper e desenvolver temas como publicidade, feminismo, política e contracultura nos anos 1960.

Matthew Weiner, o criador da série, já enfatizou várias vezes a dívida com John Cheever. "A ficção de Cheever", ele disse para a revista The Paris Match, "tem uma voz cheia de ironia e comédia e dor que, em algum nível, eu sempre tento emular". Cheever também é a matriz de alguns temas, como o casal dos subúrbios americanos. Nesse aspecto, Richard Yates, autor de Revolutionary Road (1955), romance com um casal central bastante associável ao da série, também parece uma referência, mas Weiner garante só ter lido o livro mais tarde. É um livraço e é sobre ele que escrevo na semana que vem.

ANEXO
Sintonize a Itapema em Florianópolis 98.7, em Joinville, sintonize 95.3

Grupo RBS Fale Conosco | Anuncie | Trabalhe no Grupo RBS - © 2009
clicRBS.com.br • Todos os direitos reservados.