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Itapema FM  | 19/09/2014 13h41min

Morre crítica de dança Suzana Braga, coautora de livros sobre o Festival de Dança de Joinville

Ex-bailarina lutava desde 2010 contra uma doença degenerativa

A dança perdeu uma de suas vozes mais apaixonadas. A jornalista Suzana Braga, coautora de duas publicações sobre o Festival de Dança de Joinville, morreu na noite desta quinta-feiram no Rio de Janeiro. Ela lutava desde 2010 contra uma doença degenerativa.

Suzana foi bailarina do Theatro Municipal do Rio de Janeiro e professora na Academia Tatiana Leskova, no Teatro Tablado, no Núcleo de Dança Contemporâneo, na Escola Superior de Propaganda e Marketing e no Balé Stagium (SP). Também atuou como coordenadora artística e diretora de produção do Balé Contemporâneo do Rio de Janeiro e dirigiu o Balé Teatro Guaíra de 1999 a 2003.

Como crítica de dança, deu uma importante contribuição para o Festival de Dança de Joinville, escrevendo para o caderno especial do evento em "A Notícia". Em parceria com o jornalista Joel Gehlen, Suzana participou da produção dos livros comemorativos do 15º e 30º aniversários do Festival de Joinville.

Também lançou os livros Ana Botafogo - Na Magia do Palco e Tatiana Leskova - Uma Bailarina Solta no Mundo — este último, com edições lançadas na Inglaterra.

A bailarina Eliana Caminada, que também atuou como jurada e conselheira no Festival de Dança de Joinville, lembra com carinha da amiga. Elas se conheceram ainda na adolescência e seguiram juntas até os últimos dias de Suzana.

Ela recordou um pouco da vida de Suzana em entrevista para o Anexo:

Minha história com Suzana é de menina: eu tinha 14 anos e ela 16 quando nos conhecemos. Na realidade, a conheci antes, porque a vi dançar em um festival de dança em Curitiba organizado por Pascoal Carlos Magno. Mas foi quando ela veio para o Rio de Janeiro e passou na audição para o corpo de baile do Theatro Municipal do Rio que ficamos amigas. Naquele tempo, era muito difícil permanecer no Rio esperando enquanto a papelada era resolvida, e o salário também não vinha. Então, era um tempo de dificuldades, e Suzana não tinha condições financeiras para se manter sozinha, por isso foi morar na nossa casa.
Meus pais gostavam muito dela, erámos em cinco mulheres em um quarto: eu, minhas três irmãs, Suzana e a cachorrinha. Entre indas e vindas, ela morou conosco por muito tempo e sentia como se fosse a família dela também.
Suzana sempre foi inteligente, sagaz, tinha um humor quase ferino. Era uma personalidade, uma mulher do mundo da dança.
Até que ela viveu a primeira tragédia de sua vida: tinha uns 18 anos quando levou um tombo nas escadarias do Theatro Municipal e ficou com uma hérnia. Passou por uma cirurgia mal sucedida, que levou a outra cirurgia e a uma sucessão desastrosa. NA verdade, Suzana foi vítima de erro médico e ficou com a perna atrofiada. Não pode mais dançar.
Vivenciamos tudo isso, do tombo, das cirurgias, o colete de aço pós-cirúrgico... Ela ficou na casa do meu marido [o também bailarino Eric Valdo], que na época morava com Aldo Lotufo [morto na quarta-feira, 17, aos 89 anos], quando se acidentou.
Depois Suzana foi dar aulas de balé na escola de Tatiana Leskova — tempos depois ela seria sua biógrafa — e ainda teve um grupo de balé. Ela adorava coreografar, porque Suzana era talentosa demais.
Então ela foi viajar — ela viajou muito, mas sempre voltava lá para casa. E passou a escrever críticas que eram cheias de sabedoria, mas às vezes eram muito duras, porque ela dizia verdades que as pessoas não estavam acostumadas a escutar. Foi trabalhar no Jornal do Brasil e e a viajar pelo País. Aí começou o Festival de Joinville e isso foi uma história na vida dela. Ela adorava o Festival, era o mundo dela. Fez grandes amigos, o Ely Diniz, o Joel Gehlen.
Hoje é um dia muito difícil para mim e para o meu marido. Perdemos dois grandes amigos, o Aldo e a Suzana. Dissemos que o Aldo não aguentou e levou Suzana com ele, porque fomos juntos até o fim da vida.

Eliana Caminada — bailarina e professora.

Uma defensora da verdade

Profissionais da dança e amigos lembram da jornalista como alguém que, acima de tudo, prezava pela honestidade — mesmo que isso lhe contabilizasse o rancor de alguns bailarinos citados em suas críticas publicadas no caderno Anexo e no suplemento especial AN Festival. Com isso, foi uma das colaboradoras por um Festival de Dança de Joinville mais empenhado em crescer tecnicamente.

Confira alguns depoimentos:

Suzana estava sofrendo muito, pois sua doença não afetou seu raciocínio, sua sagacidade. Eu a conheci há cerca de 40 anos, era bailarino e ela era crítica de dança: Suzana foi a maior crítica de dança do Brasil. Começou a publicar no JB na época da ditadura, sempre falou tudo e era odiada por uns e adorada por outros por causa disso.
Suas críticas eram certeiras, afinal, ela era muito inteligente, havia estudado muito, viajou, aprendeu muitos idiomas e se especializou em análise do movimento.
Ela começou a ir ao Festival ainda na época da dona Albertina [Tuma, primeira organizadora do Festival de Joinville]. Não me esqueço do êxtase que era chegar para as apresentações, ainda na época do Ginásio [Ivan Rodrigues] e encontrar o jornalzinho Na Ponta dos Pés nas cadeiras. Todo mundo ia direto para a coluna de Suzana. Ela sempre analisava todas as apresentações, mesmo que das companhias convidadas.
Nossa convivência aumentou quando trabalhamos juntos no Balé do Teatro Guaíra. Atuei com ela das audições às criações coreográficas. Suzana recolocou o Guaira no mapa. Ele estava passando por uma fase muito difícil, mas ela fez os contatos, fez a produção... Era muito audaciosa, não baixava a cabeça para ninguém.


Tíndaro Silvano — bailarino e coreógrafo

Eu acompanho o trabalho da Suzana desde 1994, 95, quando comecei a trabalhar na assessoria de imprensa do Festival e ela vinha como crítica de dança. Depois, nos encontramos outras vezes, eu já coordenando o evento e ela como jurada e como conselheira artística.
A Suzana era uma pessoa com a genialidade à flor da pele. Não tinha papas na língua, era muito sincera e se fazia valer da verdade. Muitos diziam que ela tinha um gênio difícil, mas quando convivemos mais de perto, eu assisti, sempre com muita admiração, como ela se entregava, porque ela tinha muito conhecimento. Pude entender porque era tão voraz: era pelo bem dos outros. Suzana dizia: "Eu preciso falar o que penso porque eu preciso ser honesta".
É claro que, em uma grupo de trabalho, isso gera divergências. Mas Suzana também tinha muito bom humor, era muito sagaz e inteligente. Uma grande perda — aliás, a dança perde mais um dos seus grandes nomes.

Iraci Seefeldt — jornalista e produtora cultural.

Faz muito tempo que conheci a Suzana — desde a época em que o Festival ainda ocorria na Casa da Cultura e ela vinha como crítica. Suzana teve vários momentos dentro do Festival de Joinville: passou pela curadoria artística, foi jurada, fez análises das danças e fez parte de uma companhia convidada, quando dirigiu o Balé do Teatro Guaíra.
Era uma verdadeira profissional, uma pessoa muito culta. Suzana foi referência não só para o Festival de Dança, mas para todos que tiveram contato com ela.

Vera Nascimento — coordenadora artística do Festival de Dança de Joinville.

Conheci Suzana em 1998, no 16º Festival, quando ela veio como crítica e eu estava atuando na produção. Era muito exigente com os grupos, os bailarinos e os coreógrafos e, às vezes, as pessoas a olhavam com mau-humor. Mas ela foi super importante e deu uma grande contribuição ao evento. Ao ser sempre muito crítica, ela colaborou com o fortalecimento do Festival.

Victor Aronis — coordenador-geral do Festival de Dança de Joinville.

Conheci Suzana em reuniões de planejamento e fechamento do AN Festival, suplemento de "A Notícia" em que ela escrevia suas críticas após assistir atentamente a cada noite de apresentações do Festival de Dança de Joinville. Bailarinos, coreógrafos, produtores e donos de companhias liam suas críticas com profundo respeito. Como repórter que pouco entendia sobre a arte, buscava nela as informações históricas, os exemplos que vinham do resto do País e do mundo. Boa parte do que aprendi sobre dança tem sua contribuição.

Leandro Junges - repórter especial de "A Notícia"


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