A vida de Donato era olhar para a linha do horizonte. Atento ao mar da Praia do Futuro, em Fortaleza, ele se confundia ao destino do lugar, que nunca tornou-se o que o nome criado por especulação imobiliária prometia. Da mesma forma, Donato esperava. É neste “mundo comum” que o herói do novo filme de Karim Aïnouz é apresentado.

Vivido por Wagner Moura, o guarda-vidas finalmente vê seu mundo ser transformado quando, pela primeira vez, tem a experiência de não conseguir salvar uma vítima de afogamento. De forma traumática e avassaladora, ele é retirado da inércia e levado a iniciar uma jornada de autodescobrimento ao se envolver com o amigo da vítima, o piloto alemão Konrad (vivido por Clemens Schick).

Praia do Futuro estreia hoje em circuito nacional. A exemplo de outros filmes de Karim, retrata a busca pela identidade em viagens de seus protagonistas, seja em fugas como a de O Céu de Suely, ou em peregrinações pela metrópole, como em O Abismo Prateado. Aqui, Donato deixa a Praia do Futuro, a mãe e o irmão mais novo, Ayrton, e parte para a Alemanha ao lado de Konrad.

– Não acho que tenha sido uma decisão deliberada, consciente mas, sim, olhando para trás, eu percebo que utilizei este elemento intensamente. É um assunto que me interessa muito, estes personagens inquietos que não se submetem. Isso é muito bonito e muito humano, a questão da jornada do herói – avalia o cineasta.

Os heróis, aliás, estão imensamente inseridos no filme. Depois de tantos filmes com a câmera na mão, ele ansiava em falar de super heróis como os dos filmes americanos. Assim, apelidado pelo irmão, Donato transforma-se no Acquaman, Konrad vira o Motoqueiro Fantasma e o próprio Ayrton é “batizado” como Speed Racer.

E é na busca pelo antigo herói que, oito anos depois da partida de Donato do Brasil para a Alemanha, Ayrton faz o mesmo percurso, balançando a nova vida que o ex-guarda-vidas havia criado para si mesmo. Tudo isso embalado por Heroes, de David Bowie, música-tema que embala uma das cenas mais icônicas de Praia do Futuro.

– Esta foi uma ideia na hora do roteiro, que partiu do co-roteirista (Felipe Bragança) quando percebeu: ele é um salva-vidas, é mais feliz no mar do que na terra, tipo o Acquaman. Queríamos heróis sem poderes, que fossem humanos, tivessem medo. E é perfeito para tratar do universo masculino do filme – afirma Karim.