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Itapema FM  | 20/02/2014 15h13min

"É um filme brasileiro", diz José Padilha sobre RoboCop

Produzido pelos estúdios MGM e Sony, filme tem orçamento de US$ 130 milhões

Roger Lerina  |  Rio de Janeiro *

O diretor José Padilha chegou grandão em Hollywood: seu RoboCop tem orçamento milionário, elenco com nomes de primeira linha como Samuel L. Jackson e – talvez o mais importante – autonomia artística rara no cinema norte-americano. A estreia nos Estados Unidos, no entanto, ficou aquém do esperado nas bilheterias.

– O filme rema contra três marés por lá: grande parte dos fãs não vê o filme, fica apenas comparando com o anterior, a gente entrou em cartaz na maior nevasca nos EUA em anos e, ainda por cima, no Dia dos Namorados. Você não fala para sua namorada: "Vamos ver o RoboCop?". Mas eu estou calejado: abri o Tropa de Elite com a pirataria, depois fui chamado de fascista, depois ganhei o Festival de Berlim (em 2008). Estou acostumado a esperar, um filme não acontece em poucos dias. Vou ficar calmo e esperar – disse o cineasta.

Padilha descarta a possibilidade de dirigir uma sequência de RoboCop: – Não está no meu contrato dirigir uma sequência. Se surgir uma franquia, o problema vai ser do próximo diretor.

Você disse em entrevistas que RoboCop é um filme brasileiro de US$ 130 milhões. O que isso quer dizer, exatamente?

José Padilha – O diretor é brasileiro, o fotógrafo (Lula Carvalho) é brasileiro, o montador (Daniel Rezende) é brasileiro e o compositor (Pedro Bromfman) é brasileiro. É um filme brasileiro.

Mas como você consegue colocar uma marca autoral e brasileira em um filme rodado no sistema hollywoodiano?

Padilha – Você consegue, de alguma maneira. A minha visão como diretor vem da minha experiência de vida, que vem aqui do Brasil. Lula aprendeu seu estilo de fotografia com o pai (o diretor de fotografia Walter Carvalho), fazendo filmes no país, o Daniel Rezende montou Cidade de Deus e os dois Tropa aqui no Brasil. Existe uma cultura de criação cinematográfica brasileira na genética deste filme. Se você olhar a forma como o RoboCop foi filmado e montado, vai notar que ele guarda semelhanças com os outros filmes que a gente fez. Isso foi uma coisa que bati pé desde o começo: "Quero trabalhar com a minha equipe. Não quero ir para os Estados Unidos e trabalhar com um diretor de fotografia e um montador que eu não conheço". Eles viram o Tropa 1 e o Tropa 2, gostaram dos filmes, confiaram no nosso trabalho e aceitaram importar esses brazucas.

Qual é a principal diferença entre o seu RoboCop e o do filme de Paul Verhoeven de 1987?

Padilha - São várias. O RoboCop do Verhoeven tem uma crítica à época em que ele foi feito, na década de 1980, àquelas corporações agressivas, à era Ronald Reagan. O filme trazia essa questão da automatização da violência, de que é preciso desumanizar o agente da violência, que também está em Tropa de Elite: se você é um "caveira", não questiona nada. E qual é a maior desumanização possível? Transformar um homem em máquina. O Verhoeven fez isso brilhantemente. O que a gente fez foi tirar essa questão do nível das corporações e colocar em termos de política internacional. Hoje em dia, nós já vemos governos usando drones, aeronaves não tripuladas, para matar pessoas. Outro dia, vi nos EUA um debate sobre se o governo tinha ou não direito de usar um drone para matar um americano no Paquistão. Matar um paquistanês não estava em debate, isso pode. É exatamente isso que RoboCop fala: no filme, os EUA têm uma lei que proíbe que robôs atuem em seu território, mas podem atuar em território estrangeiro. Isso vai acontecer: tenho certeza de que a entrada de robôs na automatização da violência não vai se dar pelas forças policiais, mas, sim, pelas forças militares. Quisemos fazer um filme que colocasse essa questão.

E a ideia da companhia que cria o RoboCop é burlar essa legislação.

Padilha – É uma jogada de marketing da OmniCorp: se a gente colocar um cara dentro de um drone e disser que ele é um super-herói, vamos convencer o povo norte-americano a aprovar o uso de robôs aqui.

Você optou em seu RoboCop por exibir imagens menos explicitamente violentas do que no filme original.

Padilha – Não acho que a violência e o sexo em um filme sejam um valor em si: só porque um filme é mais violento ele é melhor? Isso é uma besteira. O nível de violência e sexo de um filme tem que ser coerente com a ideia desse filme. O RoboCop que me interessou fala da política da automatização da violência. Por que os EUA saíram do Vietnã ou do Iraque? Porque soldados estavam morrendo. Se você trocar soldados por robôs, o que acontece? Isso é uma questão séria. Para falar sobre essa questão, não preciso mostrar um cérebro explodindo na frente da câmera.

Antes de você entrar no projeto, o cineasta Darren Aronofsky, diretor de O Lutador e Cisne Negro, já tinha um roteiro sobre o RoboCop. Você chegou a lê-lo?

Padilha – Eu queria fazer um filme que se passasse no futuro próximo. Já o filme do Aronofsky se passava 3 mil anos no futuro, quando a humanidade teria perdido a noção de moral e o único lugar em que poderia recuperar este conceito era no programa do RoboCop. Não tem nada a ver com o que eu queria, por isso não quis nem ler o roteiro.

Que tipo de paralelo você faz entre o RoboCop e os atuais super-heróis vistos no cinema?

Padilha – O RoboCop é um personagem canhestro em relação ao Homem-Aranha e ao Homem de Ferro, com quem toda criança quer se identificar. Nem Alex Murphy quer ser o RoboCop! O personagem não se aplica ao modelo de herói dos estúdios: toda vez que o RoboCop ganha, quem ganha na verdade é o vilão.

Quais são seus próximos projetos?

Padilha – Estou estudando o convite de fazer uma série para a Netflix sobre os bastidores da política americana para pegar o Pablo Escobar (chefão do tráfico de drogas colombiano morto em 1993). Também tem o roteiro do filme que escrevi sobre a Tríplice Fronteira (Brasil, Paraguai e Argentina), que vai ser estrelado pelo Wagner Moura, e ainda tem um conto de ficção científica que escrevi quando tinha 18 anos e que estou roteirizando para a Warner.

* O repórter viajou a convite da Sony Pictures

SEGUNDO CADERNO
Sony/Mgm / Divulgação

José Padilha: superorçamento e liberdade criativa em sua estreia em Hollywood
Foto:  Sony/Mgm  /  Divulgação


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