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Itapema FM  | 14/02/2014 11h34min

Artistas de Florianópolis levam o espírito das ruas para os espaços tradicionais

O interesse pelo trabalho destes profissionais renova o público que frequenta as galerias

Cristiano Santos  |  cristiano.santos@diario.com.br

Quando a galeria Helena Fretta, instalada há quase três décadas em Florianópolis, hospeda pela primeira vez uma exposição de street art há um simbolismo maior do que a abertura do espaço. Até o próximo sábado, grafiteiros apresentam obras que levam na essência de suas construções o espírito das ruas. Nas paredes, obras assinadas por Toy, GBA, Bug, Alma Set3, Tim Tchais, Dogz, Wagz e imagens da fotógrafa e curadora Vânia Martins. São nomes desconhecidos de vários olhares, mas visíveis há muito tempo nos muros da Ilha e do Continente, na Capital. As portas abertas ainda renovam a atmosfera de um local pouco frequentado pelos jovens. É uma via de mão dupla, há um novo consumidor. Ampliaram-se os limites.

– Consegui, principalmente, atingir o que eu queria: o público jovem veio à galeria. É uma forma de criar o hábito, de que eles conheçam o artista, o trabalho dele. Também de saber que aquela obra que está comprando não é meramente de decoração, é um investimento. Aquele trabalho tem condições de um dia valer muito mais – reforça Helena.

Desde 2007, a arquiteta Marina Baldini amplia o reconhecimento destes profissionais com a Cor Galeria de Arte, também na Capital. Com o olhar voltado para a cidade, na primeira exposição reuniu quatro artistas, sendo dois deles grafiteiros.

– No início, teve bastante estranhamento, mas logo a galeria ficou conhecida. A arte contemporânea é uma maneira de contar a nossa história, o que estamos vivendo – relembra.

No acervo e na agenda, obras que dão um respeitável panorama da produção local, além do intercâmbio com outras galerias do país.

O trânsito entre a rua e os espaços de exposição não é recente, mas na última década ganhou força além dos grandes centros. Alguns nomes nacionais – vide o sucesso dos irmãos Osgêmeos - foram pintar fachadas em castelos medievais na Europa e estamparam campanhas de diferentes produtos.

– Quando comecei, errei o foco e tentei atingir os arquitetos, achei que eles poderiam fazer uma ponte. Mas hoje, com mais mídia, com as redes sociais, já conquistei um público fiel. São, por exemplo, jovens casais que estão montando o apartamento e ficam namorando as obras por meses. Esse é um processo transformador – finaliza Marina.

De pincel no muro

Viti Grosman imprime nas obras a essência que vem de fora, das ruas, das interferências urbanas. O gaúcho chegou em Floripa a convite da Imaginarium para atuar como designer, em 2007. No Estado vizinho, o receio da repressão o impediu de grafitar nos muros. Sua arte se desenvolveu e tomou forma na Ilha.

– Logo que cheguei aqui me deu vontade de pintar na rua. Como eu morava na Lagoa (da Conceição), tinha uma placa num ponto de ônibus, sem propaganda e comecei a botar pra fora. E me deu uma visibilidade muito grande. É incrível como as pessoas reconheciam.

No meio de tudo isso, conheceu a esposa e embarcaram para estudar em Barcelona. O ano era 2009, auge da crise financeira. A experiência não foi das melhores mas a turbulência rendeu uma série de telas. Retornaram para Santa Catarina depois de um giro – com direito a pinturas pelas ruas – pelas principais cidades europeias.

Integrante do acervo da Cor Galeria, com algumas exposições no espaço, foi por meio de um reunião mediada por Marina Baldini que ele conheceu outros nomes da cena. Formado em Publicidade e em Artes Plásticas, Viti reconhece que hoje é mais conhecido pelas telas do que pela rua. Nelas, as mulheres, os seres mitológicos e o azul esverdeado permanecem onipresentes. Agora, garante que está se abrindo para outras cores. Suas ilustras, por exemplo, têm na publicidade o maior mercado.

– Eu não tenho uma pegada tão grafite, pinto com pincel. Não faço letra. Tenho a minha linguagem e dependendo da mídia, busco me adaptar a isso. O lance comercial rolou mais fácil, tem a galeria – reconhece.

Quanto ao público, a recepção vem aumentando a cada ano, assim como a disposição para pagar por uma tela. Talvez esteja aí, na formação de um novo consumidor, o grande trunfo da street art.

 
Foto: Felipe Carneiro/Agência RBS

Grafite na galeria

Há um nome que é sempre lembrado quando se trata da história do grafite brasileiro. Tim Tchais, paulista radicado em Floripa há oito anos, começou a pintar as ruas ainda adolescente. Filho de um artista plástico, vizinho da Avenida Paulista, fez os primeiros traços com giz de cera nas redondezas, aos seis anos. Em seguida, conheceu o Tupi Não Dá, grupo performático considerado um dos impulsos do grafite rumo à direção plástica, e não parou. De um festival no colégio, surgiu um grupo de grafiteiros.

– Compramos tinta e começamos a desenhar, fazíamos uma única letra, cada um pintava um pouco.

Vivendo a essência do grafite, correu riscos, faltou nas aulas de Design Industrial e formou uma das primeiras turmas de destaque. Dominaram a Zona Oeste paulistana. Mas o estouro veio com o projeto Aprendiz, no início dos anos 2000, quando uma ONG liberou tinta à vontade para que os grafiteiros pintassem os becos da Vila Madalena. Logo depois, surgiu o que se convencionou chamar de street art.

– A gente não gostava, meio que se protegia, não queríamos ser enquadrados nessa. Mas a tecnologia mudou muito o grafite. Hoje, qualquer um pega um spray e pinta, não escorre, as válvulas mudaram. Qualquer criança usa um spray. Não tem como fugir disso. Mas apesar de ter uma nova geração, que aprendeu primeiro na sala de aula e depois foi para a rua, o grafite mesmo é na rua. Não adianta ficar no Facebook. O reconhecimento vem da rua – comenta.

Enquanto seus colegas ganhavam espaço em galerias de arte e na mídia, ele desembarcou na Ilha de Santa Catarina com o foco em outra área. Usou o conhecimento da faculdade para criar uma fábrica de pranchas de sandboard. Seu grafite, definido por ele mesmo como "abstrato, sem muita explicação", segue sendo impresso nestas pranchas que deslizam pelas areias do país. Na rua, acabou de finalizar um muro de uma concessionária em São José. Mas hoje, aos 33 anos, é só "for fun". Tim, que no ano passado integrou a Bienal Internacional do Grafite, em São Paulo, faz parte do grupo que está em exposição na Helena Fretta. Na terça-feira, dia 18, participa lá mesmo, às 19h, da palestra Um Novo Olhar Sobre o Grafite.

– Acho muito difícil vender meu peixe como arte. Pra mim, quando tem uma galeria que vende é melhor, porque eu conheço a galera que pinta, não a que compra.

Serviço:
Helena Fretta Galeria de Arte
Rua Presidente Coutinho, 532, Centro, Florianópolis
48 3028-2345
www.helenafretta.com.br

Cor Galeria de Arte
Rodovia José Carlos Daux (SC-401), 7135, subsolo, Santo Antônio de Lisboa, Florianópolis

Felipe Carneiro / Agencia RBS

Viti Grosman, influenciado pelo mar catarinense, é formado em Publicidade e Artes Plásticas
Foto:  Felipe Carneiro  /  Agencia RBS


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