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Itapema FM  | 28/10/2013 09h02min

Lou Reed marcou pela selvageria das distorções, poesia e estética

Fãs do avô do punk rock foram surpreendidos com o anúncio da morte, confirmada horas depois

Marcos Espíndola  |  marcos.espindola@diario.com.br

O breaking news na rede cravava de maneira fatal e sintomática: está morto. Mas Lou Reed sempre se valeu do benefício da dúvida para forjar o próprio horizonte e assim impor um novo patamar para a arte. Por que haveríamos de aceitar isso tão facilmente?

Até o fechamento desta edição só temos a fonte original da revista Rolling Stone que anunciou a partida do compositor e guitarrista que ajudou a dar forma ao rock há pelo menos 50 anos. No primeiro post a respeito da notícia, o blogueiro Alexandre Matias (do Trabalho Sujo) foi mais reverencial a citar o "homem que salvou o rock'n roll de sua primeira grande crise ao fundar o Velvet Underground ao lado de John Cale." Em seguida se autoconcedeu o direito a duvidar (Atualização16h15min: "Pode ser boato").

Os que se deram por convencidos se resignam com o fato de o homem que levou uma geração a passear por lugares selvagens agora passeia pelo paraíso. Reed era um daqueles imbatíveis, que sobreviveu a toda a sorte de loucuras e transgressões físicas e mentais dos anos 1960, 1970, 1980 até entrar no novo milênio são e ainda genial.

É difícil mesmo acreditar que tenha sido vencido pelo tempo, talvez por complicações do recente transplante de fígado ao qual se submeteu ainda neste ano. As causas pouco interessam. Se está morto fará muita falta à música pop. Mesmo se não produzisse nada – embora tenha lançado há dois anos um álbum em parceria com a banda Metallica (Lulu) – sua presença física neste mundo hoje tão carente de ídolos substanciais representava um alento.

Era e foi um dos pilares da cultura pop que se consolidou a partir da contracultura. Um artesão sublime da literatura, um alquimista do rock. A sua história é uma crônica de um sobrevivente nos Estados Unidos: ainda adolescente foi submetido a tratamento de eletrochoque para "curar" a sua opção pela bissexualidade; fez michê e sobreviveu ao grande banquete da era das drogas.

De mito do rock underground foi alçado à condição de artista imprescindível. Mas seu grande trunfo foi não ter recorrido ao caminho de se tornar mais um mártir do rock. Não, preferiu andar na linha do abismo desejando nascer "mil anos atrás" (Heroin, 1968).

Se Andy Warhol fez dele e dos Velvets tela de projeção para as suas intenções na música (e também para exibição de seus filmes), Reed retribuiu com a selvageria das distorções, poesia e estética. O punk deve a ele – e muito! –, assim como o post punk, a new wave, o indie, enfim, qualquer respiro dentro do ambiente da música pop teve a sua inspiração. Deus nos livre do pesadelo dele nunca ter existido para nos propor um passeio pelo lado selvagem.

Transformer, de 1972, é a sua primeira obra-prima – entre quase tudo que compôs. Walk on the Wild Side é um hino ao despertar para um encontro com a loucura. Há muito o que citar sobre a grande estrada pavimentada por esse ser sexual e artisticamente ambíguo, que sublimou a literatura com o brutal Berlin (1973) e fez borbulhar os sentidos na experiência ruidosa de Metal Music Machine (1975).

Revisitou o emblemático Transformer 10 anos depois e assim cunhou a sua segunda maior obra: The Blue Mask. Nos anos 1990 fez o que todo bom roqueiro sobrevivente com um acervo digno deveria fazer: reuniu o Velvet Underground para uma turnê de shows pela Europa amealhando os bolsos dos fãs e os deixando felizes.

Aos críticos, o bardo respondeu que "suas besteiras ainda assim valiam mais do que os diamantes de muitos" e sempre deixou claro que a sua expectativa para a vida era escrever O Grande Romance Americano. E deixou isso registrado, em cada álbum, cada vírgula, cada nota distorcida de guitarra. Mas claro, sem nos tolher o benefício da dúvida. Inclusive sobre a sua morte.

DIÁRIO CATARINENSE
Greg Wood / AFP

Fundador do Velvet Underground era e foi um dos pilares da cultura pop que se consolidou a partir da contracultura
Foto:  Greg Wood  /  AFP


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