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Itapema FM  | 07/02/2013 16h49min

Nelson Pereira dos Santos explica opção pelos depoimentos femininos em filme sobre Tom Jobim

Documentário de longa-metragem 'A Luz do Tom' estreia nesta sexta-feira nos cinemas

Daniel Feix  |  daniel.feix@zerohora.com.br

Um ano depois do surpreendente A Música Segundo Tom Jobim, o cineasta Nelson Pereira dos Santos volta com A Luz do Tom. O segundo documentário sobre o maestro, cujo nascimento completou 86 anos no dia 25, nem de longe lembra o primeiro. A inventividade do título anterior deu lugar a um filme mais tradicional, e menos inspirado, que entra em cartaz nesta sexta-feira no Espaço Itaú, em Porto Alegre.

Se A Música Segundo Tom Jobim era um filme sem prosa, no qual as palavras surgiam apenas nos versos das canções, A Luz do Tom aposta no relato a partir de entrevistas com quem experimentou a mais acessível intimidade do autor de Corcovado: sua irmã Helena, a primeira esposa, Thereza Hermanny, e a segunda, Ana Lontra.

Tom dizia que não cantava as mulheres; cantava para elas. Por meio das mulheres de sua vida, o público vê a figura do artista ser humanizada, desmitificada. Fica sabendo de suas grandes batalhas contra pequenas dificuldades, como a necessidade de se adaptar para tocar piano devido ao tamanho desproporcional de suas mãos. Descobre que Águas de Março foi composta num momento de tédio – o músico estava chateado com um trabalho maçante, sentou-se ao sofá, pegou o violão e começou a dedilhar: “É pau, é pedra, é o fim do caminho”.

Com roteiro de Miúcha Buarque de Holanda, A Luz do Tom é baseado no livro Antônio Carlos Jobim – Um Homem Iluminado, de Helena Jobim. É um filme de fãs. E amigos.

– Cinema Novo e Bossa Nova são movimentos quase simultâneos. Não havia como não trabalharmos juntos – diz Nelson, 84 anos, desde o Rio.

As poucas imagens de arquivo utilizadas mostram o especial da TV Manchete A Música Segundo Tom Jobim (título que inspirou o longa lançado em 2011), que Nelson dirigiu quando já era um nome histórico do cinema brasileiro – com filmes como Vidas Secas (1963). De resto, há, em A Luz do Tom, os depoimentos e algumas tomadas de paisagens que simbolizam “sua aproximação da natureza, que está refletida na sua música”, conforme o diretor.

– Tom adorava a serra do Rio. Filmamos em Florianópolis (leia abaixo) e em propriedades próximas à que ele costumava ficar quando ia passar o verão na região serrana – explica Nelson.

Há, ainda, um momento em que Helena Jobim, num bar, responde a perguntas de jovens sobre o irmão. A espontaneidade é igual a zero, como a própria “performance” de Helena diante da câmera. Algumas de suas revelações são deliciosas – pena que feitas de uma maneira pouco interessante.

Confira a entrevista que Nelson Pereira dos Santos concedeu a ZH:

Zero Hora – Por favor, fale sobre a origem do projeto, o porquê da opção por fazer dois filmes sobre Tom Jobim, um essencialmente musical, outro nos depoimentos de três mulheres.
Nelson Pereira dos Santos –
Fazer um filme com mais de 90 minutos, hoje, no Brasil, é suicídio: não há espaço de exibição. A opção por fazer dois longas tem a ver com isso. E com o formato que o projeto foi tomando. Meu foco sempre foi a música do Tom. Daí a ideia de um longa musical. Para o outro eu queria depoimentos de quem falasse com propriedade sobre a relação dele com a composição, com suas canções, a música como um todo. Queria saber o que Tom manifestava sobre a música em sua intimidade. Por isso o foco foi se fechando sobre a irmã e as duas ex-mulheres.

ZH – Por que filmar em Florianópolis?
Nelson –
Foi o Paulo Jobim (filho de Tom) quem disse que as praias e determinadas regiões da capital catarinense lembram o Rio no qual o Tom viveu, o Rio de algumas décadas atrás. A escolha dos demais cenários, das paisagens naturais, com muito verde e a vida animal, tem a ver com sua aproximação da natureza, aproximação esta que está refletida na sua música. Tom adorava a serra do Rio. Filmamos em propriedades próximas à que ele costumava ficar quando ia passar o verão na região serrana.

ZH – O senhor conviveu com Tom Jobim?
Nelson –
O Cinema Novo e Bossa Nova são movimentos quase simultâneos. Não havia como não trabalharmos juntos. Foi o (cineasta) Cacá Diegues que me apresentou a ele. Participamos de vários projetos, entre eles um programa da TV Manchete que eu dirigi que tem o mesmo título do filme A Música Segundo Tom Jobim. As imagens de arquivo usadas no início de A Luz do Tom (nas quais se vê Radamés Gnattali falando sobre Ernesto Nazareth, e depois o próprio Tom) são desse programa.

ZH – Qual a sua expectativa em relação ao diálogo que o filme pode estabelecer com o público?
Nelson –
É difícil fazer qualquer tipo de previsão. A Música Segundo Tom Jobim, com apenas 20 cópias, passou dos 70 mil espectadores e foi vendido pro mundo inteiro. Depois disso, não tem como não criar uma boa expectativa. Mas este filme, para o Exterior, é mais difícil, porque as falas em português são geralmente um impeditivo para uma carreira internacional.

ZH – Filmes sobre músicos não são novidades para o senhor: em 2003, lançou o curta Meu Compadre, Zé Ketti. Fale um pouco sobre a sua relação com essa linguagem artística e com os artistas que o senhor opta por retratar, por favor.
Nelson –
Eu adoro música, estou sempre ouvindo, cantarolando. Agora me pede para cantar alguma canção. Eu não conseguiria. Tenho um bloqueio, me acho muito ruim. Acho que é por causa disso que sinto vontade de falar sobre música. Acho que se pode alcançar um nível tão maravilhoso com uma simples canção, parece-me algo tão inatingível. E música invariavelmente deixa qualquer filme melhor. Os ruídos de uma cena são tão importantes para ela, para o que se quer dizer... Não consigo deixar de dar valor especial a qualquer coisa que diga respeito a áudio no cinema.

ZH – Seus primeiros filmes, incluindo Rio 40 Graus (1955), marco inicial do Cinema Novo, puseram o morro na tela. Como o senhor avalia o momento dos "filmes de morro" (Cidade de Deus entre eles), que nos últimos anos viraram uma espécie de subgênero do cinema nacional?
Nelson –
Essa série de filmes é muito rica. No morro há muitos temas, por isso há tanto filme nesse contexto. Hoje o cinema brasileiro é composto de muitos filmes, tem muita variedade, a pluralidade é muito grande. Pois o morro sintetiza essa pluralidade. Sintetiza a riqueza da cultura brasileira. Sou otimista, acho o nosso momento muito bom. Só discutimos a ocupação do mercado, a baixa parcela de ocupação das salas pelas produções nacionais porque há produção nacional, porque ela é boa e porque queremos vê-la mais presente nos cinemas. Se fizéssemos só porcarias, não estaríamos todos pensando em mecanismos para ampliar o espaço ocupado pelos nossos longas-metragens.

ZH – Quais são seus próximos projetos?
Nelson –
Ontem (terça-feira) recebi a notícia de que o drama que preparo sobre Dom Pedro II, adaptado do livro de José Murilo de Carvalho, foi contemplado com R$ 2 milhões do fundo setorial do governo federal. Ainda falta muito para completar o orçamento do filme, que é de cerca de R$ 7 milhões, mas já é um início. É um filme caro, "de grua", com uma produção de época. Na trama, D. Pedro rememora episódios de sua vida, incluindo um caso amoroso. Vamos ver se consigo de fato levar esse projeto adiante.

ZERO HORA
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