Itapema FM | 22/01/2013 09h07min
Amor, em cartaz nos cinemas catarinenses, traz a velhice apequenada pela doença. Para dimensionar a maturidade de Amor, vale imaginar como um blockbuster abordaria a história de Georges (Jean-Louis Trintignant) e Anne (Emmanuelle Riva), casal octogenário de professores de música aposentados.
Após sofrer um derrame, Anne declina enquanto é cuidada pelo marido e esporadicamente visitada por Eva (Isabelle Huppert), filha do casal e também musicista. Passados os primeiros minutos, a história se desenrola inteira no apartamento dos dois. Estaria aí a primeira autocensura do diretor de um filme mais comercial, senão o veto do produtor.
Restringir-se a um apartamento pouco iluminado logo deprime os espectadores. Mas temos um piano na sala e três pessoas capazes de tocá-lo - aliás, quatro, já que um ex-aluno de Anne a visita. Aí está, pensaria o diretor do blockbuster, a oportunidade para uma linda cena como a de O Pianista, quando um facho esmaecido de sol incide sobre o piano e o som tirado dele se mostra capaz de enternecer um nazista.
É tudo que nós espectadores pedimos, não? Um grande momento sublime para photoshopar os momentos mais agudos, para chorar de vez e suportar os sofrimentos com a ajuda da arte. Com o diretor Michael Haneke, nada disso. As músicas clássicas até são tocadas, mas sempre interrompidas. Nem mesmo o Impromptus de Schubert, interpretado por Alexandre Tharaud, pianista parisiense de fato, chega ao fim.
A vida, lembra o filme, às vezes cai e não sai mais daquilo que o escritor norteamericano Philip Roth chamou de "a irritante monotonia do azar". As cenas são estáticas, prolongadas, cruas, banais, torturantes, mas é justamente essa combinação que torna Amor um longa tão profundo e destoante. Não foram à toa os recentes Globo de Ouro de melhor filme em língua estrangeira (Amor é uma coprodução francesa, alemã e austríaca) e a indicação para o Oscar.
O próprio Michael Haneke está surpreso com a quantidade de pessoas que conseguiu fazer se interessar pelo sofrimento de dois octogenários - ainda por cima de europeus estoicos. A saída do cinema é das mais silenciosas imagináveis. Para aliviar a tensão, em casa permita-se o Schubert inteiro no YouTube. Basta digitar "Impromptus op. 90, D. 899 Alexandre Tharaud" no Google.
No filme "Amor" o sentimento entre dois idosos é posto em cheque após um deles ficar doente
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