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Itapema FM  | 03/01/2013 18h14min

Com visual ousado, "No" conta bastidores de plebiscito que derrubou Pinochet

Filme estrelado por Gael García Bernal é um dos nove pré-selecionados para a disputa do Oscar de melhor longa estrangeiro. Confira os outros

Daniel Feix  |  daniel.feix@zerohora.com.br

Não. Se você for ver No, não pense que há um problema de projeção que justifique as imagens fora de foco, com definição precária e cores distorcidas.

No limite entre a ousadia e o autoboicote, o diretor chileno Pablo Larraín filmou boa parte do longa em U-matic, um tipo de vídeo com qualidade intermediária entre o VHS e o Betacam usado pelas emissoras de TV nas décadas de 1970 e 80. Depois, trabalhou no “envelhecimento” do material, dando a impressão de que se trata de algo que foi rodado anos atrás e que sobrevive à passagem do tempo do jeito que a tecnologia permite.

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Apesar do estranhamento, o recurso funciona, e o espectador de imediato parece levado à época em que a trama se passa. No, que estreia nesta sexta-feira em Porto Alegre, é um dos nove títulos pré-qualificados para o Oscar de melhor filme estrangeiro (leia mais sobre os outros oito abaixo). A história, baseada na peça El Plebiscito, de Antonio Skármeta, é a dos bastidores do referendo de 1988, que marcou “o início do fim” da ditadura de Augusto Pinochet implantada no Chile em 11 de setembro de 1973. Realizado pelo governo devido à pressão internacional e a uma obrigação constitucional (a partir de uma brecha aberta por uma nova lei regulamentadora dos partidos políticos), o plebiscito convocava os chilenos a votarem pelo “sim”, se desejassem a permanência do regime, ou pelo “não”, caso preferissem a convocação de eleições democráticas para presidente.

O “não” venceu, ensinam os historiadores, graças a uma campanha que fez uso da criatividade publicitária. E, também, de uma política de combate leve aos abusos dos agentes da ditadura, voltada mais à esperança de um futuro colorido do que ao acerto de contas com o passado negro. É nessa campanha, sobretudo nas propagandas diárias de televisão, que a trama de No está focada. Isso, ressalte-se, dá ainda mais respaldo às escolhas de Larraín para a construção visual do filme – em certos momentos, as imagens da narrativa propriamente dita se confundem com os registros históricos da propaganda criada pelos marqueteiros do “não”.

Se visualmente No constitui uma experiência absolutamente sui generis em tempos de HDTV, o roteiro linear e a presença do astro Gael García Bernal como o protagonista, o publicitário René Saavedra, garantem o diálogo com um público bem amplo. Gael está excelente. Seu personagem foge de todos os clichês, dos revolucionários idealistas aos afetados criativos das agências de publicidade. É um visionário, ao mesmo tempo capaz de vislumbrar os anseios da população como nenhum de seus colegas, domar os radicais que pretendiam partir para o confronto mais direto e manter-se frio diante da pressão do poder econômico, político e militar – ele enfrentava Pinochet!

Outra sacada de Larraín é fazer do chefe de René em sua agência, Lucho Guzmán (Alfredo Castro), o seu antagonista. Ambos trabalham juntos em campanhas para vender eletrodomésticos e refrigerantes, mas, no plebiscito que define os rumos do país, escolhem lados opostos. Suas motivações, e isso é o mais interessante nesse conflito, não são necessariamente ideológicas, ou mesmo financeiras – René é ambicioso, o que significa dizer que uma vitória sobre o sistema, suplantando um adversário poderoso, poderá trazer o prestígio que ele não ganharia se defendesse o “sim”.

Filho do casal de políticos Hernán Larraín (senador chileno) e Magdalena Matte (ex-ministra), ambos de tendência conservadora, Pablo Larraín tem 36 anos e quatro longas-metragens no currículo. No completa uma trilogia que ele dedicou ao período da ditadura militar, iniciada com Tony Manero (2008) e Post Morten (2010) – ambos protagonizados pelo mesmo Alfredo Castro que agora divide a cena com Gael García Bernal. É, dos três, aquele que vem obtendo a melhor recepção no circuito internacional. Como os dois anteriores já eram muito bons, você já tem uma ideia do quanto No vale a pena.

Os oito concorrentes
Representante do Chile, No disputa a indicação ao Oscar de melhor filme estrangeiro com outras oito produções. Os cinco concorrentes serão anunciados no próximo dia 10, e a cerimônia de premiação será realizada no dia 24 de fevereiro. Despontam como favoritos os títulos Amor, representante da Áustria que venceu a Palma de Ouro no Festival de Cannes, e Intocáveis, sucesso francês que conquistou o mundo. Os dois e mais o dinamarquês O Amante da Rainha e o norueguês Kon-Tiki medem forças antes no Globo de Ouro, dia 13 de janeiro. Confira, a seguir, mais informações sobre os longas estrangeiros que estão pré-qualificados a disputar um lugar na  festa do Oscar.

"The Deep" (Finlândia)
Baseado em uma história real, o filme de Baltasar Kormákur revive o drama de um pescador que é o único sobrevivente de um naufrágio. Sua grande façanha, porém, desperta estranheza na comunidade que o acolhe. O longa vem tendo uma carreira internacional discreta. Estreia no Brasil em  25 de janeiro.

"Rebelle" (Canadá)
O Canadá tem presença recorrente na disputa. Já venceu com As Invasões Bárbaras e concorreu em 2011 e 2012, respectvamente, com Incêndios e Monsieur Lazhar. Rebelle tem tem o perfil do filme-denúncia, abordando o uso de crianças nas guerras civis da África negra. A protagonista é uma jovem (Rachel Mwanza, melhor atriz no Festival de Berlim) que é obrigada a matar os pais e ingressar numa milícia. Direção de Kim Nguyen. Sem previsão de estreia no Brasil.

"Amor" (Áustria)
O impactante retrato de um relacionamento apaixonado de dois octogenários que sucumbe à decrepitude física e mental já ganhou, entre outros prêmios, a Palma de Ouro em Cannes e o troféu de filme do ano da Federação Internacional dos Críticos de Cinema. Em 2010, após uma trajetória idêntica com A Fita Branca, o diretor Michael Haneke perdeu o Oscar para o argentino O Segredo dos seus Olhos. Amor é estrelado por Jean-Louis Trintignant e Emmanuelle Riva. Estreia no Brasil dia 18 de janeiro.

"Intocáveis" (França)
O longa de Olivier Nakache e Eric Toledano é o filme francês de maior sucesso internacional em todos os tempos. A Academia de Hollywood tem apreço por este perfil de filme popular e com mensagem edificante. Intocáveis conta com a poderosa máquina promocional da Weinstein, produtora que badalou em 2012 O Artista, outro sucesso francês, que ganhou cinco Oscar. Intocáveis segue em cartaz na Sala Paulo Amorim.

"Além das Montanhas" (Romênia)
O mais recente filme de Christian Mungiu mantém em alta uma das mais aclamadas cinamatografias contemporâneas. Ele é autor de 4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias, Palma de Ouro em Cannes em 2007, festival que em 2012 consagrou Além das Montanhas com os prêmios de melhor roteiro e atriz (para Cosmina Stratan e Cristina Flutur). Conta a história de uma jovem que vive na Alemanha e retorna à Romênia em busca da melhor amiga, que isolou-se em um convento. Estreia no Brasil em 11 de janeiro.

"O Amante da Rainha" (Dinamarca)
Nicolaj Arcel conta a história real de uma jovem rainha que se apaixona pelo médico da corte que trata do rei insano. Alicia Vikander Mikkel Boe Følsgaard e Mads Mikkelsen são os protagonistas. Følsgaard, o rei traído,  ganhou o prêmio de melhor ator no Festival de Berlim. Mikkelsen, o amante, é conhecido por trabalhos como Coco Chanel e Igor Stravisnky. Estreia no Brasil em 8 de fevereiro.

"Minha Irmã" (Suíça)
Vencedor de Prêmio Especial do Júri no Festival de Berlim, o filme de Ursula Meier é ambientado numa estação de esqui dos alpes suíços, onde um rapaz (Kacey Mottet Klein) rouba hóspedes endinheirados para sustentar a irmã desempregada (Léa Seydoux), com quem vive uma relação complexa. O elenco conta ainda com a atriz americana Gillian Anderson. Já exibido no circuito no Brasil.

"Kon-Tiki" (Noruega)
A dupla de realizadores Joachim Ronning e Espen Sandberg encena a aventura do explorador norueguês Thor Heyerdal (1914  – 2002). Entre suas façanhas está a Expedição Kon-Tiki, na qual quis provar que as ilhas do Pacífico poderiam ter sido povoadas por nativos da América do Sul. Para isso, percorreu de balsa o percurso entre o Peru e a Polinésia. Muitos decendentes de Thor (vivido por Pål Sverre Valheim Hagen) vivem no Brasil. Estreia no país em 29 de março.

SEGUNDO CADERNO
Imovision / Divulgação

Gael García Bernal é o protagonista de "No", de Pablo Larraín
Foto:  Imovision  /  Divulgação


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